Citando casos recentes em universidades federais e "forte reação na sociedade e na academia", o Partido dos Trabalhadores (PT) reiterou diante do Supremo Tribunal Federal (STF) o pedido de liminar para suspender o uso de condução coercitiva para realização de interrogatórios. Autor de ação sobre o tema, o PT justifica que não há previsão para julgamento, apesar do caso estar pronto para ser analisado no Plenário desde fevereiro - quando foi liberada pelo relator Gilmar Mendes - e por isso a necessidade de liminar pelo menos até o tema ser apreciado no mérito pelo plenário.
A condução coercitiva está prevista no artigo 260 do Código Penal e tem sido amplamente utilizada em operações da Polícia Federal. O partido sustenta que é ilegal o uso tanto para interrogatório quanto para obter depoimentos de suspeitos, indiciados ou acusados em qualquer investigação de natureza criminal.
A reiteração do pedido, encaminhada ao STF na última sexta-feira, 8, destaca a condução coercitiva de Jaime Arturo Ramirez e Sandra Goulart Almeida, respectivamente reitor e da vice-reitora da Universidade Federal de Minas Gerais, realizada na semana passada. Eles eram investigados em um inquérito policial. Segundo o PT, eles "não possuíam qualquer obrigação de prestar declarações nessa fase da investigação".
"A execução da medida restritiva de liberdade causou forte reação na sociedade e na academia, já impactadas pelo suicídio do Reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, o professor Luiz Carlos Cancellier, ocorrido em 02 de outubro desse ano". Em outro trecho, o partido diz que, se a medida cautelar não for concedida, se repetirão "episódios de condução coercitiva de investigados para obtenção de depoimentos".
Silêncio
Segundo o PT, a condução coercitiva fragiliza o interrogado "psicologicamente e dificulta o exercício do direito ao silêncio", apontando a garantia constitucional da vedação de autoincriminação como um argumento pelo fim deste tipo de condução. A peça também afirma que, entre outros efeitos, a medida apresenta condições de "intimidação". "Dadas as suas características, a condução coercitiva com a finalidade de obtenção de depoimento revela-se inconstitucional e ilegal, porque o interrogatório é um ato processual facultativo para a defesa e não obrigatório".
"Não é o tempo de duração da restrição de liberdade que torna essa medida inconstitucional, mas o emprego de força física, a intimidação e a coação psicológica que tornam a condução coercitiva incompatível com o ato processual de colheita do depoimento do investigado ou acusado", diz o PT.
Protocolada em abril de 2016, a ação de descumprimento de preceito fundamental já conta com posicionamentos da Procuradoria-Geral da República (PGR), da Advocacia Geral da União, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e foi liberado para julgamento pelo relator no dia 8 de fevereiro deste ano. O item chegou a ser incluído na pauta do plenário no mês de maio, mas não foi apreciado.
Esclarecimentos
Na manifestação da PGR de fevereiro deste ano, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou que não procedia a tese defendida pelo PT, "de que a mera condução coercitiva de pessoa suspeita, investigada ou acusada, no curso de investigação criminal, inquérito policial ou processo judicial, por si, afrontaria a liberdade individual e o direito à não autoincriminação".
O parecer da PGR afirma que toda pessoa que figure como investigado ou réu em procedimento de natureza penal não é obrigada a produzir prova alguma. "A prova da prática criminosa é atribuição exclusiva da acusação. Disso decorre que o réu/investigado pode ficar em silêncio, e jamais se pode exigir que elabore provas em seu detrimento".
Segundo o então procurador, a condução coercitiva no processo penal somente deverá ser declarada indevida quando realizada com o fim específico de obrigar o conduzido a falar. A PGR também declara que o STF já decidiu, em outras ocasiões, ser possível a condução de investigados à autoridade policial para prestação de esclarecimentos.