Um número ainda incerto de gaúchos irá dispensar a praia na virada do ano para ir a Brasília. Fãs de Jair Bolsonaro (PSL), optaram por uma viagem de 2 mil quilômetros para acompanhar a posse do presidente eleito em vez de ir ao Litoral. Marcada para as 15h de 1º de janeiro, a solenidade deverá ser uma das mais concorridas da história do país, segundo o setor hoteleiro da capital federal. Para o segmento, a procura só se compara à posse do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 2003.
– Uma mudança no cenário político é um gatilho para as pessoas se interessarem pela cerimônia – afirma Saulo Borges, gerente comercial da rede Plaza Brasília Hotéis.
Dos mil quartos espalhados nos quatro empreendimentos que administra, 700 estão ocupados para as últimas duas noites de 2018 – dias em que, sem atividade política, a capital federal costuma ficar às moscas. A procura incomum levou o setor de turismo a montar pacotes para a solenidade. Incluindo passagem aérea, traslado e hospedagem, um tour a partir de Porto Alegre foi cotado a R$ 2,5 mil logo depois do segundo turno. No início de dezembro, quem ainda queria arrematá-lo pagou mais de R$ 3,5 mil.
– É interessante porque são pessoas físicas, sem nenhum partido envolvido – observa Fabian Saraiva, diretor da operadora de viagens Uneworld, que preparou os pacotes.
No ramo há 30 anos, a proprietária da Constelar Turismo, Sarita Castro, nunca havia sido procurada para um roteiro de posse presidencial. Neste ano, vendeu 28 pacotes – otimista, chegou a calcular que comercializaria 50:
– No Réveillon, normalmente as pessoas querem ir para a praia. Passar o Ano-Novo debaixo daquele sol de Brasília? Só pelo Bolsonaro, mesmo.
Entre os clientes, está Clarissa Maciel. Frequentadora assídua dos protestos no Parcão, a empresária desembolsou R$ 4.718,36 para ela e a mãe irem à capital federal acompanhar “esse acontecimento histórico”, em suas palavras.
– Participei (da campanha) como voluntária e, às vezes, parecia tão difícil... Será uma satisfação ver que ele realmente assumiu e que tudo valeu a pena. Tirar a esquerda e eleger o Bolsonaro foi um divisor de águas – diz Clarissa.
O aposentado Altair Mayer, morador de Vista Alegre do Prata, município de 1,5 mil habitantes na serra gaúcha, adquiriu o mesmo roteiro. Longe da mulher e dos filhos, irá iniciar 2019 ao lado dos bolsonaristas que conhecerá no tour pela capital federal:
– Não vou nem dormir para estar lá na frente enrolado na minha bandeira (do Brasil). Estou realizando um sonho.
O corretor de imóveis Rafael Balam embarcará em um voo na manhã do dia 1º, enquanto parte de seus amigos irá de carro já em 30 de dezembro – um percurso de, no mínimo, 30 horas.
– A única certeza é de que iríamos. Como? De avião, van ou qualquer outra maneira – afirma Balam.
Para baratear os custos, a agência Bela Sul Empreendimentos Turísticos, de Porto Alegre, anunciou no Facebook um pacote de ônibus para a posse. Pelo custo de R$ 750, 20 clientes se interessaram. Porém, a ida ainda não está garantida — são necessários ao menos 30 passageiros para a viagem sair.
Se mantida tradição, a posse terá início com um percurso pela Esplanada dos Ministérios em um Rolls-Royce conversível – do veículo, Bolsonaro e a mulher, Michelle, poderão acenar para os apoiadores nas arquibancadas. Desde Getúlio Vargas, todos os presidentes desfilaram no automóvel, mas o futuro ministro do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno, disse que o ritual poderá ser dispensado para o uso de um carro fechado blindado por questões de segurança.
– Será um sentimento bem bolsonariano – comenta Clarissa.
Fora do roteiro tradicional, a programação previa inicialmente shows de Eduardo Costa e Zezé di Camargo e Luciano. Porém, tiveram de ser cancelados tamanha a preocupação com a segurança.