Portando armas de grosso calibre, um grupo de até 15 invasores da Terra Indígena Waiãpi, no oeste do Amapá, tomou uma aldeia e tem feito incursões para intimidar índios que habitam uma região remota no estado, afirma documento interno da Fundação Nacional do Índio (Funai).
Baseada em relatos dos waiãpis, a Funai diz que o grupo, formado por 10 a 15 homens, foi o responsável pelo assassinato do líder Emyra Waiãpi, na semana passada. O órgão indigenista ressalva que ainda não esteve no local do crime, acessível apenas após uma viagem de carro, de barco e a pé.
A invasão ocorre em meio a seguidas declarações do presidente Jair Bolsonaro de que pretende legalizar mineração e garimpos em terras indígenas, uma promessa de campanha. A mudança na legislação, no entanto, precisa do aval do Congresso.
O documento da Funai afirma que os invasores estão dormindo na aldeia Aramirã, forçando os waiãpis a se concentrarem em uma comunidade vizinha, Marity, distante 40 minutos a pé.
A Funai orientou os indígenas a não se aproximarem dos homens armados, possivelmente garimpeiros. Aregião é rica em ouro.
"Podemos concluir que a presença de invasores é real e que o clima de tensão e exaltação na região é alto", concluiu o memorando interno, que recomenda que a presidência da Funai busque o apoio da Polícia Federal e do Exército.
Em nota, o Conselho das Aldeias Wajãpi (Apina), informou que o Emyra foi assassinado na segunda-feira (22), mas que não houve testemunhas e que o corpo só foi encontrado no dia seguinte.
Já os waiãpis afirmam que, na sexta-feira (26), indígenas da aldeia Yvytotõ encontraram não índios armados.
"À noite, os invasores entraram na aldeia e se instalaram em uma das casas, ameaçando os moradores", diz o comunicado dos índios.
Neste domingo (28), agentes da PF e do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da PM do Amapá chegaram à TI Waiãpi, somando-se a uma equipe da Funai. O Ministério Público Federal no Amapá abriu uma investigação sobre o caso. Já a PF instaurou um inquérito.
Um dia antes, Bolsonaro, um opositor histórico das demarcações, disse que quer o filho, Eduardo, como embaixador do Brasil nos EUA para que ele possa atrair investimento norte-americano na exploração de minérios em territórios indígenas.
Na semana passada, em visita a Manaus, o presidente voltou a prometer a legalização de garimpos, que hoje devastam e contaminam diversas terras indígenas, incluindo a dos ianomâmis (RR/AM), dos mundurucus (PA) e dos cinta-larga (RO).
Na terça-feira (23), o jornal O Globo revelou que o governo Bolsonaro finalizou a minuta de um projeto de lei que regulamenta a mineração em terras indígenas.
No início do governo, Bolsonaro transferiu a demarcação das terras indígenas e quilombolas para o Ministério da Agricultura, controlado pelos ruralistas. Além disso, a Funai passou do Ministério da Justiça, Sergio Moro, para a pasta de Direitos Humanos, de Damares Alves. Ambas as mudanças, porém foram barradas pelo STF e pelo Congresso, respectivamente.
Em junho, após ser demitido da presidência da Funai, o general Franklimberg Ribeiro de Freitas disse que o ruralista e secretário especial de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Nabhan Garcia, "saliva ódio aos indígenas".
Na semana passada, Bolsonaro nomeou para comandar a Funai o delegado da PF Marcelo Augusto Xavier da Silva, próximo dos ruralistas e de Garcia.
Em nota, a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) afirmou que a invasão do território waiãpis é resultado dos "posicionamentos intransigentes, irresponsáveis, autoritários, preconceituosos, arrogantes e desrespeitosos do atual governo, especialmente do senhor presidente da República, Jair Bolsonaro, com os ataques que vêm fazendo aos direitos dos povos originários deste país, sobretudo aos direitos territoriais já garantidos em terras indígenas completamente demarcadas e regularizadas à luz da Constituição Federal de 1989 e que esse governo vem a todo momento tentando retroceder".