O procurador da República Deltan Dellagnol disse que, caso o Superior Tribunal Federal mude o entendimento em relação à prisão em segunda instância, o futuro será “triste” e “desanimador”.
Em entrevista ao programa Timeline, da Rádio Gaúcha, na manhã desta terça-feira (3), Deltan afirmou que as pessoas acreditam que o julgamento se aplica ao caso do ex-presidente Lula, mas, na verdade, representa a impunidade dos poderosos durante os próximos anos.
— Não tenho nada contra o ex-presidente Lula. Nada contra qualquer réu. Tenho é o dever legal do meu cargo que é investigar fatos e buscar justiça— disse.
Ainda de acordo com o procurador, caso esse precedente seja aberto, a Operação Lava-Jato passa a ser um teatro.
— Formalmente ela não termina, mas a justiça passa a ser um faz de conta em relação aos poderosos — disse.
Segundo ele, a tendência, caso o habeas corpus seja concedido, é de que os réus sejam todos soltos e acabem com os supostos crimes cometidos prescritos. Outro efeito seria o fim da delação premiada, já que não existiria mais interesse por parte dos acusados em colaborar com a justiça.
— Eu tô determinado a fazer o meu melhor, a continuar lutando até o fim, mas sozinho eu não vou conseguir. Nenhuma pessoa ou grupo de pessoas vai conseguir mudar o país sozinho. Apenas a sociedade pode fazer isso — refirmou.
Presunção de inocência
De acordo com o procurador, a presunção de inocência garante um julgamento justo e o MP precisa aprovar o caso, mas os opositores à prisão de 2ª instância usam como base em um trecho da Constituição que diz que a pessoa só é considerada culpada após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
— Esse entendimento é falho porque, se você interpretar esse texto de modo absoluto, ignorando todo o resto, ele conduz ao absurdo: se a pessoa é presumida inocente, mesmo que ela seja culpada, eu não posso nem investigá-la, nem acusá-la com base em provas.
Gilmar Mendes
Deltan disse que não pode falar sobre a motivação de cada ministro, mas destacou que em 2016, o Supremo entendeu que era possível executar prisão em 2ª instância.
– O que mudou de lá pra cá? Mudou o voto do ministro Gilmar Mendes. Muitas pessoas começam a levantar questionamentos sobre a parcialidade que não são saudáveis para a justiça. Entendemos que não existe nenhuma mudança na realidade ou no direito que justifique essa mudança de posição em tão curto tempo. Por isso, muitas pessoas acabam interpretando, e eu não posso fazer um julgamento sobre isso, que a mudança de posição seria porque a Lava-Jato começou a atingir todos os partidos que dividem o poder em Brasília — disse.
O Mecanismo
O procurador também falou sobre a série da O Mecanismo, que retrata a Lava-Jato. Ele destacou que é uma série de ficção:
— É um drama. Quem quer saber a realidade como ela é, deve pegar um livro de jornalismo.
Jejum
Ativo nas redes sociais, Deltan tuitou que estava em “jejum e oração” pelo país. O procurador disse que se baseia no Estado laico para tomar as decisões no trabalho e aplica a lei.
— Minha manifestação não foi no meu trabalho, foi na minha rede social. Procuradores, como todos os outros cidadãos, têm direito à religião e a expressar a sua fé. Não é por uma pessoa específica, é pelo meu pais — disse.