O presidente Jair Bolsonaro não tem partido, não fez campanha e tampouco disputou qualquer cargo eletivo, mas começou a semana com o rótulo de um dos principais perdedores das eleições municipais. Bolsonaro moldou a própria efígie da derrota ao apoiar candidaturas construídas a sua imagem e semelhança, numa tentativa de resgatar a retórica antipolítica que o havia consagrado em 2018. Passado o fracasso nas urnas, agora estuda os caminhos para evitar novo infortúnio na busca pela reeleição, daqui a dois anos.
— Houve uma clara derrota da narrativa antipolítica. Bolsonaro não terá como usar em 2022 esse mesmo discurso, até porque ele é governo e vai precisar defender a sua gestão. A agenda número 1 da campanha deve ser a economia e o horizonte não é promissor — avalia o cientista político Carlos Eduardo Borenstein.
Bolsonaro colheu as maiores frustrações justamente nas duas maiores cidades do país, São Paulo e Rio de Janeiro, onde mantém forte base eleitoral. Em ambas, apoiou candidatos do Republicanos, partido dos filhos Carlos e Flávio Bolsonaro. Na capital paulista, Celso Russomanno nem sequer foi para o segundo turno, após ver suas intenções de voto derreterem conforme a campanha avançava. No Rio, Marcelo Crivella caiu no segundo turno, recebendo pouco mais da metade dos votos do vencedor, Eduardo Paes (DEM).
A rejeição do eleitor a candidatos de alinhamento à plataforma bolsonarista encontra paralelo na queda de popularidade do presidente, sobretudo em grandes centros urbanos. Pesquisas do Ibope realizadas entre outubro e novembro revelam uma piora nos indicadores positivos do governo em 23 das 26 capitais.
A insatisfação se refletiu nas urnas. O presidente não percorreu país pedido votos para os aliados, mas promoveu “lives eleitorais”, nome com o qual batizou transmissões ao vivo pelas redes sociais que fez direto do Palácio da Alvorada. O resultado foi desastroso. Dos 13 candidatos a prefeito, apoiados por Bolsonaro, apenas dois se elegeram: Mão Santa (DEM), eleito prefeito em Parnaíba, cidade de 103 mil eleitores no interior do Piauí, e Gustavo Nunes (PSL), que irá comandar Ipatinga, município mineiro de 174 mil eleitores.
O presidente ainda declarou apoio a 45 concorrentes a vereador, mas somente 10 obtiveram êxito. Até mesmo a reeleição do filho Carlos Bolsonaro teve sabor amargo. A família projetava votação recorde, com 150 mil votos, mas o vereador perdeu 30 mil votos em relação a 2016, somando 71 mil.
Presidente no centrão?
Consultor da Arko Advice, Borenstein afirma que o resultado expresso pelas urnas deve acelerar não só um reposicionamento político do presidente, como também a procura por um partido. Como não prosperou a tentativa de criação de uma nova legenda, a Aliança pelo Brasil, Bolsonaro vem sendo assediado por siglas do centrão, campo político que saiu vitorioso das urnas.
— Bolsonaro tem convite de vários partidos, do PP ao Republicanos, mas nestes não terá o controle total, como está exigindo. No PTB, Roberto Jefferson promete tudo, mas já enfrenta bastante resistência interna. Se voltar ao PSL, como também se especula, terá o que precisa numa campanha à reeleição: bastante tempo de TV e um bom fundo partidário — aponta Borenstein.
Para concluir a equação, Bolsonaro também precisa resolver outro problema: o fim do auxílio emergencial, previsto para o fim do ano. Nos grotões do país, a ajuda financeira garantiu ao governo índices de aprovação superiores a 60%. Sem o voto eleitor de classe média dos grandes centros urbanos que foi fundamental para sua vitória em 2018, Bolsonaro, a exemplo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, precisa substituir esse voto pelas camadas mais pobres das pequenas e médias cidades.
— Bolsonaro precisa de um Bolsa-Família para chamar de seu. O desafio é como fazer isso sem furar o teto de gastos e comprar briga com o mercado — conclui Borenstein.