O ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro tem trocado farpas com o ex-primeiro-ministro luso, José Sócrates. A discussão começou quando o ex-juiz da Operação Lava-Jato, durante o VII Fórum Jurídico de Lisboa, apontou "alguma dificuldade institucional" no sistema processual de Portugal. As informações são dos jornais Estado de S.Paulo e do Observador.
— É famoso o exemplo envolvendo o antigo primeiro-ministro José Sócrates (na Operação Marquês, no qual ele é acusado de 31 crimes), que, vendo à distância, percebe-se alguma dificuldade institucional para que esse processo caminhe num tempo razoável, assim como nós temos essa dificuldade institucional no Brasil. — afirmou o ministro brasileiro.
Na saída da conferência, Moro deu outra declaração, dessa vez somente para jornalistas:
— Aquilo que observo à distância, em relação ao caso desse primeiro-ministro português, é que há um trabalho que tem sido feito, com esforços consideráveis para apuração de provas, mas segundo algumas autoridades portuguesas com as quais falei, não há uma previsão de término desse processo — lamentou.
Na segunda-feira (22), Sócrates retrucou Moro citando uma série de ocorrências da Operação Lava-Jato até a condenação do ex-presidente Lula no processo do triplex do Guarujá, litoral Norte de São Paulo. A declaração foi publicada no site jurídico Migalhas.
“O que o Brasil está a viver é uma desonesta instrumentalização do seu sistema judicial ao serviço de um determinado e concreto interesse político. É o que acontece quando um ativista político atua disfarçado de juiz.”, escreveu.
Além disso, na terça-feira (24), Sócrates intensificou as críticas, afirmando que Moro só chegou a juiz por ter mandado prender Lula.
Em entrevista à RecordTV Europa também na terça (23), Moro respondeu à declaração de Sócrates, afirmando que em todo o mundo é difícil lidar com crimes de grande corrupção e que todos os países precisam avançar nessa área.
— Em relação à pessoa em particular (Sócrates), eu não debato com criminosos pela televisão. Então, não vou fazer mais comentários — afirmou o ministro brasileiro.
O Ministério Público de Portugal acusa José Sócrates de lavagem de dinheiro, corrupção passiva, falsificação de documentos e fraude fiscal qualificada, no âmbito dos processos da Operação Marquês, que investiga supostos pagamentos ao ex-primeiro-ministro para favorecer o grupo Portugal Telecom.
Segundo a promotoria, Sócrates mandou à Suíça 24 milhões de euros que teriam origem nos grupos Lena, Espírito Santo e Vale de Lobo. Ele nega as acusações. Até agora, o ex-premier não foi levado a juízo. A operação encontra-se na fase de instrução no Tribunal Central de Lisboa desde janeiro de 2019.
Leia, na íntegra, a publicação de José Sócrates para o site jurídico Migalhas:
O juiz valida ilegalmente uma escuta telefónica entre a Presidente da República e o anterior Presidente. O juiz decide, ilegalmente, entregar a gravação à rede de televisão globo, que a divulga nesse mesmo dia. O juiz condena o antigo presidente por corrupção em “atos indeterminados”. O juiz prende o ex- presidente antes de a sentença transitar em julgado, violando frontalmente a constituição brasileira. O juiz, em gozo de férias e sem jurisdição no caso, age ilegalmente para impedir que a decisão de um desembargador que decidiu pela libertação de Lula seja cumprida.
O conselho de direitos humanos das Nações Unidas decide notificar as instituições brasileiras para que permitam a candidatura de Lula da Silva e o acesso aos meios de campanha. As instituições brasileiras recusam, violando assim o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos que o Brasil livremente subscreveu. No final, o juiz obtém o seu prémio: é nomeado ministro da justiça pelo Presidente eleito e principal beneficiário das decisões de condenar, prender e impedir a candidatura de Lula da Silva.
O espetáculo pode ter aspectos de vaudeville mas é, na realidade, bastante sinistro. O que o Brasil está a viver é uma desonesta instrumentalização do seu sistema judicial ao serviço de um determinado e concreto interesse político. É o que acontece quando um ativista político atua disfarçado de juiz. Não é apenas um problema institucional, é uma tragédia institucional. Voltarei ao assunto.