O mais recente ataque a jornalistas durante um ato pelo fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal gerou reações de políticos, magistrados e instituições. As agressões ocorreram em Brasília, neste domingo, Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. Repórteres, fotógrafos cinegrafistas e integrantes das equipes de apoio foram cercados, ameaçados e atingidos por chutes e pontapés por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro reunidos na Praça dos Três Poderes.
Enquanto o presidente acenava para apoiadores, o grupo passou a dirigir ofensas ao repórter fotográfico Dida Sampaio, de O Estado de S. Paulo, que registrava o momento. As pessoas se concentraram ao redor do profissional, que foi derrubado por duas vezes e agredido com chutes e socos nas costas e no estômago.
Além dele, o motorista do jornal, Marcos Pereira, também foi agredido. Outros repórteres e profissionais de imprensa foram então empurrados e ofendidos verbalmente.
Em nota oficial, a Associação Nacional dos Jornais (ANJ) cobrou das autoridades a identificação e responsabilização dos agressores que “atentaram de maneira covarde contra a integridade física daqueles que exerciam sua atividade profissional”. De acordo com a entidade, “atentar contra o livre exercício da atividade jornalística é ferir também o direito dos cidadãos de serem livremente informados”.
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) lembrou que as intimidações à imprensa têm se repetido em quase todos os atos de apoiadores do governo e são incentivadas pelo comportamento e discurso “belicoso e ultrajante do presidente da República”. “É inaceitável que militantes favoráveis ao governo saiam às ruas com objetivo expresso de intimidar os profissionais de imprensa, quando o próprio governo federal definiu o jornalismo como atividade essencial durante a pandemia”, aponta a Abraji, citando atitudes semelhantes registradas nas últimas semanas em Brasília e Porto Alegre.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, se solidarizou com os jornalistas agredidos, citou o ataque feito dois dias antes a enfermeiros na mesma Praça dos Três Poderes e cobrou punição aos criminosos, lamentando que o país tenha de lutar “contra o coronavírus e o vírus do extremismo, cujo pior efeito é ignorar a ciência e negar a realidade”.
No STF, pelo menos três ministros repudiaram o atentado à liberdade de imprensa. Luís Roberto Barroso disse que “mais que nunca precisamos de jornalismo profissional de qualidade, com informações devidamente checadas, em busca da verdade possível, ainda que plural. Assim se combate o ódio, a mentira e a intolerância".
Alexandre de Moraes manifestou solidariedade aos jornalistas e profissionais de saúde agredidos e pediu “que a Justiça seja célere para punir esses criminosos”. Cármen Lúcia afirmou ser “inaceitável que ainda tenhamos cidadãos que não entenderam que o papel da imprensa é que permite a nós sermos livres”.
Líder da Oposição na Câmara, o deputado André Figueiredo (PDT-CE) considerou inadmissível a agressão aos jornalistas: “É a violência e a intolerância que vão ganhando força, cria de um presidente que ataca a democracia e se pauta pelo ódio e o autoritarismo”. No Senado, o petista Jaques Wagner disse que a ação "merece repúdio de quem tem compromisso com a liberdade de imprensa".
Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz criticou ainda a fala de Bolsonaro durante live transmitida em meio à manifestação, na qual ele diz que chegou ao “limite” e não aceitará interferências em seu governo. “Os limites que existem são os da Constituição, e valem para todos, inclusive e sobretudo para o presidente. A única paciência que chegou ao fim, legitimamente e com razão, é a paciência da sociedade com um governante que negligencia suas obrigações, incita o caos e a desordem, em meio a uma crise sanitária e econômica”, comentou.
O líder do PSB na Câmara, Alessandro Molon (RJ), foi na mesma linha, afirmando que Bolsonaro já teria cometido ao menos 11 crimes. Ele pediu a Maia que aceite um pedido de impeachment apresentado pelo partido. “Bolsonaro avança em sua escalada contra a democracia. A cada dia, sobe o tom. É hora de os poderes constituídos reagirem em defesa da democracia. Se não, será tarde demais”, avalia o parlamentar.
O ex-ministro da Justiça, Sergio Moro, disse que democracia, liberdades de expressão e de imprensa e o Estado de Direito caminham juntos à integridade e tolerância. O governador Eduardo Leite repudiou "aqueles que agridem jornalistas e tentam, à força, impor sua visão de mundo e ideologia".
O jornal O Estado de S. Paulo também se manifestou em nota, afirmando que a violência nunca intimidou o jornal e pedindo punição aos agressores com investigações conduzidas por "agentes públicos independentes" do governo federal.
"A diretoria e os jornalistas de O Estado de S. Paulo repudiam veementemente os atos de violência cometidos hoje contra sua equipe de jornalistas durante uma manifestação diante do Palácio do Planalto em apoio ao presidente Jair Bolsonaro. Trata-se de uma agressão covarde contra o jornal, a imprensa e a democracia. A violência, mesmo vinda da copa e dos porões do poder, nunca nos intimidou. Apenas nos incentiva a prosseguir com as denúncias dos atos de um governo que, eleito em processo democrático , menos de um ano e meio depois dá todos os sinais de que se desvia para o arbítrio e a violência".
"Dada a natureza dos acontecimentos deste domingo, esperamos que a apuração penal e civil das agressões seja conduzida por agentes públicos independentes, não vinculados às autoridades federais que, pela ação e pela omissão, se acumpliciam com o processo em curso de sabotagem do regime democrático", completou o jornal.