Para o ex-ministro da Justiça Sergio Moro, o combate à corrupção não é prioridade da gestão de Jair Bolsonaro. Em entrevista à revista Veja publicada na quinta-feira (30), Moro diz que aceitou o cargo porque achou que esse era um forte propósito do governo, mas afirmou ter se decepcionado com o passar do tempo. Na mesma conversa, falou de ataques do presidente, inquérito sobre as acusações feitas ao pedir demissão e intimidação nas redes sociais.
"Sinais de que o combate à corrupção não é prioridade do governo foram surgindo no decorrer da gestão. Começou com a transferência do Coaf para o Ministério da Economia. O governo não se movimentou para impedir a mudança. Depois, veio o projeto anticrime. O Ministério da Justiça trabalhou muito para que essa lei fosse aprovada, mas ela sofreu algumas modificações no Congresso que impactavam a capacidade das instituições de enfrentar a corrupção. Recordo que praticamente implorei ao presidente que vetasse a figura do juiz de garantias, mas não fui atendido. É bom ressaltar que o Executivo nunca negociou cargos em troca de apoio, porém mais recentemente observei uma aproximação do governo com alguns políticos com histórico não tão positivo. E, por último, teve esse episódio da demissão do diretor da Polícia Federal sem o meu conhecimento. Foi a gota d’água", disse à revista ao ressaltar o que seria um dos principais motivos de seu afastamento.
Sobre acusação de que o presidente queria interferir em procedimentos da Polícia Federal, o ex-ministro voltou a afirmar que apresentará as provas no momento oportuno, "quando for instado pela Justiça".
Diante das declarações de Moro, o presidente chegou a dizer que o ex-juiz tentou negociar a troca do comando da Polícia Federal por uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). Moro rebateu também Bolsonaro por ter lhe chamado de mentiroso e afirmou que não apenas o presidente sabe a verdade, como outros ministros: "Embora eu tenha um grande respeito pelo presidente, não posso admitir que ele me chame de mentiroso publicamente. Ele sabe quem está falando a verdade. Não só ele. Existem ministros dentro do governo que conhecem toda essa situação e sabem quem está falando a verdade", publicou Veja.
Ataques em redes sociais também foram apontados pelo ex-ministro como forma de intimidação, bem como o fato de o procurador-geral da República, Augusto Aras, pedir que fossem investigados os crimes de denunciação caluniosa e contra a honra, que podem ter sido praticados por Moro. "Entendi que a requisição de abertura desse inquérito que me aponta como possível responsável por calúnia e denunciação caluniosa foi intimidatória. Dito isso, quero afirmar que estou à disposição das autoridades. Os ataques mais virulentos vieram principalmente por redes virtuais. Não tenho medo de ofensa na internet, não", disse o ex-ministro.
Entre alguns apoiadores do presidente, Sergio Moro tem sido apontado como traidor e oportunista por fazer acusações graves em um momento de fragilidade do governo. O motivo: interesse nas eleições de 2022. Sobre isso, ressaltou que concedeu a entrevista a Veja "porque tenho sido sucessivamente atacado pelas redes sociais e pelo próprio presidente. Hoje mesmo, quarta, ele acabou de dar declarações, ontem deu declarações. Venho sendo atacado também por parte das pessoas que o apoiam politicamente. (...) Minha posição sempre foi de sentido técnico. Vou continuar buscando realizar um trabalho técnico, agora no setor privado. Não tenho nenhuma pretensão eleitoral. Não me filiei a partido algum. Nunca foi meu plano".