Com um discurso inflamado, repleto de críticas ao governo Michel Temer, aos protestos dos quais foi alvo nos últimos dias e com fortes componentes eleitorais, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) concluiu a caravana pelo Rio Grande do Sul com um ato público na noite desta sexta-feira (23) em São Leopoldo, no Vale do Sinos.
Recebido aos gritos de "Lula, guerreiro do povo brasileiro" e acompanhado da ex-presidente Dilma Rousseff, Lula falou por 30 minutos, a uma multidão que ocupava um quarteirão em frente ao ginásio municipal da cidade. Ao citar os protestos violentos dos quais foi alvo em Bagé e Passo Fundo, pediu que a militância não reagisse, mas fez uma provocação.
— A gente não vai ser ignorante com eles. Não vamos ficar xingando ninguém, cercando ninguém. Eles são cabos eleitorais de um candidato — afirmou, em alusão ao deputado Jair Bolsonaro (PSL-RJ).
Em seguida, complementou:
— Se eles acham que isso me assusta, quero dizer que, se eu for candidato, eles vão me ver muitas vezes aqui no Rio Grande do Sul, porque quero ganhar as eleições aqui nesse Estado.
Na maior parte do pronunciamento, Lula repetiu o teor de seus discursos sobre a condenação a 12 anos e um mês de prisão no processo do tríplex do Guarujá. Salientando que apresentou provas de sua inocência, garantiu à multidão não vai ser preso por não ter cometido "nenhum crime".
Sem citar em nenhum momento o julgamento dos embargos de declaração, marcado para segunda-feira (26), no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em Porto Alegre, e tampouco o habeas corpus pedido ao Supremo Tribunal Federal (STF), repetiu que é alvo de uma acusação caluniosa.
— Eu não vou ser preso, porque não cometi nenhum crime. Inventaram um apartamento meu na praia do Guarujá que eles sabem que não é meu. Eu levei 73 testemunhas que disseram que o apartamento não é meu — desabafou.
Embora tenha dito que a caravana não tem caráter eleitoral, voltou a prometer a federalização do Ensino Médio, citou realizações de seus governos, como a política do salário mínimo, e programas sociais, como o Minha Casa Minha Vida.
Lula disse que sabia que o Rio Grande do Sul estava tomado por um "conservadorismo muito grande", mas que preferiu visitar cidades de menor população, onde "tem mais cavalo, vaca e boi do que gente". E voltou a provocar os ruralistas:
— Tem cavalo que é tratado a base de aveia e maçã, enquanto um filho de trabalhador passa um mês sem comer uma maçã — disse.
Lula chegou a São Leopoldo às 20h40min, após viagem em avião fretado desde Chapecó (SC). No planejamento inicial, o voo seria de Passo Fundo até Porto Alegre, com o restante do percurso feito de carro.
No entanto, o bloqueio feito por ruralistas na RS-324 impediu o ex-presidente de entrar em Passo Fundo, cancelando o ato que seria realizado no município. Lula então seguiu de ônibus de Pontão até Santa Catarina, de onde voou até a Capital.
Para alguns dirigentes petistas, Lula deveria ter evitado a passagem por Passo Fundo. Na avaliação dessas lideranças, o ex-presidente elevou demais a tensão ao chamar os ruralistas de "caloteiros" durante ato em Santa Maria.
— O presidente acabou atiçando ainda mais os fazendeiros — disse um parlamentar.
Desde o final da tarde a militância petista já se reunia em frente ao Ginásio Municipal de São Leopoldo. Artistas locais, o prefeito Ary Vanazzi (PT) e parlamentares do partido se revezaram ao microfone, quase todos classificando os adversários políticos de "fascistas".
— Estejamos atentos: nesse momento está sendo mudado o padrão da luta de classes nesse pais. Eles não mais hesitarão em usar a luta física contra nós. Eles querem o fascismo — disse o ex-governador Tarso Genro.
A 700 metros dali, os manifestantes anti-PT se concentraram às margens da BR-116, na entrada da cidade. Com bonecos infláveis do petista vestido de presidiário e faixas com os dizeres "Lula ladrão", eles protestavam contra presença do ex-presidente. O Batalhão de Choque da Brigada Militar fez um cordão de isolamento e atravessou um caminhão na pista, evitando conflito entre os grupos antagonistas.
Pouco antes, enquanto o ex-governador Olívio Dutra discursava, integrantes do Movimento Brasil Livre (MBL), se aproximaram do carro de som com um megafone, xingado e provocando os petistas. A BM interveio e ordenou aos manifestantes anti-PT que se deixassem o local.