No cipoal de suspeitas que envolvem o presidente Michel Temer, a mais intrigante é sua relação com o deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR). Deputado em segundo mandato e integrante do baixo clero da Câmara, Rocha Loures foi filmado pela Polícia Federal recebendo uma mala com R$ 500 mil em cédulas de R$ 50. Ele pegou a propina após ser designado por Temer para atender a pendências das empresas de Joesley Batista no governo.
– É da minha mais estrita confiança – assegurou o presidente.
A mala estava chipada e o número de série das notas foi previamente registrado pelos agentes. A pergunta que pode selar o destino de Temer é: onde foi parar esse dinheiro?
Como toda a ação foi controlada pelos investigadores, a PF tem essa resposta. Em operação semelhante, a PF rastreou todo o caminho percorrido pela propina prometida ao senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG). Após acertar com Joesley o recebimento de R$ 2 milhões, Aécio indicou seu primo Frederico Pacheco de Medeiros, o Fred, para pegar o dinheiro. Os agentes filmaram Fred recebendo dois pagamentos de R$ 500 mil cada.
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A vigilância mantida sobre Fred e o acompanhamento das cédulas permitiu à PF descobrir que os recursos foram depositados em uma empresa do senador Zeze Perrella (PMDB-MG), aliado de Aécio. O destino do dinheiro entregue a Rocha Loures, contudo, segue sob sigilo.
Ao receber em um café de São Paulo a oferta de uma propina semanal de R$ 500 mil durante 20 anos, Rocha Loures disse a Ricardo Saud, diretor do grupo JBS e emissário de Joesley, que precisaria submeter a proposta a um superior. Saud então faz duas referências ao "presidente", em uma alusão a Temer. Dias depois, após pegar o dinheiro, ele foi para a casa dos pais, na região dos Jardins, em São Paulo. Até agora, esse é o único paradeiro conhecido dos R$ 500 mil.
Empresário e milionário, Rocha Loures caiu nas graças de Temer após concluir seu primeiro mandato de deputado, em 2011. No ano anterior, ele havia concorrido a vice-governador do Paraná, mas foi derrotado na chapa encabeçada por Osmar Dias. Sem mandato, foi nomeado chefe da Assessoria Parlamentar da Vice-Presidência da República. Mais tarde, seria transferido para gabinete da Secretaria de Relações Institucionais. Aos 44 anos, era um menino de recados. Recebia políticos e anotava pedidos, atuando como interlocutor do então vice-presidente para demandas do varejo político-partidário.
Com o impeachment de Dilma Rousseff e a assunção de Temer à Presidência, Rocha Loures ficou ainda mais próximo do peemedebista. Como assessor especial do Gabinete Pessoal da Presidência, despachava com Temer diariamente. Nas eleições de 2014, quando obteve 58.493 votos e ficou na suplência do PMDB para deputado, ele recebeu uma doação de Temer para sua campanha no valor de R$ 200.650,30.
Na ocasião, Temer também gravou um vídeo elogiando o subalterno: "ele veio aqui para o meu gabinete e me ajudou enormemente. O Rodrigo fez um belíssimo trabalho". A intimidade com Temer e a influência de Loures no Planalto ficou evidente quando, ao conversar com Joesley sobre os interesses do grupo JBS, ele oferece ao empresário a oportunidade de indicar pessoas para ocupar posições-chave em órgãos de fiscalização como Receita Federal, Banco Central, Procuradoria da Fazenda Nacional, Conselho Administrativo de Defesa Econômica e Comissão de Valores Mobiliários.
Dono de um patrimônio milionário, Rocha Loures é administrador de empresas formado pela Fundação Getúlio Vargas. Tem o mesmo nome do pai, Rodrigo Rocha Loures, fundador da indústria do ramo alimentício Nutrimental. Foi trabalhando como executivo na empresa do pai que Rocha Loures desenvolveu a barra de cereais Nutry, líder de vendas no setor.
Rocha Loures voltou à Câmara em 8 de março, um dia após a fatídica conversa entre Joesley e Temer no Palácio do Jaburu – e afastado do cargo nesta quinta-feira (18) pelo ministro Edson Fachin. Ele ocupou a vaga deixada por Osmar Serraglio (PMDB-PR), nomeado ministro da Justiça. Desde então, vinha tendo um desempenho opaco, até se tornar peça-chave no inquérito que investiga Temer no Supremo Tribunal Federal.
Auxiliares do presidente têm dito reservadamente que Rocha Loures terá de assumir sozinho a responsabilidade pelos R$ 500 mil recebidos de Joesley, isentando Temer de qualquer participação no episódio – álibi que pode ser derrubado quando a PF revelar o destino do dinheiro. Ao chegar de Nova York, na manhã desta sexta-feira, foi hostilizado no aeroporto de Guarulhos, aos gritos de "ladrão" e "bandido".