Em discurso forte durante palestra nos Estados Unidos, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso afirmou que a corte está sob ataque e vive um momento de descrédito porque alguns de seus colegas atuam como obstáculo no combate à corrupção no Brasil.
Sem nominar nenhum dos outros 10 magistrados que dividem com ele o plenário do STF, Barroso disse nesta quinta-feira (25) que há um sentimento em grande parte da sociedade de que o Supremo protege a elite corrupta do país e que, por isso, tem perdido confiança e credibilidade.
— A pergunta que me faço frequentemente é por que o STF está sob ataque, por que está sofrendo esse momento de descrédito. Bem, o que acho que está acontecendo é que há uma percepção em grande parte da sociedade e da imprensa brasileira de que o STF é um obstáculo na luta contra a corrupção no Brasil — disse o ministro durante palestra na Universidade de Columbia, em Nova York.
— Eles sentem que o Supremo frequentemente protege a elite corrupta — completou.
A declaração do ministro ocorre em meio à escalada de tensão entre os Poderes no Brasil e no momento em que a decisão de investigar ou reagir aos críticos, por exemplo, dividiu o tribunal.
Na semana passada, o presidente do STF, Dias Toffoli, e o ministro Alexandre de Moraes protagonizaram episódios em relação ao inquérito que investiga a divulgação de fake news contra integrantes da corte. Moares chegou a determinar a retirada do ar de uma reportagem contra Toffoli -depois recuou.
Para Barroso, quando o Supremo toma decisões com as quais a sociedade não concorda ou não entende, "a força é a única coisa que resta".
— Uma corte que repetidas vezes toma decisões com as quais a sociedade não concorda e não entende, aí se tem um problema. Porque autoridade depende de confiança e credibilidade. Se você perde isso, a força é a única coisa que resta — afirmou o ministro.
Diante de uma plateia em que estava o juiz federal Marcelo Bretas, que comanda a Operação Lava Jato no Rio, Barroso listou o que diz serem os motivos objetivos que levaram o STF ao atual cenário, como diversos habeas corpus concedidos pela 2ª Turma do STF a presos por corrupção, a decisão da corte de passar para a Justiça Eleitoral o julgamento de crimes ligados a caixa dois -que não tem "estrutura nem expertise para isso"-, e a condenação da prática de conduções coercitivas, por exemplo, em suas palavras, usadas desde 1940.
Para Barroso, alguns ministros "mostram mais raiva de procuradores e juízes que estão fazendo um bom trabalho do que de criminosos que saquearam o país".
— Tudo o que o STF pode retirar da Vara Federal de Curitiba, onde o combate à corrupção está funcionando bem, ele [Supremo] o fez — afirmou.
O ministro Gilmar Mendes, com quem Barroso já teve diversos embates públicos, concedeu habeas corpus a diversos presos no Rio, como ao empresário Jacob Barata Filho, investigado pelo envolvimento em um esquema de corrupção que atuou no setor de transportes do Rio e teria movimentado R$ 260 milhões em propina.
No início de sua fala, logo após o discurso de Barroso, o juiz Marcelo Bretas fez referência às ponderações do ministro e disse que era "irrelevante a opinião que um ministro -e não estou falando do Barroso- tenha sobre a minha pessoa". Os confrontos entre Bretas e Gilmar Mendes também são notórios.
— Não podemos nos acovardar, não podemos temer nenhum tipo de reação. Barroso falou que o trabalho de combate à corrupção tem sido muito atacado ultimamente, por parte de autoridades que estão acima da minha autoridade, mas para mim é irrelevante a opinião que um ministro tenha sobre a minha pessoa, isso é irrelevante para o nosso trabalho — disse o responsável pela Lava Jato no Rio.
Barroso falou ainda que a democracia brasileira vive hoje "um momento sombrio", mas que é preciso apostar na política para mudar os paradigmas.
De acordo com o ministro, que listou o que classifica como conquistas da sociedade brasileira dos últimos 30 anos, "o filme de democracia no Brasil é muito bom, mas a foto neste momento é um pouco sombria".
Ele afirmou que há estabilidade institucional e econômica no país, além de avanços na inclusão social e diminuição da pobreza extrema, mas na sua opinião o país só vai passar para o patamar do mundo desenvolvido quando acabarem os escândalos éticos.
— Não é um momento trágico, é um momento difícil mas é um momento de recomeço pelo qual o país precisa passar — declarou.