Pelo menos cinco políticos gaúchos são citados pela JBS por supostamente terem recebido vantagem indevida da empresa. Os deputados Alceu Moreira (PMDB), Onyx Lorenzoni (DEM) e Jerônimo Goergen (PP), o ex-deputado e ex-tesoureiro do PT Paulo Ferreira e o ex-deputado Beto Albuquerque (PSB) são citados por Joesley Batista e Ricardo Saud.
Moreira, Onyx e Goergen teriam recebido o dinheiro no Rio Grande do Sul, entregue pelo presidente da Associação Brasileira de Exportadores de Carne Bovina, Antônio Jorge Camardelli. A JBS relata um pagamento de R$ 200 mil em espécie a Moreira no dia 27 de agosto de 2014. O mesmo valor, também em dinheiro vivo, teria sido entregue a Onyx em 12 de setembro de 2014. No mesmo dia, Goergen aparece como supostamente tendo recebido R$ 100 mil.
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Outros R$ 200 mil teriam sido destinados a Ferreira em 2 de outubro de 2014, por meio de pagamento de nota avulsa emitida pela Gráfica e Editora Comunicação Impressa. Os delatores citam inclusive o número da nota fiscal, 6.883.
Goergen é o único a ter declarado doações oficiais da JBS na eleição de 2014. No total, ele informou à Justiça Eleitoral cinco repasses da JBS, via direção nacional do partido, no valor de R$ 850 mil. Nenhuma dessas doações, contudo, tem data de registro em setembro. Duas teriam sido feitas em julho e as outras três em outubro.
Conforme o delator, a doação foi declarada à Justiça Eleitoral, mas se origina de um "crédito de propina" pago pela empresa para que a campanha presidencial de Aécio Neves "comprasse" o apoio de partidos.
Segundo os delatores, os pagamentos teriam sido feitos para financiar, via caixa 2 e doação oficial, as campanhas eleitorais. Em geral, os pedidos chegavam a Saud, que submetia a doação a Joesley, a quem cabia autorizar os repasses. Os pagamentos serviriam para que os políticos ajudassem a empresa e não criassem antipatia aos interesses do grupo.
– Se o senhor me permitir, gostaria de chamar de reservatório da boa vontade –explica Saud aos procuradores.
Abaixo, veja o vídeo em que Ricardo Saud detalha os pagamentos aos políticos. Os gaúchos são citados a partir do minuto 11:
Paulo Ferreira e Alceu Moreira aparecem ainda numa planilha da JBS batizada de "Repasse não contabilizado a partidos políticos". Há 14 políticos nesta lista. Entre eles, além dos gaúchos, aparecem o ministro das Cidades, Bruno Araújo (PSDB-PE), o governador do Paraná, Beto Richa (PSDB), o senador Fernando Bezerra Coelho (PSB-PE) e os ex-ministros Geddel Vieira Lima (PMDB-BA ) e Brizola Neto (PDT-RJ). Na planilha, não há menção aos valores repassados a cada político nem às datas em que os pagamentos teriam sido efetuados.
No depoimento à Procuradoria-Geral da República, o executivo da JBS Ricardo Saud relata que o modelo de pagamento era definido por cada político, podendo ser em doação oficial de campanha ou em caixa 2, por notas fiscais avulsas ou em dinheiro vivo.
Paulo Ferreira é citado outra vez no depoimento do dono da JBS, Joesley Batista. O empresário cita um repasse de R$ 30 milhões ao ex-ministro Antonio Palocci a pretexto de financiamento da campanha de Dilma Rousseff à Presidência em 2010. Não há detalhamento da participação de Ferreira nesse pagamento. À época, ele havia deixado o cargo de tesoureiro do PT e estava em campanha para deputado federal, eleição na qual ficou como suplente.
Sobre Beto Albuquerque, Saud diz somente que integrava a lista de pagamentos da empresa.
– Vou fazer aqui para você agora partidos que nós demos dinheiro, para quem foi, por que foi, e vamos chegar a esses que estou te falando, vamos chegar até no vice da Marina Silva, que aí o Beto Albuquerque foi ser o vice da Marina e foi interino presidente do PSB – diz ele.
Confira abaixo, a transcrição de trechos do vídeo no qual o executivo detalha como foram feitos os pagamentos aos gaúchos:
Deputado federal Alceu Moreira, do PMDB-RS: R$ 200 mil em espécie, entregues no Rio Grande do Sul pelo nosso companheiro Camardelli – informa o executivo.
– Quem pediu? – questiona o procurador.
– O Alceu Moreira. Pediu pro Camardelli, que é um companheiro nosso, depois eu estive com ele, conversei com ele na Câmara, e nós demos R$ 200 mil em dinheiro vivo.
Deputado federal Onyx Lorenzoni, do DEM/RS: R$ 200 mil em espécie no dia 12/09/2014, entregues no Rio Grande do Sul pelo Camardelli também.
