BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Com seis votos, o STF (Supremo Tribunal Federal) já formou maioria nesta quarta-feira (17) pelo prosseguimento do inquérito das fake news, que apura a disseminação de notícias falsas e ameaças a integrantes da corte.
Votaram neste sentido os ministros Edson Fachin (relator), Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux e Cármen Lúcia. Faltam ainda os ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Dias Toffoli.
O julgamento, que tem como origem uma ação da Rede Sustentabilidade, teve início na semana passada, quando Fachin proferiu seu voto.
São suspeitos de integrar o esquema de fake news deputados, empresários e blogueiros ligados ao presidente Jair Bolsonaro, que foram alvo de operação policial.
O inquérito foi aberto em março de 2019 como uma resposta do Supremo às crescentes críticas e ataques sofridos nas redes sociais.
Desde o início, porém, a apuração foi contestada por juristas e políticos por ter sido instaurada pelo presidente do tribunal, ministro Dias Toffoli, de ofício, ou seja, sem provocação da PGR (Procuradoria-Geral da República).
A ação do partido Rede Sustentabilidade, protocolada nove dias depois da abertura, pedia a extinção do inquérito.
Após a operação contra bolsonaristas, porém, a sigla recuou e disse que, embora tenha apresentado "inquietantes indícios antidemocráticos" no começo, a investigação "se converteu em um dos principais instrumentos de defesa da democracia".
A análise da ação foi retomada nesta quarta. Ao votar na ação, Moraes afirmou que os ataques contra a corte não são liberdade de expressão, mas sim "bandidagem".
"A liberdade de expressão não é liberdade de agressão. Não é liberdade de destruição da democracia, das instituições e da honra alheia. Reitero ter convicção de que não há democracia sem um Poder Judiciário forte. E não há Judiciário forte sem juízes altivos e seguros", disse.
Alvo de críticas e ameaças por parte de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), Moraes afirmou que "coagir, ameaçar e atentar contra o Supremo Tribunal Federal é atentar contra a Constituição Federal, é atentar contra a democracia, é atentar contra o estado democrático de direito".
O ministro leu ainda mensagens publicadas em redes sociais com mensagens de ódio ou de violência contra os magistrados. Ele disse que há incitação ao estupro de familiares dos integrantes da corte e que isso não pode ser considerado liberdade de imprensa.
"Que estuprem e matem as filhas dos ordinários ministros do STF'", disse, lendo uma das mensagens. "Em nenhum lugar do mundo isso é liberdade de expressão. Isso é bandidagem, criminalidade", afirmou, acrescentando que isso foi publicado por uma advogada do Rio Grande do Sul.
Tanto ele quanto o ministro Luís Roberto Barroso, segundo a votar nesta quarta, disseram que não há como se ter um Judiciário forte e independente sem que seus integrantes tenham liberdade para julgar os casos, afirmando que as ameaças interferem nisso.
Ao defender que o inquérito tenha continuidade, ele disse que o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, editou a portaria que deu levou à abertura do inquérito "para garantir a liberdade de expressão, para garantir a independência do Poder Judiciário".
Na retomada da sessão, no início da tarde, Fachin chegou a fazer um ajuste em seu voto para que ficasse mais próximo dos votos de Barroso e Moraes.
Na semana passada, o relator havia proposto que o objeto do inquérito fosse limitado a ações que ofereçam "risco efetivo" à independência do Poder Judiciário. Como exemplo de atos desta natureza, citou ameaças a ministros e a incitação ao fechamento do Supremo.
Sem mencionar o ministro da Educação, Abraham Weintraub, Fachin ressaltou que pedir a prisão de integrantes do STF também se enquadra nas hipóteses do inquérito.
O chefe da pasta da Educação do governo Jair Bolsonaro afirmou, em reunião ocorrida no dia 22 de abril, que, por ele, botaria "esses vagabundos todos na cadeia, começando pelo STF".
Barroso disse que o mundo contemporâneo vive um momento de "grave erosão democrática" por dificuldades das instituições de agirem.
Ao falar sobre isso, ele exclui o Brasil desse cenário e diz que as instituições brasileiras estão funcionando "vigorosamente" e que têm conseguido ser capaz de evitar que o país siga exemplos internacionais.
PONTOS CONTROVERSOS SOBRE O INQUÉRITO
Ato de ofício
Toffoli abriu o inquérito sem provocação de outro órgão, o que é incomum. Segundo o STF, porém, há um precedente: uma investigação aberta pela Segunda Turma da corte para apurar o uso de algemas na transferência do ex-governador do RJ Sérgio Cabral.
Competência
A investigação foi instaurada pelo próprio STF, quando, segundo críticos, deveria ter sido encaminhada para o Ministério Público. O argumento é que o órgão que julga não pode ser o mesmo que investiga.
Relatoria
Toffoli designou Alexandre de Moraes para presidir o inquérito, sem fazer sorteio ou ouvir os colegas em plenário. Assim, Moraes é quem determina as diligências investigativas.
Foro
O que determina o foro perante o STF é quem cometeu o delito, e não quem foi a vítima. Para críticos, a investigação não deve correr no Supremo se não tiver como alvo pessoas com foro especial.
Regimento
Toffoli usou o artigo 43 do regimento do STF como base. O artigo diz que, "ocorrendo infração à lei penal na sede ou dependência do tribunal, o presidente instaurará inquérito". Críticos dizem que os ataques pela internet não ocorrem na sede do Supremo, mas Toffoli deu a interpretação de que os ministros representam o próprio tribunal.
Liberdade de expressão
Moraes pediu o bloqueio de redes sociais de sete pessoas consideradas "suspeitas de atacar o STF". A decisão foi criticada por ferir o direito à liberdade de expressão. O mesmo pode ser dito sobre a censura, depois derrubada, aos sites da revista Crusoé e O Antagonista.