O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral fechou um acordo de delação premiada com a Polícia Federal. O procurador-geral da República, Augusto Aras, se manifestou contra a homologação do contrato, que será analisado pelo ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF).
A delação de Cabral, cuja negociação começou no início deste ano, inclui ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), outros magistrados e políticos.
O acordo foi revelado pelo jornal O Globo e confirmado pela reportagem. A defesa de Cabral afirmou que não vai se manifestar sobre o tema. O ex-governador recorreu à PF após ter acordo rejeitado no Ministério Público Federal do Rio de Janeiro, responsável pelas investigações contra ele. Aras endossou o veto no STF.
— Somos contrários a uma colaboração premiada do ex-governador Sérgio Cabral. Ele é o líder de uma organização criminosa muito poderosa. É um dos responsáveis pela falência do estado. Nós conseguimos por meios independentes chegar a muito do que ele poderia nos ajudar numa colaboração. Não seria uma resposta que o MPF gostaria de dar à sociedade — disse o procurador Eduardo El Hage ao jornal Folha de S.Paulo em novembro.
Preso há três anos, o ex-governador adotou nova postura no início do ano ao confessar os crimes que lhe são atribuídos. O objetivo inicial era reduzir as penas, que já somam quase 268 anos — decorrentes das 12 condenações nas 31 ações penais vinculadas à Lava-Jato a que responde. Mas também sinalizar o poder das informações que dizia ter.
Num de seus primeiros interrogatórios como réu confesso, ele afirmou ao juiz federal Marcelo Bretas que foi "achacado" por deputados federais e senadores, além de feito "tratos" com ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Tribunal de Contas da União (TCU).
Sem mencionar nomes, o ex-governador citou os casos ao afirmar que a propina que recebia deixou de ser enviada ao exterior em 2012 para ser distribuída no país.
Foi naquele ano que Cabral começou a sofrer uma dura crise política após a divulgação das fotos do episódio conhecido como "farra dos guardanapos", em que confraterniza com empresários e ex-secretários em Paris.
— O dinheiro a partir de 2012 deixa de ir para o exterior e passa a ser usado aqui. Fui achacado por parlamentares federais, tive que fazer tratos com ministros do STJ e TCU — afirmou o emedebista em abril, que não mencionou o caso da "farra" no interrogatório.
O emedebista afirmou também que teve "que atender presidente da República para beneficiar certas pessoas". Ele não especificou a qual presidente se referia.
Ele mencionou no depoimento o ministro Marco Aurélio Belizze, do STJ. Afirmou que atuou para garantir sua nomeação por pressão "e até ameaça" do ex-secretário Régis Fichtner, cunhado do magistrado.
Esta indicação contrariou a ex-primeira-dama Adriana Ancelmo, que havia indicado seu sócio Rodrigo Cândido de Oliveira.
Os dois não disputaram diretamente pela mesma vaga, já que Belizze entraria como magistrado e Oliveira, no quinto constitucional reservado a advogados. Contudo, segundo a reportagem apurou, a nomeação do sócio de Adriana inviabilizaria o atual ministro, já que havia apenas uma vaga disponível sob influência de Cabral.
— Liguei para a presidente Dilma (Rousseff), e ela até disse que estava com o papel na mesa dela para assinar. Tive que fazer esse papelão de barrar o sócio da minha esposa para atender o Régis — disse Cabral na ocasião.
No lugar de Oliveira, foi nomeado o ministro Sebastião Reis Júnior em junho de 2011. Belizze ascendeu ao tribunal em agosto do mesmo ano.
Aos poucos, o ex-governador deixou de lado os longos depoimentos, focando apenas no objeto das ações penais. Deixava sempre claro, contudo, a intenção de colaborar "em outras condições".