Por seis votos a um, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu nesta terça-feira (25) que a deputada federal Tabata Amaral (SP) pode se desfiliar do PDT sem perder o mandato. Os ministros atenderam a parlamentar, que pediu o reconhecimento de "justa causa" para deixar o partido, alegando discriminação e suspensão de suas atividades por divergências com o comando da sigla.
O processo, que dura 19 meses, foi aberto em outubro de 2019, quando a deputada e outros sete integrantes do PDT na Câmara votaram a favor da reforma da Previdência, contrariando a orientação da legenda. Todos os dissidentes se tornaram alvo de processo administrativo na Comissão de Ética da legenda, por infidelidade partidária. Ao TSE, Tabata disse ser alvo de "massacre" e ''fake news" promovidos pela cúpula do PDT, que estaria agindo para vê-la "sangrar" até pedir a desfiliação.
O relator do processo é o ministro Sérgio Banhos. No julgamento, ele afirmou que houve "discriminação pessoal" contra a deputada.
— Se o estatuto do PDT estabelece regras de fidelidade partidária que conformam a atuação parlamentar, bem como disposições punitivas de descumprimento, em tese, todos os filiados que tenham assim agido deveriam receber o mesmo tratamento — disse.
O ministro lembrou que o TSE já consolidou entendimento de que os partidos não podem determinar sanções disciplinares graves aos filiados quando houver acordo para autonomia política no exercício dos mandatos. A interpretação foi aplicada no julgamento que reconheceu justa causa para a desfiliação do deputado federal Felipe Rigoni (ES) do PSB. Ao incorporar as candidaturas advindas do movimento Acredito, como a de Tabata, o PDT autorizou, através do secretário-geral, a liberdade de posicionamento do grupo. Na carta-compromisso, assinada em abril de 2018, a sigla se comprometeu a "dar voz e voto aos integrantes do Acredito filiados ao partido" e a "respeitar as autonomias políticas e de funcionamento do Acredito, bem como a identidade do movimento e de seus representantes".
— Os comentários ofensivos em face da autora, a quebra de confiança existente entre o PDT e o movimento Acredito e o repentino e inesperado fechamento dos espaços políticos para o grupo dissidente indicam clara situação de desprestígio e de conivência inviável", afirmou Banhos. "O referido acordo, firmado no marco final para filiação partidária, foi essencial para a decisão da autora de compor as hostes partidárias e de concorrer ao cargo de deputada federal. Sem a referenda garantia de resguardo à autonomia política, sem essa relação de fidúcia entre a agremiação e a cidadã, a autora não teria se candidatado pelo PDT — concluiu o ministro.
Ele observou ainda que a eleição de Tabata "somou muitos votos às eleições proporcionais".
O relator foi acompanhado pelos colegas Luís Felipe Salomão, Carlos Horbach, Alexandre de Moraes, Mauro Campbell Marques e Luís Roberto Barroso.
Em seu voto, Moraes observou que, no momento da filiação, o PDT já sabia que Tabata tinha posições específicas divergentes das diretrizes da legenda.
— Já sabiam dessa divergência dela em relação às questões previdenciárias, em outras questões também de cunho liberal, mas mesmo assim concederam legenda. Ou seja, houve um prévio acordo para que o partido pudesse ter uma maior representatividade nas eleições. Não pode depois essa pessoa sofrer uma perseguição desproporcional, como ocorreu —destacou.
Embora tenha acompanhado o relator, o ministro Carlos Horbach chamou atenção para as consequências da incorporação de movimentos de renovação política.
— A formação desses movimentos suprapartidários, com pautas específicas, o surgimento desse fenômeno na vida democrática brasileira, pode trazer algumas consequências deletérias, impensadas, que podem prejudicar a ordem democrática. Penso que os partidos seriam levados a condição de verdadeiros hospedeiros — disse.
A divergência foi aberta pelo ministro Edson Fachin, que não viu descriminação contra a deputada e acabou isolado no julgamento. Ele considerou que as declarações públicas de dirigentes do partido não foi dirigidas especificamente à Tabata.
— Não há, na minha ótica, como automaticamente concatenar o conteúdo de tais dizeres como aptos a configurar ofensas pessoais direcionadas direta e individualmente à requerente — afirmou.
— Foram falas de teor crítico, incisivo e, evidentemente, ácido, mas não se identifica que estejam interativamente direcionadas a um filiado especificamente, mas a um grupo de filiados — completou.
Tabata x PDT
Antes da votação, o advogado Cristiano Vilela de Pinho, que representa Tabata no processo, voltou a dizer que o PDT descumpriu o próprio estatuto ao suspender a deputada por mais de 60 dias. Ele também afirmou que o partido autorizou a "liberdade de posicionamento" dos filiados do Acredito.
— O PDT firmou esse compromisso, através do secretário-geral do partido. Essas candidaturas foram propagadas no momento eleitoral sob essa bandeira, receberam os votos, e aí com menos de seis meses houve esse episódio e a tentativa de criminalizar, de criar uma situação insustentável, que fez com que ela não tivesse outra alternativa se não solicitar a justa causa — afirmou. — O PDT, nesse processo todo, onde suspendeu a deputada Tabata Amaral, descumpriu os artigos estatutários que regulamentam o tema.
O advogado disse ainda que o partido "fechou as portas" para Tabata e fez com a deputada ficasse "órfã da estrutura partidária". Ele lembrou declarações públicas do presidente da sigla, Carlos Lupi, e do vice-presidente do PDT, Ciro Gomes, contra a parlamentar.
— Foram diversas ofensas com a finalidade de minar a figura política da deputada. São ofensas que estão em um patamar muito acima do permitido, do respeitado dentro de uma conivência harmoniosa intra-partidária — criticou ao lembrar menções como "traidora" e "vendida".
Na outra ponta, o advogado Walber Moura Agra, representante do PDT, negou discriminação contra a deputada e lembrou que ela continuou a participar da Comissão de Educação. Também afirmou que o compromisso firmado com o movimento Acredito não foi chancelado pelo presidente da sigla e não pode funcionar como "salvo-conduto" para os filiados violarem a doutrina do partido e as regras de fidelidade partidária estabelecidas na Constituição. Destacou ainda que a orientação para votação do texto da reforma da Previdência não foi uma orientação da bancada, mas uma convenção nacional.
— Isso vem de uma história que vai ser conjecturada com os posicionamentos do presidente Leonel de Moura Brizola. Quem não fecha as questões, sai do partido. Isso é histórico do PDT — disse. — Esse caso é muito além do que um simples acordo, um simples acerto, entre o PDT e o movimento Acredito.