BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidente Jair Bolsonaro (PSL) editou nesta quarta-feira (19) uma nova medida provisória que reverte decisão de maio do Congresso e devolve a tarefa de demarcação de terras indígenas no país ao Ministério da Agricultura.
Publicada no Diário Oficial, a nova MP, de número 886, assinada por Bolsonaro e pelos ministros Paulo Guedes (Economia) e Onyx Lorenzoni (Casa Civil), estabelece que constituem áreas de competência da Agricultura a reforma agrária, a regularização fundiária de áreas rurais, a Amazônia Legal, as terras indígenas e as terras quilombolas.
A seguir, o texto diz que tais competências incluem "a identificação, o reconhecimento, a delimitação, a demarcação e a titulação das terras ocupadas pelos remanescentes das comunidades dos quilombos e das terras tradicionalmente ocupadas por indígenas".
Com a medida, que terá de ser avaliada por Câmara e Senado, Bolsonaro driblou uma decisão do Congresso de maio. Na primeira medida provisória que editou no seu governo e que reestruturou a administração pública federal, em janeiro, Bolsonaro havia retirado a demarcação de terras indígenas da alçada da Funai (Fundação Nacional do Índio) e enviado para a pasta da Agricultura.
Foi a primeira vez desde a criação do antigo SPI (Serviço de Proteção ao Índio) em 1910, antecessor da Funai, que o serviço de demarcação foi retirado do órgão. Em votação, porém, os parlamentares decidiram manter a Funai, com as atribuições originais, na pasta da Justiça, sob o comando de Sergio Moro.
Na época o resultado foi comemorado como uma vitória por indígenas e pela Frente Parlamentar Indígena, coordenado pela deputada Joênia Wapichana (Rede-AP).
A bancada ruralista no Parlamento emitiu carta pública para dizer que reverteria a decisão no plenário, mas foi derrotada pelos parlamentares.
Em agenda em Guaratinguetá, no interior de São Paulo, nesta quarta, Bolsonaro criticou a decisão do Congresso de modificar medida provisória de janeiro e manter na Justiça a atribuição de demarcar terras indígenas no país.
"O Legislativo não pode fazer o que fez", disse o presidente após evento da Aeronáutica. "A iniciativa de mudar [MP] é privativa nossa."
"A questão de reserva indígena quem decide, na ponta da linha, sou eu. Sou eu quem assina o decreto demarcatório e eu não vou assinar nenhuma nova reserva indígena no Brasil." Até o final de 2018, 112 terras indígenas aguardavam estudos na Funai com o objetivo de demarcação e outras 42 já haviam sido identificadas e delimitadas, aguardando só aval do governo para demarcação.
Indígenas reivindicam outras cerca de 500 terras como de ocupação tradicional.
A nova MP repercutiu mal entre indígenas e indigenistas. "Persiste o conflito de interesses em subordinar direitos territoriais indígenas a ruralistas, mas, com a reedição da MP, a questão assume proporções de conflito entre os Poderes da República, pois o Executivo ignora decisão do Legislativo que devolveu a Funai ao Ministério da Justiça", disse Márcio Santilli, sócio-fundador do ISA (Instituto Socioambiental) e ex-presidente da Funai.
A deputada Joênia disse que a Rede prepara ação direta de inconstitucionalidade para tentar anular a MP. "A palavra do dia é afronta. Ele está afrontando e desrespeitando a separação dos Poderes, que está na Constituição. Já há decisões no Supremo dizendo que o Executivo não pode reeditar duas vezes a mesma matéria em MP. A gente vai questionar a constitucionalidade."
Pela lei, Bolsonaro não pode editar duas MPs sobre o mesmo assunto na mesma legislatura do Congresso. Mas o governo poderá argumentar que a primeira MP rejeitada no Congresso foi editada em janeiro, quando a legislatura era outra. A posse dos parlamentares ocorreu em fevereiro.
Oposicionistas pediram ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que devolva a medida ao governo. Caso ele decida fazê-lo, o texto perderá validade. A devolução de medidas provisórias cabe ao presidente do Congresso, posto que é ocupado pelo presidente do Senado.
O QUE MUDA COM A MP
Reforma agrária e demarcação de terras indígenas"Sob o guarda-chuva do Ministério da Justiça (de Sergio Moro), voltam à Agricultura (chefiada por Tereza Cristina). Mudança foi derrubada pelo Congresso em maio
ARTICULAÇÃO POLÍTICA
Antes responsabilidade da Casa Civil, sob Onyx Lorenzoni, passa para a Secretaria de Governo. A pasta será chefiada pelo general Ramos
IMPRENSA INTERNACIONAL, SAJ e PPI
Imprensa Nacional e Subchefia de Assuntos Jurídicos deixam a Casa Civil e passam para a Secretaria-Geral, sob o general Floriano Peixoto. Já o PPI (Programa de Parcerias e Investimentos) sai da Secretaria de Governo e vai para a Casa Civil
Vou estudar a lista, diz presidente sobre PGR
Questionado se indicará à Procuradoria-Geral da República um dos eleitos na lista tríplice da Associação Nacional dos Procuradores da República, Jair Bolsonaro disse que vai "estudar a lista". "Vou seguir a Constituição." Não há na lei determinação para que ele indique nome da lista. Os mais votados da categoria foram Mario Bonsaglia, Luiza Frischeisen e Blal Dalloul.