Novo ministro da Justiça, Torquato Jardim diz ter recebido uma missão especial de Michel Temer: cuidar da segurança pública. No caso do jurista de 67 anos é uma resposta à versão espalhada por aliados do governo, que justificam sua saída da pasta da Transparência e assunção à Justiça como reforço na defesa do presidente no julgamento da chapa Dilma-Temer. Ex-ministro do TSE, ele nega interferência na Corte. Torquato pretende conversar em breve com o diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello, tendo a Lava-Jato na pauta. Confira os principais trechos da entrevista a ZH.
Qual a sua posição sobre a Lava-Jato?
É um ganho civilizatório. Agora, como já disse o juiz Sergio Moro, o Judiciário não faz isso sozinho. As instituições públicas e privadas têm de trabalhar. Todos nós conhecemos servidores que tiram férias e trazem atestado médico. Fazem compras em Miami com atestado. Isso também precisa mudar.
Há pressão para manter o diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello, e preservar as investigações?
Não sou pressionado a nada. Nós não dependemos de pessoas, somos um país com instituições. Quero conhecer melhor a Polícia Federal.
O presidente Michel Temer fez alguma recomendação sobre a Polícia Federal?
Não, ele me deixou absolutamente à vontade.
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Como lidar com a pressão de políticos para segurar as investigações?
Cito Paulo Brossard, com quem trabalhei: "basta-me a lei". Quando perguntavam se uma investigação era rigorosa, ele dizia isso. Se estiver na lei, posso considerar qualquer pedido. Se não estiver, esquece. Como dizem os soldados, not on my watch. Não no meu turno!
Qual a missão que o presidente lhe passou ao assumir o Ministério da Justiça?
A prioridade é a segurança pública. Sistema prisional, proteção de fronteiras, combate ao tráfico de drogas. Não apenas a repressão pela repressão, que não leva ao fim do crime.
Na primeira coletiva após a posse, o senhor disse que sua experiência na segurança era ter sido assaltado.
Fiz uma blague que talvez não devesse ter feito. Tendo ao otimismo, embora um jornal tenha dito que sou ríspido. Todo mundo sabe que nunca vivenciei a segurança pública. Tenho de fazer meu dever de casa.
O senhor tem a missão de auxiliar o presidente nos tribunais superiores?
Tribunais é com o doutor Mariz (Antonio Mariz, advogado de Temer). Posso ser conselheiro do presidente? Espero sê-lo, mas não direto no tribunal. Isso não é o papel do ministro da Justiça.
O senhor foi ministro do TSE. Isso pode ajudar o governo no julgamento que pode cassar a chapa Dilma-Temer?
Posso fazer uma análise, descrever cenários e sugerir coisas, mas isso não é atuar diretamente no tribunal.
Procurar os ministros está fora de cogitação?
Em hipótese alguma. Achar que um tribunal com a história do TSE vai se assustar com o ministro da Justiça é não conhecer o tribunal.
O senhor acredita em pedido de vista no julgamento?
O ministro Gilmar Mendes disse que é natural. Toma tempo um processo de 7 mil páginas. Vota o Herman Benjamin, depois o Napoleão Nunes, depois os dois advogados (ministros Admar Gonzaga e Tarcísio Vieira). Se ficar um a um, é natural que um dos dois peça vista.
Se algum dos ministros do TSE pedir vista, não pode dar indicativo à sociedade de proteção a Temer?
Essa interpretação não tem base de lógica jurídica. Pura especulação.
Qual a sua opinião sobre a separação das chapas?
Não posso comentar caso concreto, não sou advogado da causa, estou proibido de advogar.
O senhor fala que a crise é econômica, mas quando o presidente da República e os presidentes da Câmara e do Senado são alvos de inquéritos, a crise fica política?
Se a questão econômica for acertada, a política perde a relevância. Barriga cheia, o resto se resolve. Vem reforma da Previdência e trabalhista, a dívida dos Estados e municípios. A inflação caiu, a dívida familiar está caindo. Isso significa menos demanda de crédito, juro menor. Se resolver, tira a pressão da política.
Mesmo depois de tudo o que veio à tona nas delações?
Estou preocupado com a presunção de culpabilidade. O gancho civilizatório é presunção de inocência. Fico preocupado com vazamentos selecionados que incriminam e condenam sem você saber de onde veio o documento e quem soltou a história. Investigação não é sentença, não é condenação.
O senhor orientou o presidente a mudar os hábitos depois de receber o empresário Joesley Batista fora da agenda?
Não, nós não conversamos sobre esse episódio.
Qual a análise da gravação da conversa do presidente com Joesley?
Não comento até que haja laudo técnico.
O senhor mantém as críticas à duração das prisões na Operação Lava-Jato?
Se as prisões temporárias são tão importantes para investigação, é preciso que elas sejam muito bem fundamentadas. Quero ver prova concreta, segura do ponto de vista legal.
Como tirar o Plano Nacional de Segurança do papel em um cenário de contingenciamento?
É a pergunta de um milhão de dólares. Vou tentar recuperar o orçamento.
Qual o papel da Força Nacional? Compensar a falta de efetivos das polícias militares em Estados com crise de segurança ou atuar em ações pontuais?
Isso tem de ser cuidadosamente repensado. A Força não é forma de substituição permanente à força local.
Qual a sua posição a respeito do uso das Forças Armados em manifestações?
Está previsto em lei. Agora, nós temos de repensar todo o sistema de segurança em Brasília para não acontecer de novo.
O presidente Michel Temer chega a 2018?
Claro que chega. Já tivemos crises piores. A morte de Getúlio Vargas foi muito mais séria, o golpe do parlamentarismo de 1961 foi mais sério, a deposição de João Goulart em 1964 foi mais séria. Tivemos dois presidentes com impeachment e a Constituição está aí.