Engavetado desde 2011, o Projeto de Lei do Senado (PLS) que entrega à Polícia Federal investigações sobre crimes praticados por milícias com o envolvimento de agentes da segurança pública foi remetido no dia 6 deste mês à Câmara dos Deputados. A proposta de autoria do ex-senador e prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (PRB), ganhou força após o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e do motorista dela, Anderson Gomes, no dia 14 de março no Rio de Janeiro.
Na Câmara, a matéria está aguardando designação de relator na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado (CSPCCO), mas o PSOL já sinalizou que entrará com pedido de urgência para acelerar a tramitação. No entanto, a tendência é de que a matéria enfrente oposição de ao menos parte da chamada bancada da bala na Câmara, sob a alegação de que a Polícia Federal não tem estrutura para atuar nesses casos.
— Sou contra essa hipocrisia que se quer fazer justamente agora. A Polícia Federal não tem gente, não tem estrutura para abraçar essa demanda. A corporação está assoberbada com os crimes que são tipicamente da sua competência de apuração. É simplesmente uma cortina de fumaça, um ato circense, um mantra ideológico da esquerda e que não consegue se concretizar em algo positivo. Tenho certeza de que vamos derrubar essa estupidez aqui no plenário — disse o deputado Major Olímpio (SD-SP).
Porém, não é assim que pensa a maioria dos deputados federais gaúchos que também integram a bancada da bala. Olímpio argumenta que esses parlamentares "não ouviram o seu posicionamento e nem de tantos outros".
— Vamos mostrar em plenário o que isso tudo pode acarretar, como a demora na conclusão dos inquéritos e comprometimento de outros afazeres da Polícia Federal — complementou.
O deputado Jerônimo Goergen (PP) disse que, "em um primeiro momento", acha a Polícia Federal mais preparada para essas apurações, "até por ter isenção nas análises dos problemas nos Estados".
— A presença da Polícia Federal pelo menos junto (na investigação) é importante. Porém, não aceito nenhum projeto do PSOL querendo criminalizar, minorizar, a polícia dos Estados — sublinhou.
O projeto é do PRB, mas foi o PSOL que sinalizou intenção de pedir que a matéria seja analisada em regime de urgência. Pompeo de Mattos (PDT) acrescentou que as milícias "transcendem ao crime comum" e que, portanto, é preciso "um olhar mais consistente":
— Nesse contexto a Polícia Federal tem mais autoridade, coloca mais respeito. Está em um patamar acima.
Para o deputado federal Alceu Moreira (PMDB), as milícias têm um "grau de complexidade, persuasão e poder financeiro bastante grande". Além disso, cita não ser raro "o envolvimento nesses grupos de quem deveria fazer a segurança".
— Uma instituição como a Polícia Federal tem mecanismos para fazer uma apuração muito mais qualificada e rápida.
Luis Carlos Heinze (PP) disse que iria examinar o projeto e conversar com algumas pessoas, mas que, a princípio, não teria restrição à mudança de competência.
Onix Lorenzoni (DEM) pensa diferente dos demais gaúchos ao dizer que transferir a responsabilidade pela investigação destes crimes apenas aumentaria o volume de atribuição da Polícia Federal.
— As polícias Civil e Militar têm capacidade suficiente para resolver isso. O que precisamos é fortalecê-las. Os policiais estaduais não encontram dificuldade para investigar aqueles que se desviam.
O que diz a matéria
O PLS 548/2011 tramita na Câmara com a numeração 9709/2018 e sugere que o Departamento de Polícia Federal investigue crimes "cometidos por organizações paramilitares e milícias armadas, quando delas faça parte agente pertencente a órgão de segurança pública estadual, preservada a competência da Justiça estadual para o processamento e julgamento dos delitos".
Na argumentação, o ex-senador e prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (PRB), sustenta que, "não bastasse a sensação de impunidade, aliada ao milionário faturamento, (as milícias) acabaram por seduzir grande parcela dos integrantes das forças de segurança pública. Com efeito, em um único batalhão da polícia militar fluminense, recentemente (2011) foi constatado o envolvimento de quase metade da corporação com as milícias".
O autor do projeto questiona, então, como "se exigir que as investigações e ações policiais sejam executadas pelas autoridades locais, diante de tamanho envolvimento dos próprios soldados e servidores com as milícias?". Ele mesmo responde, dizendo não restar "alternativa, senão atribuir à Polícia Federal a incumbência de investigar os crimes cometidos por essas organizações criminosas. Somente assim a atuação desses grupos pode ser combatida de maneira eficaz".