O ministro José Eduardo Cardozo, da Advocacia-Geral da União (AGU), afirmou nesta segunda-feira que lhe parece "insustentável" que o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff tenha continuidade no Senado após a anulação da votação do processo na Câmara pelo presidente interino da casa, Waldir Maranhão (PP-MA).
– Me parece insustentável a tese de que o Senado possa prosseguir sem que se reveja a decisão da Câmara", disse o ministro durante entrevista coletiva antes da decisão do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), de não acatar a decisão de Waldir Maranhão e garantir a continuidade ao processo de impeachment.
Leia mais:
Renan ignora decisão da Câmara e dá prosseguimento a impeachment
Planalto vai recorrer ao STF da decisão de Renan, diz vice-líder do governo
Câmara não tem mais o poder de anular o processo de impeachment, diz Aécio
Cardozo argumentou que seria inconstitucional que o Senado prosseguisse com o processo, porque a autorização da Câmara dos Deputados é uma condição indispensável no caso de impeachment.
– O Senado não pode processar e julgar o processo de impedimento sem a autorização da Câmara. Se essa condição foi anulada, falta o requisito processual para o prosseguimento, acrescentou.
Caso isso ocorra, o ministro Cardozo disse que a primeira atitude da AGU será o encaminhamento de uma petição ao presidente do Senado, Renan Calheiros. O ministro chefe da AGU não adiantou quais seriam os próximos passos caso a petição seja indeferida.
Encontro
José Eduardo Cardozo admitiu que conversou com Waldir Maranhão nesse fim de semana – na sexta-feira e no domingo – para apresentar os argumentos jurídicos da defesa e cobrar uma decisão do parlamentar ao recurso apresentado ao então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), no dia 25 de abril. Flávio Dino, governador do Maranhão, também participou dos encontros.
Cardozo informou que estava no "exercício pleno da advocacia" e que fez o que qualquer advogado faria. Ele destacou que os três conversaram sobre o recurso apresentado na Câmara logo depois da decisão da admissibilidade do processo, a fim de questionar cinco vícios que ocorreram na sessão de 17 de abril.
No pedido, a AGU alegou que houve irregularidades nas sessões e que o regimento interno da Câmara teria sido desrespeitado. Segundo a AGU, não foram cumpridos os princípios do contraditório e da ampla defesa, violando o rito processual estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
– O primeiro vício diz respeito ao fato de a lei que disciplina o processo de impeachment proibir expressamente, no artigo 23, o encaminhamento da votação. Nós vimos no processo da Câmara vários parlamentares, antes mesmo que a defesa pudesse se manifestar, dizendo como votariam. De que adianta o direito de defesa se aquele que vai julgar já sabe como vai decidir? De que adianta apresentar razões e tentar demonstrá-la se alguém já vinculou publicamente a posição que vai assumir?, questionou Cardozo.
De acordo com o ministro, caso o recurso não fosse respondido, o próximo passo seria a judicialização do processo no âmbito da Corte Interamericana de Direitos Humanos, pois o direito de defesa da presidente Dilma Rousseff foi violado. Cardozo avaliou que o pedido de interferência da Corte no país seria "desagradável".
O ministro garantiu que a conversa com Maranhão foi exclusivamente sobre os recursos e que não houve negociação de cargos no governo. Ele disse que só soube da decisão final do presidnete da Câmara na manhã de hoje.
Anulação
Hoje de manhã, o presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão, decidiu pela anulação das sessões dos dias 15, 16 e 17 de abril, quando os deputados federais votaram pela admissibilidade do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Após a decisão, Maranhão encaminhou ao Senado um pedido de devolução do processo e marcou nova data para votação, contadas cinco sessões a partir desta segunda-feiras.
Cardozo explicou que Maranhão acolheu quatro dos cinco argumentos apresentados pela AGU.
– Ele entendeu que não havia problema de os parlamentares declararem seus votos no momento da votação, mas concordou, por exemplo, que os partidos não poderiam ter fechado questão e orientado os parlamentares na decisão. Para o ministro, a decisão, pela Lei do Impeachment, deve ser tomada livremente pelos parlamentares, que, nesse caso "não estão na atuação tipica de parlamentares", concluiu.