Após um dia marcado por protestos contra o Judiciário, em Brasília, o Supremo Tribunal Federal (STF) adiou a decisão sobre o processo que pode levar à anulação de sentenças da Lava-Jato. A Corte analisa se réus delatores devem apresentar as alegações finais do processo sempre antes dos delatados. Se esse entendimento for o vencedor, poderá reverter decisões da operação. Nesta quarta-feira (25), apenas o relator, ministro Edson Fachin, apresentou seu voto, contrário à tese. O julgamento deverá ser retomado nesta quinta-feira (26).
Na prática, a corte julga um habeas corpus do ex-gerente da Petrobras Márcio de Almeida Ferreira. Ele pede a anulação da sentença que o condenou, em 1º grau, por corrupção e lavagem de dinheiro.
O processo que deu origem à discussão foi do ex-presidente da Petrobras e do Banco do Brasil, Aldemir Bendine. Ele foi condenado pelo ex-juiz Sergio Moro por corrupção e lavagem de dinheiro. No entanto, a 2ª Turma do Supremo anulou a sentença, em agosto, acolhendo tese de que o réu havia entregado suas alegações finais depois de outros réus que haviam celebrado acordos de delação premiada, o que poderia cercear sua defesa.
Com isso, Fachin, que é contrário a esse entendimento, encaminhou caso semelhante ao plenário. Os ministros do STF devem estabelecer o alcance da decisão tomada em agosto, a partir do pedido de habeas corpus de Almeida Ferreira.
Apesar da contrariedade de Fachin, a tendência é de que a maioria dos 11 magistrados siga o caminho de permitir anulações nos processos em que haja reclamações da defesa desde a primeira instância. Discordando da tese, Fachin encaminhou o caso de Almeida ao plenário, para que os 11 magistrados definam um entendimento sobre o tema.
— A lei processual diferencia os momentos do MP (Ministério Público) e da defesa. Não distingue, entretanto, o momento de participação entre defesas em razão de eventual postura colaborativa por parte de uma das partes — pontuou o ministro.
Em todos os casos envolvendo a Lava-Jato, a Justiça ofereceu o mesmo prazo de alegações finais para todos os réus, sem distinguir os que foram citados em delações ou os que delataram. Para Fachin, a situação não configura ilegalidade. Ele negou o habeas corpus.
Antes do ministro, em uma fala emocionada, o procurador-geral da República interino, Alcides Martins, apresentou seu parecer. Ele assumiu o cargo após o fim do mandato de Raquel Dodge até que o posto seja assumido por Augusto Aras, indicado por Jair Bolsonaro, que teve o nome aprovado pelo Senado na tarde desta quarta-feira (25). Para ele, a concessão dos mesmos prazos para réus delatores ou delatados não é ilegal.
Por se tratar de um habeas corpus, mesmo que o recurso seja concedido à defesa, valerá apenas para Almeida. Ainda assim, por gerar jurisprudência, poderá servir de base para novas decisões.
A defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu a anulação de duas condenações: a dos casos do tríplex do Guarujá e das reformas em um sítio em Atibaia. O petista já foi condenado em primeira instância nos dois processos.
Confronto com manifestantes
Durante a tarde desta quarta-feira (25), um grupo de defensores da CPI da Lava-Toga — ainda sem apoio mínimo no Senado —, e que pede o impeachment de ministros do STF, entrou em confronto com policiais militares na Praça dos Três Poderes, em Brasília. O grupo jogou tomates e ratos de plástico em direção ao prédio da corte e foi repelido com gás de pimenta e balas de borracha.
Testemunhas relataram que os agentes também foram atingidos por paus e pedras. Um policial sofreu ferimentos leves e precisou de atendimento. Os manifestantes inflaram um boneco que representa o ministro da Justiça, Sergio Moro, como um super-herói, além de outros, com críticas a Gilmar Mendes e ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre.
O protesto foi chamado por grupos de direita depois que pessoas ligadas ao governo, como o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o escritor Olavo de Carvalho, passaram a defender que a CPI da Lava-Toga não fosse realizada.
No local, também havia um grupo que defende a liberdade do ex-presidente Lula, mas que não participou do confronto.
O que poderá ser decidido pelo STF
- Negar habeas corpus e fechar entendimento de que os réus — delatados e delatores — devem ter o mesmo prazo para a entrega de alegações finais nos processos. Este caso não levaria a anulações de sentenças da Lava-Jato.
- Acolher a tese da defesa e anular parte do processo, para que o réu delatado tenha mais prazo do que o réu delator para entregar as alegações finais. Neste caso, o STF pode seguir teses diferentes quanto à extensão da decisão.
- O mais provável, que deve ter o apoio da maioria, é sustentar que os réus devem ter prazos diferentes, mas modulando os efeitos, estipulando uma régua para disciplinar o procedimento a partir de agora, evitando que as defesas de condenados da Lava-Jato inundem a corte com recursos.
- Entender que a forma como os processos foram conduzidos pelo ex-juiz Sergio Moro cercearam a defesa de réus que foram delatados em colaborações premiadas, o que abriria a possibilidade de anulação de parte das ações penais, a partir das interrogatórios e alegações finais.