Em 24 de abril, Ricardo Saud, diretor de relações institucionais da multinacional beneficiadora de carnes JBS – transformado em delator de crimes - gravou diálogo que teve com Rodrigo Loures, deputado federal afastado e assessor especial do presidente Michel Temer (PMDB). A gravação foi oculta e informada à Polícia Federal. A ideia era mostrar como o governo federal ajudava a JBS e como eram feitas transações ao arrepio da lei. Num dos trechos é discutido como manter o ministro Eliseu Padilha com foro especial.
O encontro de Saud e Loures aconteceu na cafeteria Santo Grão, em São Paulo. Eles trataram de problemas que a JBS vinha encontrando nos órgãos de fiscalização governamentais e como poderiam ser driblados. No meio do diálogo, porém, a dupla fala sobre como ministros hoje na mira da Operação Lava-Jato poderiam se proteger contra a perda do foro privilegiado (que permite que sejam julgados apenas no Supremo Tribunal Federal). O caso específico em discussão é o de Eliseu Padilha, ministro da Casa Civil e um dos homens mais próximos ao presidente Temer.
– Afasta ele se denunciado, mas põe um interino. Afastado, mas não perde o foro – explica Loures.
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Com isso, Padilha poderia ir até o fim do governo sem ser julgado pelo temido juiz Sérgio Moro, de Curitiba, responsável pela maior parte dos casos da Lava-Jato e conhecido por ser rápido e implacável em suas sentenças. Zero Hora conversou com um procurador da República e ele admite que o foro pode ser mantido, se o ministro apenas "se afasta", sem pedir demissão.
Padilha responde a dois inquéritos na Lava-Jato, um por coletar doações em caixa 2 para o PMDB e outro por suposta propina cobrada por obra do Trensurb no Rio Grande do Sul.
Confira o diálogo entre Loures e Saud:
Rodrigo Loures: Eu acho, na minha opinião pessoal, que a situação do ministro Padilha é muito difícil.
Ricardo Saud: Muito.
Loures: A gente tem que aguardar aquele tempo que eu te falei. Demora para o Ministério Público Federal apresentar denúncia. Porque o que o Presidente falou: "aquele que for denunciado em investigação do MPF será afastado do Governo".
Saud: Foi ótimo, né...
Loures: Se esta denúncia vier a se aceita pelo Supremo Tribunal Federal, tá demitido.
Saud: Mas daí tem o prazo que você falou, então não vai ser nunca.
Loures: Eu acho que o que que vai acontecer...vai afastar o Padilha e outros, eventualmente outros, quando oferecerem a denúncia. Vamos imaginar que daqui a três meses.
Saud: Mas já deu tempo de fazer a investigação?
Loures: Acho que eles têm tudo pronto. Aí o Temer vai ter que afastar. Afasta, mantém o foro e ai vai ficar lá, Ricardo, um ano, dois, sob investigação.
Saud: Aí fica sem cargo.
Loures: Ele sai e fica e põe lá um interino. Põe lá um interino.
Saud: Ah, e o cara não perde o foro!
Loures: Aí o Padilha não perde o foro.
Saud: Põe e ainda ajuda os caras.
Loures: Claro.
Saud: Isso é companheirismo.
Loures: Então ele vai proteger. .. e enquanto essa investigação durar, qual é o limite do Padilha? É o dia trinta e um de dezembro de 2018, quando o presidente Temer deixar o Governo.
Saud: Aí perde o foro.
O que diz o ministro Eliseu Padilha:
A assessoria do ministro informa que ele não vai comentar sobre eventual permanência ou saída do ministério.
Aos procuradores, o executivo contou que escritórios emitiram contratos e notas falsos para viabilizar o pagamento de propina a políticos. Saud detalhou os pagamentos e juntou documentos para comprovar a acusação.