Um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa, o advogado e ex-juiz estadual Márlon Reis disse que é "injustificável" e chamou de "cavalo de troia" a proposta do deputado Vicente Cândido (PT-SP) de incluir, em seu relatório na comissão que discute a reforma política na Câmara, a proibição de prisão de candidatos pré-habilitados para disputar as eleições até oito meses antes da votação.
Ele até defende a medida de antecipar a habilitação dos candidatos, afirmando que é uma maneira de evitar que a discussão sobre quais têm condições de elegibilidade aconteça apenas após o registro da candidatura.
– O problema é dizer que um candidato, a partir daí, não pode mais ser preso – afirma. – Na verdade, é um cavalo de troia, porque vem com uma capa de algo que já vinha sendo reivindicado pelo movimento contra a corrupção eleitoral, a antecipação da habilitação, mas isso vem junto com uma outra medida extremamente negativa e injustificável.
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Márlon Reis acredita que, pela proposta, "fica parecendo que a medida é voltada a realmente proteger o candidato em particular que é o Lula, o que não está certo".
– Não é só do Lula que estamos falando. Estamos falando de todos os candidatos do Brasil. Entre eles, já foram descobertos candidatos financiados pelo PCC, a grande quantidade de candidatos envolvidos com o crime organizado, homicídios, narcotráfico... todo mundo vai por esta brecha – argumenta.
O advogado Reis afirma que a legislação eleitoral passou a incluir, há décadas, a proibição da prisão a 15 dias das eleições como uma forma de proteger a sociedade.
– Isso nasce da situação real que existia na época do coronelismo. Como os coronéis tinham uma ascendência completa sobre todos os Poderes e, inclusive, sobre a polícia local, eles conseguiam a prisão de opositores, fazer isso como maneira de intimidá-los e retirá-los do cenário. (A medida) surgiu, portanto, como garantia não para os candidatos, mas para a sociedade, para as pessoas terem o direito de votar nos candidatos que elas quisessem – diz.
O cenário não pode ser comparado com o atual, segundo o advogado.
– Hoje existe o devido processo legal, as pessoas que forem injustamente acusadas têm o direito de recorrer, são múltiplas instâncias – aponta. – Eu entendo até que pudesse ser questionada a sobrevivência do prazo que existe hoje na lei, mas a expansão jamais. Não há a menor necessidade de expansão do prazo de salvo conduto previsto na legislação.
Ele também afirma que, se a ideia é impedir apenas o abuso de autoridade, "teria que deixar claro que é plenamente possível o início da execução da pena, após condenação em segunda instância. Deixar claro que isso não será impedido ser feito".
Outro ponto em que a proposta falharia, segundo o advogado, é que a blindagem representaria uma ofensa ao princípio da igualdade.
– É possível afastar o princípio da igualdade em determinadas hipóteses, entretanto para afastar é preciso haver alguma justificativa absolutamente plausível, e nesse caso não há. Por isso, entendo que a proposta, evidentemente, é de inconstitucionalidade chapada – afirmou, opinando que o Judiciário dificilmente a validaria.
Além de ver como benéfica a antecipação do registro, Márlon Reis disse que há outros pontos positivos na proposta do relator, com algumas ressalvas.
– Acho que isso (a "Emenda Lula") não compromete o relatório como todo. Mas é algo que tem de ser extirpado do relatório – afirma. – Num país que tem graves problemas de segurança púbica, esta medida alcançaria toda a criminalidade geral, inclusive a criminalidade violenta, que poderá usar essa janela para a impunidade. Não é só a corrupção que vai ser favorecida – finalizou.