Um dia após o anúncio do governo de aumento no rombo das contas federais e de um pacote de medidas para contar os gastos com o funcionalismo e incrementar a receita, o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, disse que as finanças públicas se encaminham para um cenário de melhora.
Em entrevista às jornalistas Carolina Bahia, Kelly Matos e Rosane de Oliveira no programa Gaúcha Atualidade, com produção de Elisandra Borba, o ministro defendeu a aprovação das medidas propostas pelo Planalto no Congresso e reafirmou a necessidade de apoio à reforma da Previdência para reequilibrar o país.
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A conta do governo já estava no negativo. Agora, esse negativo será ampliado. Quais são as consequências para a economia brasileira?
Tomamos como princípio de que o resultado deste ano e do próximo não seriam menores do que o que já obtivemos no ano passado, que foi exatamente esse déficit de R$ 159 bilhões. A partir do próximo ano, então, começariam a haver melhoras continuadas até voltarmos a ter superávit nas contas públicas.
Então, o governo não acredita que o rebaixamento pode ser uma consequência.
Não. Como estamos adotando um princípio de que as coisas estão se encaminhando e irão melhorar, há uma segurança para os analistas e para os investidores. Para que isso se confirme, é fundamental o avanço das reformas estruturais que estamos propondo e tramitam no Congresso, juntamente com a reforma da Previdência.
Os cálculos indicam que o governo não possui os 308 votos suficientes para a aprovação da reforma da Previdência. Sem essa medida, como fica o rombo para 2018?
A Previdência é o maior gasto do governo federal, respondendo por 57% das despesas. Em valores, representa, para esse ano, R$ 730 bilhões. Não há como controlar o gasto público e reduzir o déficit sem enfrentar o problema da Previdência. Para se ter uma ideia, em 2010, o regime geral da Previdência custou aproximadamente R$ 200 bilhões. Nesse ano, apenas o regime geral custará R$ 430 bilhões – mais do que dobrou em um período de sete anos. Não é só o fato de que há um déficit enorme e que é a maior despesa que temos, mas que esse déficit e essa despesa estão crescendo rapidamente. Isso ocorre por diversos motivos. As pessoas estão vivendo mais, estão ganhando mais e estão mais formalizadas, o que é muito bom. Tudo isso aumenta o número de beneficiários do sistema previdenciário brasileiro. Precisa haver uma correspondência do outro lado para reequilibrar o tempo de contribuição e os valores recebidos. O sistema é insustentável. Temos dito isso há mais de um ano e propusemos, ainda no ano passado, uma reforma consistente no sistema previdenciário, para mantê-lo funcionando e proteger as pessoas que estão recebendo.
Mas, politicamente, não há votos.
A questão política é conjuntural. Hoje, não há votos. Mas não vamos votar hoje. Vamos votar quando tivermos feito a coesão da base e o governo estiver preparado. Essa mobilização já começou e será feita. O ponto é que não há nenhuma outra despesa do governo federal que possa contribuir da maneira que a reforma da Previdência pode contribuir para o reequilíbrio das contas. Neste ano, apenas no regime geral, o déficit será de R$ 185 bilhões. Ontem (terça-feira, 15) falamos que o déficit total do governo é de R$ 159 milhões. Portanto, significa que todas as outras contas precisam de um superávit de pelo menos R$ 26 bilhões. Ou seja, todo o déficit é oriundo exclusivamente da Previdência. A parte do governo com déficit é a Previdência. A outra parte, todas as outras despesas e receitas do governo, estão equilibradas. O problema é que a Previdência representa 57% das despesas e está crescendo em velocidade vertiginosa. Somente nesse ano, a despesa aumentou em R$ 50 bilhões. Não há conta que feche.
No pacote anunciado, há medidas que atingem diretamente o servidor público. Algumas entidades já ameaçam greve. O ministério teme uma paralisação neste momento?
Estamos avaliando todas essas circunstâncias e decidimos o mais adequado para o momento. É evidente que há repercussões, com servidores se manifestando e procurando o diálogo com o governo, mas também é preciso compreender o grande esforço de toda a sociedade brasileira, inclusive com o recente aumento de tributos. O servidor precisa contribuir nesse processo. O caminho escolhido foi esse e estamos sempre abertos à discussão.
Quais medidas atingem o funcionalismo e por que são necessárias?
O adiamento do reajuste que estava prometido em 12 meses. Não significa que estamos cancelando, apenas reprogramando. Também vamos fazer o cancelamento, que se aplica apenas a autoridades, do reajuste dos valores de funções comissionadas, os chamados cargos de confiança. Reduzimos também alguns benefícios, como o auxílio-moradia e a ajuda para mudança de localidade de residência, que podia ser correspondente a até três salários do servidor e estamos reduzindo para um. Ainda estamos retomando a tramitação do projeto que estabelece o teto remuneratório para todas as categorias, poderes e entes federados, evitando aquilo que se chama de "penduricalhos".
Estaria incluído o auxílio-moradia pago a magistrados, membros do Ministério Público e dos Tribunais de Contas?