– Esse também pediu pro Camardelli?
– Não, pra mim. Todos esses aqui são muito amigos do Camardelli. Camardelli é o presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras, e ele é do Rio Grande do Sul. Ele já foi do Ministério da Agricultura, então é um cara do bem, muito ligado a ele e ele sempre ajudava.
– Então eles pediam pra ele e ele passou pra você o pedido?
– Mas eu tive contato com os três também, só não fiz a entrega do dinheiro.
Deputado federal Jerônimo Goergen: R$ 100 mil em 12/09/2014, entregues no Rio Grande do Sul pelo senhor Camardelli.
– Esses daqui pediram algo ou prometeram algo em troca?
– Apoiar o grupo lá, não deixar ninguém falar nada do grupo, não deixar o povo subir na tribuna e fazer um aparte... – condiciona Saud.
Deputado federal Paulo Ferreira, na época suplente, estava no cargo e perdeu a reeleição: o antigo tesoureiro do PT teria recebido R$ 200 mil em 02/10/2014. O pagamento teria sido feito por meio de nota avulsa emitida pela empresa Gráfica e Editora Comunicação Impressa, nota fiscal número 6883.
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Delator também citou repasse à campanha de Sartori
Em depoimento à Procuradoria-Geral da República, o executivo da JBS Ricardo Saud diz ter repassado R$ 1,5 milhão em propina à campanha do governador José Ivo Sartori. O pagamento, feito a pedido de Aécio Neves (PSDB-MG), que concorria à Presidência, teria ocorrido na campanha de 2014, como "doação oficial dissimulada".
O dinheiro para o comitê de Sartori chegou em 24 de outubro, durante a disputa do segundo turno, quando o peemedebista declarou apoio a Aécio no pleito nacional. No primeiro turno, Sartori havia feito campanha para Marina Silva, então no PSB.
Em nota, o coordenador financeiro da campanha de Sartori, João Carlos Bona Garcia, reconhece o recebimento do dinheiro, declarado à Justiça Eleitoral. "As doações recebidas da empresa JBS pela campanha José Ivo Sartori foram realizadas dentro da legislação vigente, sendo efetivadas através de transferência eletrônica, saindo da conta da empresa diretamente para a conta da candidatura, bem como emitidos os respectivos recibos eleitorais, conforme informações contidas na prestação de contas do candidato e constantes no site do TRE. A origem dos valores foi dada como legal pela empresa", diz o texto.
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CONTRAPONTOS
O que diz o deputado federal Jerônimo Goergen (PP):
"Em todas as campanhas que disputei, sempre recebi apoio da JBS em razão do ministro Pratini De Moraes. Trabalhei com ele no ministério (da Agricultura), e ele virou diretor da JBS. Recebi, no último pleito, R$ 400 mil. Também teve um outro depósito, de uma outra empresa do mesmo grupo, acho que é mais R$ 450 mil. Como veio esse dinheiro? Veio pelo diretório nacional. Com o Camardelli, o único contato que eu fiz foi assim: "Olha se tiver alguém que possa colaborar na campanha, avisa'. Estou surpreso porque nunca neguei que recebia apoio da empresa. Sempre foi tudo oficial, declarado na Justiça Eleitoral."
O que diz o deputado federal Alceu Moreira (PMDB):
"O deputado federal Alceu Moreira informa que não detém conhecimento integral dos fatos relatados e tem convicção da licitude de suas condutas. Esclarece que os valores recebidos por sua campanha, em 2014, foram de forma regular e declarados à Justiça Eleitoral, que aprovou a prestação de contas."
O que diz o deputado federal Onyx Lorenzoni (DEM):
Em entrevista à Rádio Gaúcha, Onyx admitiu ter recebido R$ 100 mil de caixa 2 da JBS para sua campanha em 2014. O parlamentar afirmou que sua atitude "foi um erro".
– Recebi sim. R$ 100 mil. Está nas minhas anotações. (Recebi) através do Camardelli. Quero eximi-lo de qualquer responsabilidade. Ele prestou apenas um auxílio para que aquele recurso chegasse – disse o deputado.
O que diz o ex-deputado federal Paulo Ferreira (PT):
Zero Hora ainda não conseguiu contato com o político.
O que diz Beto Albuquerque (PSB):
Em nota, a imprensa do PSB diz que todas as doações recebidas na campanha foram legais:
Em face da delação do diretor de relações Institucionais do grupo J&F, Ricardo Saud, o Partido Socialista Brasileiro esclarece que todas as doações recebidas ocorreram estritamente dentro das normais legais e foram devidamente declaradas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ressalta-se que o próprio delator informou que as doações ao PSB foram realizadas sem contrapartida, ou seja, em consonância com a legislação em vigor à época.