Após o presidente da República deixar clara sua intenção de influenciar na escolha do próximo comandante da Câmara, o atual presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que Jair Bolsonaro quer fazer do parlamento um anexo do Palácio do Planalto. Maia afirmou que o governo está usando as eleições da presidência da Casa para formar uma maioria na base de pressões, ameaças, cargos e emendas. Segundo ele, as promessas feitas a deputados em troca de apoio a Arthur Lira (PP-AL) não poderão ser cumpridas, pois não há espaço fiscal no Orçamento.
"É um alerta aos deputados e deputadas. A intenção do presidente é transformar o parlamento em um anexo do Palácio do Planalto, o que enfraquece o mandato de cada deputado e deputada e, principalmente, protagonismo da Câmara dos Deputados nos debates com a sociedade", disse Maia nesta quarta-feira, 27.
Mais cedo, após se reunir, em um café da manhã com deputados do PSL no Palácio da Alvorada, Bolsonaro disse esperar ter influência na eleição para a presidência da Câmara dos Deputados. "Vamos, se Deus quiser, participar e influir na presidência da Câmara com esses parlamentares (do PSL)", destacou, argumentando que espera com isso construir "um relacionamento pacífico e produtivo para o Brasil".
Para Maia, a frase é a prova de que a Câmara precisa de um candidato que dialogue e atue com independência. "Que tenha equilíbrio como Baleia (Rossi, MDB-SP), que não seja de oposição ao governo, o que o Baleia não é, mas que entenda que o parlamento é um outro poder", disse.
Maia disse ainda que a formação de maioria no Congresso não pode se dar da maneira como o governo está fazendo. "Uma coisa é formação de uma base, e com essa base você governa com os partidos que fazem parte dessa base", disse. "Outra coisa é você ser minoritário na Casa, como é o governo, e tentar formar uma maioria na base da pressão, na base da ameaça, na base de troca de emendas", acrescentou.
De acordo com o presidente da Câmara, o governo já teria se comprometido com o pagamento de emendas fora do Orçamento no valor de R$ 20 bilhões, mesmo sem espaço fiscal para tanto.
"Eu quero saber em que orçamento para o ano de 2021, com todo o problema do teto de gastos, se eles poderão cumprir, se vitoriosos, essa promessa. Cada dia que passa você vê, as pessoas vão vendo, que vão acabar sendo enganadas nesse toma lá dá cá", disse.
"Vai ser um problema grave se por acaso eles vencerem a eleição. R$ 20 bilhões extraorçamentários é uma promessa que o governo e seu candidato não têm nenhuma condição de cumprir."
Maia colocou em dúvida a disposição dos parlamentares em aceitarem esse "toma lá da cá". Para ele, as promessas são "uma peça de ficção" e, para cumpri-las, o governo teria que fazer cortes de R$ 60 bilhões.
"O parlamento sempre está disposto a participar do governo, a liberar os seus recursos para as suas bases, mas por aqueles que têm compromisso com programa e projetos do governo. Da forma como ele quer formar maioria aqui, eu acho que não vai dar certo. Vencendo ou perdendo, não vai dar certo", disse.
"O ambiente dessas promessas não será cumprido em hipótese alguma porque não há esse espaço fiscal nem de R$ 10 bilhões, nem de R$ 15 bilhões, nem de R$ 20 bilhões para cumprir uma promessa num ano onde já tem de rombo no teto de gastos uma previsão de R$ 30 bilhões", disse.
Para Maia, sancionar o Orçamento sem romper o teto e sem a aprovação da PEC Emergencial é impossível e, inclusive, configuraria crime. "Sem a PEC Emergencial é impossível qualquer burocrata assinar qualquer sanção de Orçamento, será crime. Com esse Orçamento, só desrespeitando o teto, ou dentro do teto, somente depois de aprovada a PEC Emergencial. Não sei como o governo vai conseguir cortar R$ 60 bilhões do Orçamento."
Eleição presencial
Maia disse que está trabalhando para realizar a eleição da Câmara da "melhor forma possível". Ele estima que três mil pessoas deverão circular pela Casa no dia 1º de fevereiro.
Maia defendia uma votação mista, presencial e virtual, para preservar os parlamentares do grupo de risco em meio ao agravamento da pandemia do novo coronavírus.
A Mesa Diretora, porém, decidiu, por 4 votos a 3, pela modalidade presencial. A decisão teve apoio de deputados alinhados a Arthur Lira (PP-AP), adversário de Baleia Rossi (MDB-SP) na disputa.
"Eu alertei que, do meu ponto de vista, não era o melhor para os parlamentares, servidores e imprensa, mas foi uma decisão que cabe à Mesa e que, por 4 a 3, decidiu dessa forma", afirmou.
"Assim sendo, estamos organizando da melhor forma possível para que a gente garanta o máximo de distanciamento entre os parlamentares e servidores e a imprensa no dia 1º de fevereiro", acrescentou.