Se a proposta de modificar o cálculo do dinheiro repassado mensalmente pelo governo estadual aos demais poderes estivesse implementada, o Palácio Piratini teria reforçado seu caixa em R$ 1,8 bilhão desde 2011 – em valores não corrigidos. O valor representa pouco mais do total necessário para pagar a folha do funcionalismo do Executivo, que custa em torno de R$ 1,4 bilhão, em um único mês.
Item do pacote de medidas apresentado pelo governador José Ivo Sartori para enfrentar a crise financeira, a proposta de emenda à Constituição (PEC) vincula os recursos de Tribunal de Justiça, Ministério Público, Assembleia Legislativa, Tribunal de Contas, Defensoria Pública e Justiça Militar à arrecadação efetivamente realizada. Absorvido em resistências, a medida desassocia o montante repassado mensalmente para os poderes do orçamento previsto e o relaciona à receita efetivada.
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No modelo atual, o governo indica uma perspectiva de arrecadação, que não se concretiza, para equilibrar os gastos com a receita, uma vez que a peça orçamentária não pode conter déficit. Ocorre que o Estado arrecada menos do que a receita prevista, e o dinheiro repassado aos demais poderes não atende a essa proporcionalidade. Dessa forma, o Executivo tem de arcar com o aperto financeiro sozinho, alega o governo. A medida não prevê, entretanto, aumento da transferência caso a arrecadação supere o prognóstico.
– Entendemos ser justo e adequado fazermos o repasse do duodécimo na exata dimensão da receita, ainda mais em um Estado como o nosso, que, cada vez em maior volume, tem uma despesa bem maior do que a receita prevista. Estamos em uma situação de calamidade financeira e é natural que o governo reproduza a percepção popular. Se tem de haver sacrifícios, que sejam compartilhados por todos – afirma o secretário estadual da Fazenda, Giovani Feltes.
Instituição que recebe a fatia maior do duodécimo, o Tribunal de Justiça (TJ-RS) descarta o argumento de que não divide a conta da crise. O Judiciário sustenta que o percentual repassado pelo Executivo para os outros poderes corresponde a uma quantia ínfima do orçamento estadual.
– Alguns números trazidos pelo Executivo mostram como essa providência é de pouquíssima importância para a questão do Estado, mas de grande relevância para a questão interna do Judiciário. Isso é devastador dentro do Tribunal. Desarruma o que está razoável sem arrumar o que está mal – defende o presidente do Conselho de Comunicação Social do TJ-RS, desembargador Túlio Martins.
Para entrar em vigor, a PEC precisa ser aprovada em dois turnos na Assembleia Legislativa por três quintos dos deputados gaúchos – o que equivale a 33 votos. Dentro da própria Secretaria da Fazenda, há dúvidas sobre a admissão da medida, uma vez que os parlamentares votarão um corte no seu próprio orçamento. Mas o presidente em exercício da Casa, Adilson Troca (PSDB), diz que o projeto "tem de ser aceito".
– Temos de entender que o Estado está passando por uma dificuldade muito grande. Na minha opinião, não é justo que todo mundo faça sacrifício e a gente não – argumenta o deputado.
Na Assembleia, estima-se que o primeiro impacto da medida, que, somente neste ano, retiraria R$ 78 milhões da conta do Legislativo, seria no pagamento dos servidores – hoje, 92% do orçamento vai para ativos e inativos. Já no âmbito do Judiciário, caso a proposta seja aceita, não deve ocorrer qualquer nomeação para suprir o déficit superior a 2 mil servidores e juízes.
– Enquanto o Executivo não tem reajuste e ainda recebe os salários parcelados, os servidores do Judiciário tiveram reajustes, recebem em dia, e os membros ainda ganham integralmente auxílio-moradia e pagamentos retroativos do auxílio-moradia e do refeição. Eles ainda são o primo rico – observa Darcy Carvalho dos Santos, especialista em finanças públicas.