Uma década após a Polícia Federal encontrar indícios de pagamentos de propina da empreiteira Camargo Corrêa em obras do Metrô de São Paulo, em documentos apreendidos no âmbito da Operação Castelo de Areia, novas suspeitas de irregularidades no sistema metroferroviário continuam surgindo.
Em novas delações premiadas, executivos de empresas e até um ex-funcionário do Estado têm apontado supostos pagamentos de propina e formação de conluios para a elaboração de projetos e construção das linhas do Metrô e da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).
Os episódios relatados aconteceram em gestões tucanas entre o fim dos anos 1990, no governo Mario Covas, e o quarto mandato de Geraldo Alckmin, encerrado em 2018. São citados supostos repasses a campanhas de políticos do PSDB e do DEM, entre eles o ex-governador José Serra (PSDB), que sempre negou ter recebido qualquer tipo de vantagem indevida.
O Metrô e a CPTM ficaram conhecidos pelos frequentes atrasos em obras, aditivos em contratos que oneram os cofres públicos, trechos inconclusos e um desabamento que deixou sete mortos em 2007. Os órgãos, subordinados à Secretaria de Transportes Metropolitanos, viraram alvo recente da Lava Jato de São Paulo, com uma denúncia que tornou 14 pessoas rés sob acusação de corrupção por situações que ocorreram nas linhas de 2004 a 2014.
Alguns nomes se repetem com frequência nos escândalos de corrupção
Sérgio Corrêa Brasil, 67 anos, que foi gerente e diretor do Metrô, além de assessor de parcerias público-privadas na Secretaria Estadual de Planejamento, é um nome que frequentemente aparece em denúncias.
Nos últimos meses, ele fechou delação com o Ministério Público Federal (MPF) — a primeira de um funcionário público envolvido no esquema do Metrô. Os outros são Luiz Carlos Frayze David (ex-presidente do Metrô) e Décio Tambelli (ex-diretor de Operações). Eles aparecem como beneficiários de suborno nas delações de executivos da Odebrecht, homologadas em 2017. Em anotações apreendidas pela Polícia Federal em 2009, na Castelo de Areia, já eram citados por supostos repasses do doleiro da Camargo Corrêa, Kurt Paul Pickel.
Nelas, eram ligados a repasses pelas obras das linhas 2-verde e 4-amarela. Também eram mencionados pagamentos a conselheiros do Tribunal de Contas do Estado (TCE).
A operação, no entanto, acabou anulada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), dois anos depois, por ter sido baseada em denúncia anônima.
Em seu acordo, Sérgio Brasil se comprometeu a ressarcir R$ 6,6 milhões aos cofres públicos. Já David e Tambelli não precisaram fazer colaboração: o prazo para a apresentação de acusações sobre os episódios prescreveu.
Investigações "previram" vencedores de licitações
Em 2010, a Folha de São Paulo registrou, com seis meses de antecedência, quais seriam os vencedores de seis lotes da linha 5-lilás. A expansão dela foi contratada por R$ 6,6 bilhões, em valores do ano passado.
Três anos depois da série de reportagens, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) firmou um acordo de leniência com a Siemens, que delatou às autoridades crimes supostamente praticados por ela, outras 15 empresas e mais de uma centena de funcionários em licitações de 1998 a 2013.
O acordo, que abrangia outros estados, resultou neste ano na condenação ao pagamento de R$ 515 milhões por 11 empresas, como a Alstom e a Bombardier.
Em nota, a Secretaria de Transportes Metropolitanos, agora sob a gestão de João Doria (PSDB), informou que a atual gestão da pasta "é a maior interessada na apuração dos fatos para que os culpados sejam punidos e o estado, ressarcido".
"A STM apoia as investigações sobre todas as suspeitas de irregularidade ou de corrupção e está sempre à disposição das autoridades para contribuir com o andamento dos processos", disse.
A Alstom não tem comentado o caso, e a Bombardier já afirmou que contestará a decisão do Cade. Luiz Carlos Frayze David e Décio Tambelli e suas defesas não foram localizados.