Em delação premiada, o ex-diretor internacional da Petrobras Nestor Cerveróapontou o pagamento de pelo menos R$ 564,1 milhões de propina em negócios da estatal e de uma de suas subsidiárias, a BR Distribuidora. No total, 11 políticos são citados nominalmente como beneficiários dos desvios, segundo reportagem de O Globo.
Entre os desvios, a maior quantia refere-se à aquisição pela Petrobras, em 2002, da empresa petrolífera argentina Pérez Companc. Segundo Cerveró, o negócio rendeu US$ 100 milhões em propina para integrantes do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). De acordo com a taxa de câmbio de sexta-feira passada, mas sem correção monetária, a cifra chega a R$ 354 milhões.
De acordo com o jornal carioca, a cifra deve ser maior, já que os valores não estão atualizados e não há informação de quanto foi pago em propina em parte dos negócios.
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Conforme a delação do ex-diretor da Petrobras, cinco anos mais tarde, em 2007, outro negócio relacionado à petrolífera argentina rendeu desvios. O caso teria ocorrido durante a venda da Transener – a principal linha de energia que liga o país vizinho de Norte a Sul e que era da Pérez Companc.
Em 2003, Nestor Kirchner assumiu a Presidência da Argentina e, de acordo com Cerveró, pressionou a Petrobras a vender a Transener. Fechado com um amigo de um ministro da administração Kirchner, o negócio teria rendido pelo menos US$ 300 mil (R$ 1,06 milhão) para o ex-diretor e outros US$ 300 mil para o lobista Fernando Antônio Falcão Soares, mais conhecido como Fernando Baiano. No entanto, Cerveró mencionou que a maior parte da propina permaneceu na Argentina.
Ele também declarou que a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, resultou em US$ 15 milhões (R$ 53,1 milhões) em propina para, entre outros, o ex-senador Delcídio Amaral, Fernando Baiano e o ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa. Além disso, mais R$ 4 milhões teriam sido pagos a Delcídio em razão da reforma da refinaria. Em 2014, conforme o Tribunal de Contas da União (TCU), Pasadena causou um prejuízo de US$ 792,3 milhões (R$ 2,804 bilhões) à Petrobras.
A reportagem de O Globo ainda ressalta que a compra de navios-sonda levou ao pagamento de pelo menos US$ 24 milhões (R$ 84,96 milhões) em propina. Cerveró indicou como beneficiários o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) e Delcídio, entre outros.
Além disso, segundo o ex-diretor da estatal, a compra de blocos de petróleo em Angola, na África, impulsionou propinas de R$ 40 milhões a R$ 50 milhões para a campanha presidencial do PT de 2006, quando Luiz Inácio Lula da Silva era candidato à reeleição. Cerveró teria recebido essa informação de Manoel Vicente, presidente da Sonangol, empresa estatal de petróleo angolana. As negociações do lado brasileiro teriam sido encabeçadas pelo ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci.
Em sua delação, Cerveró também relatou desvios para o senador Fernando Collor (PTC-AL) envolvendo negócios da BR Distribuidora. Conforme a reportagem de O Globo, seriam pelo menos R$ 26 milhões. O ex-diretor ainda relatou a existência de propina, mas sem detalhar informações, para a campanha de alguns petistas, como o ex-ministro e ex-governador da Bahia Jaques Wagner, em 2006.
Além de propinas, Cerveró mencionou ações como a interferência da ex-ministra Ideli Salvatti para que a BR Distribuidora renegociasse uma dívida de R$ 90 milhões que a transportadora Dalçoquio mantinha com a estatal. O ex-diretor também destaca o prejuízo de US$ 40 milhões (R$ 141,6 milhões) com a interrupção de obra da fábrica de lubrificantes em Duque de Caxias, no Rio de Janeiro. Segundo Cerveró, o ex-ministro de Minas e Energia Edison Lobão ordenou o fundo de pensão da estatal, Petros, a investir no Banco BVA, que faliria na sequência.
Contrapontos
Após a divulgação das primeiras informações da delação de Cerveró, Fernando Henrique defendeu o ex-presidente da Petrobras Francisco Gros. Por meio de nota, disse que "afirmações vagas como essa, que se referem genericamente a um período no qual eu era presidente e a um ex-presidente da Petrobras já falecido, sem especificar pessoas envolvidas, servem apenas para confundir e não trazem elementos que permitam verificação”.
O Instituto Lula, por sua vez, sempre rechaçou todas as acusações de Cerveró, assim como Jaques Wagner. Renan Calheiros e Eduardo Cunha negaram ter recebido quaisquer vantagens indevidas.
Jader Barbalho e Edison Lobão tomam a mesma posição em relação às afirmações de Cerveró. Já Fernando Collor relatou repudiar “os termos da delação que são absolutamente inverídicos”, divulgou O Globo.
Segundo o jornal, Ideli Salvatti frisou que o ex-diretor da Petrobras “mente em todas as suas declarações”. Delcídio Amaral comentou à Polícia Federal (PF) não ter recebido propinas.
A Petros diz que "nunca investiu nenhum recurso diretamente na tesouraria do BVA, portanto não reconhece qualquer prejuízo decorrente do processo de liquidação do banco". Em nota, diz que o investimento da Fundação foi em operações estruturadas pelo BVA, que foram transferidas para outros gestores após a liquidação do banco, que já recebeu parte significativa desse investimento e está na Justiça buscando o restante.