Por quase três horas, na quarta-feira (6), o procurador da República e integrante da força-tarefa da Lava-Jato Antônio Carlos Welter esteve diante do ex-ministro Antonio Palocci. Foi quando o petista revelou que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria celebrado um "pacto de sangue" de R$ 300 milhões com a Odebrecht.
No depoimento ao juiz federal Sergio Moro, o ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil admitiu ter cometido crimes e acusou, além de Lula, a ex-presidente Dilma Rousseff. Segundo Palocci, a relação dos dois governos petistas com a empreiteira foi "bastante movida" a propina.
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Leia os principais trechos da entrevista com o procurador da República Antônio Carlos Welter:
O que representa o depoimento de Palocci?
Depoimentos não são prova definitiva, são linhas que vão juntando e dando consistência às provas. No caso, há documentos, e-mails marcando reuniões, comprovantes de pagamentos, transferências bancárias, contratos com data a posteriori. O contrato de locação do apartamento vizinho ao do ex-presidente Lula nunca foi pago, só depois de descoberto. O depoimento confirma o que está na denúncia e dá mais consistência.
O papel central de Palocci nos governos Lula e Dilma dá mais peso às declarações?
Dá mais consistência ainda porque é alguém que vivenciou. Não faz narrativa de algo que ouviu. Ele presenciou, esteve com Marcelo (Odebrecht), com Emílio (Odebrecht) e Lula. Participou da reunião onde narra a desistência da compra do terreno (para o Instituto Lula). Diz que foi um péssimo negócio e visivelmente deixaria rastros, como deixou.
A defesa de Lula diz que Palocci tenta delação premiada e que o depoimento é uma tentativa desesperada de sair da cadeia. Como vocês reagem?
Logo no início do depoimento, o advogado de Lula perguntou se Palocci tinha acordo. Respondi que não, que não prometemos nada e não há garantia de que vamos pleitear redução de pena ou benefício. Mas estamos negociando. Isso foi dito e é só o que posso falar porque amanhã, por qualquer razão, pode se entender que não é o caso de fazer acordo, como em outros casos que foram negociados durante meses e o interesse público não se fez presente.
Palocci entregou provas?
Os colaboradores entregam provas depois de celebrado o acordo. Se entregam antes, ficam em situação de menos proteção.
Vocês esperavam que ele fosse tão eloquente?
A gente não tinha ideia de que Palocci falaria o que falou.
A exposição facilita o acordo?
É complicado responder. A gente não faz acordo com quem simplesmente confessa. A lei tem três requisitos: que se admita o fato praticado, que se revele crimes que não conhecemos e que se traga provas. Não adianta dizer que sabe quem matou o papa. Se não trouxer prova, não adianta.
Houve críticas, na primeira ação contra Lula, de que não existia prova sobre o triplex. Agora há provas mais efetivas?
A crítica naquela vez foi muito em função do PowerPoint. Até hoje recebemos brincadeiras, então PowerPoint nunca mais. Pela análise da peça e de provas dá para concluir que Lula foi responsável pelos crimes narrados. Nesta segunda ação, também temos. Prova, tem. Não tivemos nenhuma denúncia rejeitada ou absolvição forte, em que o núcleo essencial tenha sido rejeitado.
João Vaccari foi absolvido porque a segunda instância entendeu que a palavra dos delatores não provava os crimes.
Sim, mas todo o fato em si foi mantido. O tribunal entendeu que houve corrupção, condenou os demais, mas excluiu a responsabilidade do Vaccari.
Essa absolvição, a celeuma na delação da JBS e o contra-ataque dos investigados mudam o encaminhamento dos acordos?
A força-tarefa de Curitiba não participou da negociação com a JBS, então não faço análise crítica. Sempre temos o cuidado de trabalhar devagar. É raro ter acordo concluído em poucas semanas. É preciso olhar provas, documentos, ouvir o sujeito, negociar premiação e pena. Por vezes, se corta o acordo. Já aconteceu de negociar meses a fio e não fechar porque se viu omissão de dados.
Foi o que ocorreu com Eduardo Cunha?
Não posso nem confirmar se houve ou não negociação com ele.
Temos a informação de que em um dos processos de Palocci há 13 réus, 11 deles delatores. Há banalização das delações?
Os acordos são celebrados ao longo do tempo e cada um abre novas portas. Às vezes, dá a coincidência de vários delatores serem réus na mesma ação. Mas não se vê 10 pessoas cujos depoimentos são usados na mesma ação penal.