Na tarde desta quarta-feira (29), o governo federal trocou o cargo de José Vicente Santini, exonerado por utilizar um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para se integrar à comitiva do presidente Jair Bolsonaro na Índia.
Santini foi exonerado do cargo de secretário-executivo da Casa Civil pela manhã e, nesta tarde, nomeado assessor especial da Secretaria de Relacionamento Externo da pasta. A diferença de salário é de R$ 382,75 — Santini ganhava R$ 17.327,65 como secretário-executivo (cargo de natureza especial) e ganhará R$ 16.944,90 como assessor especial (de direção e assessoramento superior).
Bolsonaro havia anunciado o afastamento de Santini na terça-feira (28), sem dizer que ele assumiria nova função com remuneração semelhante.
— Inadmissível o que aconteceu. Já está destituído da função de executivo do (ministro) Onyx (Lorenzoni). Destituído por mim. Vou conversar com Onyx para decidir quais outras medidas podem ser tomadas contra ele. É inadmissível o que aconteceu, ponto final — afirmou o presidente ao chegar ao Palácio da Alvorada após viagem à Índia.
Bolsonaro ficou irritado com o fato de Santini ter usado um jato da FAB com apenas três passageiros para voar de Davos, onde participava do Fórum Econômico Mundial, para Nova Délhi, para acompanhar a viagem presidencial.
A informação havia sido divulgada pelo jornal O Globo. Segundo o jornal, Santini seguiu de Davos, na Suíça, para a Índia num voo da FAB com apenas mais duas assessoras. O secretário estava representando o titular da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que está em férias.
Na terça, o presidente não excluiu a possibilidade de ele ocupar outras funções no governo.
— O cargo de executivo da Casa Civil já está perdido. Outras coisas virão depois de eu conversar com Onyx — disse. —Isso é decisão minha. Aguardo Onyx, não posso também desprestigiar o ministro, né? Vou ver os argumentos dele. Daí, ver se teremos mais alguma medida suplementar disso aí — afirmou.
Bolsonaro disse ainda que o uso da aeronave não é "ilegal", mas "imoral". A assessoria de imprensa da Casa Civil informou que "a solicitação (do avião) seguiu os critérios definidos na legislação vigente".
— O que ele fez não é ilegal, mas é completamente imoral. Ministros antigos foram de avião comercial, classe econômica.(...) A explicação que chegou no primeiro momento, de que "ele teve de participar de reunião de ministros por isso". Essa não, essa desculpa não vale.
Quem é Vicente Santini
Santini assumiu o cargo de secretário-executivo quando o antigo ocupante do posto, Abraham Weintraub, foi indicado para ser ministro da Educação, em abril de 2019. Ele conheceu a família Bolsonaro dos círculos de militares por ser filho de general do Exército.
Desde que entrou para o governo, costumava fazer publicações em redes sociais com filhos do presidente, como o deputado Eduardo (PSL-SP) e o senador Flávio (sem partido-RJ), além de trocarem mensagens em tom elogioso um ao outro.
Formado em direito pela Universidade Católica de Brasília, tem mestrado e doutorado pela UniCeuB. Foi também da Subchefia de Acompanhamento e Monitoramento, onde acompanhou casos como o desastre de Brumadinho (MG).
Antes de assumir cargo público, era sócio de um escritório de advocacia em Brasília. Em seu currículo público, disponível em suas redes sociais, Santini diz ter trabalhado entre 2007 e 2012 no Ministério da Defesa com assuntos ligados a privatizações e aviação civil.
Uso de aviões da FAB
O uso de aeronaves da FAB é regulamentado por dois decretos: 4.244, de 22 de maio de 2002, e 8.432, de 9 de abril de 2015. O presidente da República está sempre autorizado a usar aeronaves da FAB em qualquer que seja seu deslocamento. Além dele, podem usar aviões oficiais o vice-presidente, os presidentes do Senado, da Câmara e do Supremo Tribunal Federal (STF).
Ministros de Estado e demais ocupantes de cargo público com prerrogativas de ministro também são autorizados, assim como os comandantes das Forças Armadas e o chefe do Estado-Maior do Conjunto das Forças Armadas. As condições para uso por essas autoridades, de acordo com a FAB, são por motivos de segurança, emergência médica e viagens a serviço. O órgão ainda informa que "não cabe à FAB apurar se os motivos das solicitações de apoio são efetivamente cumpridos".
Um decreto de 2015, editado no governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), restringiu ao vice-presidente da República e aos presidentes do Senado, da Câmara e do STF o direito de usarem a aeronave para deslocamento para residência fixa. A legislação não traz restrições quanto aos acompanhantes das autoridades, mas os nomes não são divulgados.
Os dados sobre os voos são listados no site da FAB no dia útil seguinte à viagem. As informações públicas são local de destino e origem, cargo do solicitante, motivo da solicitação, horário de pouso e decolagem e número de passageiros, mas não há identificação dos que embarcaram.
A FAB não informou os custos estimados da aeronave que levou Santini às duas viagens.
"Os custos operacionais das missões em aeronaves da FAB estão classificados no grau de sigilo reservado pois são considerados estratégicos por envolverem aviões militares", informa a FAB em seu site.
Em uma cotação feita nesta terça-feira pela reportagem da Folha de S.Paulo, um voo de Zurique, na Suíça, para Nova Délhi, com retorno para Brasília, sairia em média R$ 7 mil por passageiro para uma viagem em intervalo semelhante ao feito pelo ex-secretário e assessoras.