Pouco depois do anúncio do governador José Ivo Sartori de que irá vetar o reajuste salarial dos funcionários de Judiciário, Ministério Público (MP), Defensoria Pública, Tribunal de Contas do Estado (TCE) e Assembleia Legislativa, entidades e sindicatos já começaram a articulação para pressionar o parlamento gaúcho a derrubar o veto. O índice de 8,13% foi aprovado na terça-feira pela maioria dos deputados estaduais.
A recomposição salarial, cujo reajuste seria retroativo desde janeiro de 2016, geraria um impacto financeiro, somadas todas as folhas, de cerca de R$ 194,5 milhões neste ano. Pelo Twitter, o governador justificou que, "se não tem condições de dar aumento para quem ganha menos, não pode sancionar aumento para quem ganha mais".
"Respeito as categorias envolvidas, mas não posso ignorar a situação dos servidores do Executivo, especialmente professores e policiais. Entendo que a reposição pretendida é justa, mas inoportuna. Não está em sintonia com a profunda crise que vivemos", complementou Sartori pela rede social.
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Alberto Ledur, presidente do Sindicato dos Servidores do MP (Simpe), afirmou que a decisão era esperada, e, por isso, a entidade já está alinhavando estratégias para garantir a derrubada do veto. Conforme Ledur, não é aceitável negar uma reposição da inflação de 2014 aos servidores.
Para Davi Pio, secretário-geral do Sindicato dos Servidores da Justiça (Sindjus), a entidade, que também já trabalhava com a perspectiva de veto desde o início, acredita que só precisa garantir mais dois votos para que a decisão seja derrubada:
– Já temos 26 garantidos e precisamos somente de mais dois. O anúncio de Sartori foi absolutamente previsível, mas não há como argumentar contra os projetos.
A decisão do governador também não foi recebida com bons olhos pela cúpula dos poderes. Chefe do MP, o procurador-geral de Justiça, Marcelo Lemos Dornelles, reconhece a crítica situação financeira do Estado, mas também acredita na possibilidade de manter a decisão dos deputados, já que os projetos não propõem aumento, mas, sim, reposição inflacionária.
– O fato de o magistério estar com dificuldade não necessariamente vincula os demais órgãos. Cada um tem a sua autonomia, suas questões próprias e de suas carreiras. Quem decide essas questões é o Parlamento, que já foi favorável ao reajuste – justificou Dornelles.
É o que espera o defensor público-geral do Estado, Cristiano Vieira Heerdt:
– Com certeza, há uma situação de crise no Estado, mas esse reajuste está previsto no orçamento da Defensoria. Além disso, desde 2011 não houve reajuste da matriz salarial. Sensível a esses argumentos, acreditamos que a Assembleia deve derrubar o veto – explicou Heerdt.
Em nota, o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Luiz Felipe Silveira Difini, declarou que o Legislativo fez a sua parte no que se refere à reposição salarial dos servidores do Judiciário e que aguarda a conclusão do processo.
A decisão sobre o veto deve voltar às mãos dos deputados somente nos próximos meses. O líder do governo na Assembleia, Alexandre Postal (PMDB), explica que o governador tem um período de 15 dias para vetar o projeto e somente depois o assunto entra na pauta do Parlamento:
– Existe uma possibilidade real de que a decisão do governo seja derrubada, mas isso deve demorar um pouco. Provavelmente, só ocorrerá agosto.
Além das justificativas de Sartori para o veto, o chefe da Casa Civil, Márcio Biolchi, destacou que a posição do Palácio Piratini não é só uma questão de solidariedade aos servidores do Executivo, mas sim reflete a realidade que o Estado vive.
Para Biolchi, no momento de crise, é preciso tomar medidas para não agravar a situação:
– Precisamos primeiro trabalhar os nossos problemas. Por mais que os órgãos tenham suas causas, o momento não nos permite ter uma posição diferente dessa. Estamos falando em aumentar o gasto público frente a uma crise econômica, o que não é aconselhável.
A presidente da Assembleia Legislativa, Silvana Covatti, afirmou que só irá se manifestar depois de receber um comunicado oficial do governador sobre o veto. O TCE informou, por meio da assessoria de imprensa, que não irá se manifestar sobre o assunto por enquanto.
Entenda o caso
– Os projetos de lei foram protocolados em outubro de 2015 pelas direções dos poderes após o governo estadual colocar em dia os salários dos servidores do Executivo. A ideia inicial das administrações dos órgãos era de propor os reajustes em julho, mas o cenário de crise financeira conteve a iniciativa.
– A tramitação normal dos projetos de lei deste tipo costuma ser de cerca de 90 dias, no entanto, a base governista se valeu de diversas manobras para atrasar a apreciação das propostas. Na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), foram feitos consecutivos pedidos de vista por parte de deputados do PMDB entre outubro e março.
– Apenas no dia 15 de março o pacote de reajustes foi aprovado pela CCJ. Em seguida, os projetos foram distribuídos para a Comissão de Segurança e Serviços Públicos, onde receberam parecer favorável na metade de abril, passando, assim, para a pauta de votações do plenário.
– Após três reuniões entre os líderes partidários, quando é definida a pauta de votações de cada sessão, sem que houvesse acordo para incluir os projetos na ordem do dia, o pacote finalmente foi listado para análise na última terça-feira. O tempo total de tramitação foi de mais de sete meses.
– Com os R$ 194,5 milhões que serão gastos com o reajuste em 2016, seria possível pavimentar cerca de 130 quilômetros de rodovias ou garantir um ano e sete meses de transporte escolar no Estado. Na prática, o montante supera, por exemplo, o valor gasto pelo governo estadual, em abril, com hospitais e medicamentos (R$ 132 milhões).
Os servidores em números
Defensoria Pública: 495 servidores
Tribunal de Justiça: 8.433 servidores ativos e 3.773 inativos
Ministério Público: 2200 entre ativos e aposentados
Assembléia Legislativa: 2.148, entre ativos e inativos
Tribunal de Contas: Cerca 890 ativos*
*O órgão não informou o número de inativos.