Entrariam todos esses benefícios, desde que não fossem a título de indenização. No caso do auxílio-moradia, pode ser pago desde que seja comprovado o pagamento do aluguel, nos limites estabelecidos pela lei, ou que se justifique o recebimento do auxílio por mudança de localidade de exercício ou por possuir imóvel naquela localidade. Há uma série de restrições a esse tipo de auxílio. Também incluímos a extinção de mais de 60 mil cargos, que hoje não estão ocupados, mas que poderiam vir a ser ocupados. Estamos extinguindo para evitar que exista o aumento de despesa no futuro.
O que causa impacto zero nas contas públicas.
Sim. Apenas evita que se criem despesas lá adiante.
Nos milhares cargos de confiança, não há como fazer um corte?
Recentemente, cortamos 4,1 mil cargos. Então, já houve uma consolidação muito forte na administração pública. Também transformamos 10 mil cargos, de livre nomeação, em cargos exclusivos para servidores. São medidas que temos tomado justamente para melhorar a gestão do governo e reduzir as despesas. Estamos propondo uma reestruturação completa nas carreiras do governo que, nos próximos 10 anos, representará uma economia na ordem de R$ 70 bilhões. Hoje, o salário inicial do servidor é muito alto, em torno de R$ 15 mil nas carreiras de nível superior, além do mais, o período para se chegar ao teto, de R$ 25 mil, é muito curto. Estamos aumentando esse tempo para 30 anos, do início ao fim da carreira, e reduzindo o salário inicial para R$ 5 mil. Ao longo de toda carreira, o servidor custará menos do que custa atualmente.
Em quais carreiras? Porque, em carreiras de Estado, existe a isonomia.
Estamos mantendo a isonomia. Todas as carreiras começarão com o mesmo valor. Quem já está na carreira, continua com a sua remuneração. São os novos que entrarão em níveis mais baixos.
Precisa passar pelo Congresso?
Sim. Todas as medidas precisam passar pelo Congresso. Por isso, é preciso mobilização e apoio para que o Congresso aprove. São medidas que apontam para a redução de despesas a médio e longo prazo. Não estamos reduzindo o salário de quem já está, até porque a Constituição proíbe a redução salarial. Estamos falando de novos concursos, pessoas que entrarão no governo. Fizemos uma pesquisa sobre os salários médios dos profissionais que normalmente ocupam esses cargos e, hoje, no mercado, é em torno de R$ 4 mil a R$ 5 mil, em início de carreira. É uma remuneração compatível com o mercado. O que é incompatível com o mercado é a remuneração que temos hoje.
Haverá uma revisão geral das carreiras ou simplesmente um projeto dizendo que o salário de entrada é esse?
Todas as tabelas remuneratórias de todas as carreiras serão alteradas. Insisto que nenhuma pessoa que hoje está no governo terá redução salarial. Estamos falando de novos servidores públicos que serão contratados a partir da aprovação dessas medidas.
Também vale para professor universitário?
Sim. Estamos alterando todas as carreiras.
Também se estende para o Legislativo?
Pela independência dos Poderes, o governo federal não pode propor alterações administrativas que afetam o Legislativo ou o Judiciário. Caberia a cada poder, a partir desse exemplo, avaliar a conveniência de adotar algo semelhante.
Essas propostas estão prontas para serem enviadas ao Congresso?
Sim. Devem ser encaminhadas muito em breve.
Haveria risco de se criar um passivo no futuro, uma vez que pessoas exercendo as mesmas funções ganhariam menos e poderiam pedir isonomia na Justiça? E qual o sentido de propor essa mudança em carreiras importantes para a fiscalização, abrindo uma porta a mais para a corrupção?
Primeiro, não posso acreditar que a participação de servidores em atos ilícitos tenha a ver com a remuneração. Na verdade, temos a experiência de que essa correlação inexiste, vendo servidores que ganham salários bastante elevados envolvidos em casos de corrupção. Sobre a possibilidade de haver uma contestação a título de isonomia, não se aplica, porque estaremos tratando de pessoas que entraram no governo em momentos distintos, com base em uma legislação diferente.
Enquanto isso, a Câmara discute a criação de um fundo público para financiamento de campanha no valor de R$ 3,6 bilhões.
Ainda não se sabe se será aprovada, mas é evidente que é preciso ter bastante atenção com a fonte desses recursos. É preciso que isso fique mais claro para termos uma avaliação dos impactos e da viabilidade dessa proposta.
Existe a possibilidade de aumentar impostos para cobrir o rombo?
No momento, essa possibilidade está afastada. Buscamos compor as receitas do orçamento para 2017 e 2018 com a venda de concessões, patrimônio e participações do governo no setor privado para não haver a necessidade de aumento de impostos. Há alguns ajustes, em termos de operacionalização de alguns tributos e redução de incentivos, mas isso não implica aumento de impostos. Apresentamos também a contribuição dos servidores, que foi aumentada, para quem ganha mais de 5 mil, para 14%.
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