O governo de Michel Temer (PMDB) completa duas semanas no comando do país nesta quinta-feira envolto em tropeços. Os deslizes municiaram a oposição para questionar a legitimidade do presidente interino e acusá-lo de cometer erros e recuar ao sabor da opinião pública.
O mais grave dos questionamentos ocorreu depois da divulgação de áudios do então ministro do Planejamento, Romero Jucá (PMDB-RR), que apontaram uma tentativa de barrar o avanço da Operação Lava-Jato. Ele deixou o cargo, e Temer até deixou de lado o perfil discreto em fala no Congresso:
– Tenho ouvido: "Temer está muito frágil, coitadinho, não sabe governar". Conversa! Fui secretário de Segurança duas vezes em São Paulo e tratava com bandidos. Eu sei o que fazer no governo – disse ao desferir um tapa sobre a mesa.
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Relembre, abaixo, as 14 polêmicas do governo interino:
1. Enxuga (ou não) os ministérios
Temer anunciou que, em um eventual governo, pretendia reduzir o número de ministérios para algo em torno de 20. Depois, voltou atrás porque teria de abrigar aliados e disse que cortaria somente três. O recuo se tornou alvo de críticas, até que, ao tomar posse, o peemedebista excluiu nove pastas, indo de 32 para 23 ministérios. A justificativa era conter despesas, mas, na prática, a redução promove uma economia simbólica.
2. Os homens do presidente
O presidente interino escolheu somente homens para compor o primeiro escalão e se tornou o primeiro governo sem mulheres desde Ernesto Geisel (1974-1979). A ausência feminina na Esplanada se tornou alvo de críticas, e a oposição acusou Temer de formar um governo pouco diversificado. Depois da polêmica, Temer nomeou a economista Maria Silvia Bastos Marques para a presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), cargo que não tem status de ministro.
3. Ministros sob investigação
Ainda na esteira das polêmicas que envolvem o primeiro escalão, Temer ouviu críticas por escolher como ministros políticos investigados. O então titular do Planejamento, Romero Jucá (PMDB-RR), responde a dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal (STF) na Lava-Jato, e pelo menos outros dois novos ministros tiveram os nomes citados na operação. A equipe ainda tem titulares que respondem a outras acusações na Justiça.
4. Bandeira desatualizada
O tom conservador do novo logotipo do governo federal não repercutiu bem e ainda se tornou motivo de piadas depois que o publicitário responsável pela marca contou que a identidade visual havia sido escolhida por Michelzinho, filho de sete anos de Temer. Depois, foi revelado que a marca se baseara em uma versão antiga da bandeira brasileira, que vigorou na ditadura militar e tinha cinco estrelas a menos do que as 27 atuais.
5. Influência de Eduardo Cunha
Gustavo do Vale Rocha, advogado do presidente afastado da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), foi chamado para o cargo de subchefe para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência. Em sua defesa, ele garantiu que trabalhou para Cunha somente em ações privadas que não envolviam a Lava-Jato.
6. Rever (ou não) o tamanho do SUS
O ministro da Saúde, Ricardo Barros (PP-PR), declarou que o tamanho do Sistema Único de Saúde (SUS) deveria ser revisto porque o país não conseguiria mais sustentá-lo em função da escassez financeira. A informação veio acompanhada da notícia de que Barros tivera a campanha eleitoral financiada por planos de saúde privados, o que repercutiu mal. O ministro teve de fazer malabarismos para desdizer a afirmação.
7. Mudança (ou não) em processo de escolha da PGR
O ministro da Justiça, Alexandre Moraes, defendeu que o presidente interino trocasse o método de escolha do procurador-geral da República (os governos petistas adotaram a prática de indicar para o cargo sempre o nome mais votado em eleição interna no Ministério Público). Tamanha a repercussão negativa da declaração que o próprio Temer desautorizou Moraes e declarou que manterá o processo de seleção.
8. Manutenção (ou não) de programas sociais
Em seu discurso de posse, o presidente interino garantiu que os programas sociais implementados nos governos petistas seriam mantidos, mas não descartou reformas em alguns dos benefícios sem mexer em direitos adquiridos. Dias depois, o ministro das Cidades, Bruno Araújo (PSDB-PE), revogou a construção de 11.250 unidades do Minha Casa, Minha Vida. No mesmo dia, Araújo se desdisse ao dizer que não se tratava de uma "suspensão".
9. Erro no currículo de Marcela
Na tentativa de justificar as qualificações de Marcela para ocupar um eventual cargo em uma área social do governo, Temer disse que a sua mulher é advogada em entrevista ao programa Fantástico, da Rede Globo. Porém, apesar de formada em Direito, Marcela não é advogada porque não possui o registro na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
10. Líder investigado por homicídio
Temer alçou André Moura (PSC-SE), deputado da tropa de choque de Cunha, a líder de governo na Câmara. Fora as críticas de que o governo se mantém refém de Cunha, vieram à tona uma série de denúncias que envolvem o novo líder. Ele é réu em três ações e responde a outros três inquéritos no STF. Um deles por tentativa de homicídio, e outro por envolvimento na Lava-Jato. Moura alegou que não existem provas para incriminá-lo.
11. Polêmica na Comunicação
Nomeado por Dilma para o cargo de diretor-presidente da Empresa Brasileira de Comunicação (EBC), Ricardo Pereira de Melo ficou apenas duas semanas no cargo e foi exonerado por Temer. Mas Melo tenta anular a sua saída no STF porque defende que a EBC não é uma estatal, mas uma empresa pública – por isso, o mandato seria de quatro anos, independente de governo. Temer convocou Larte Rimoli, ex-coordenador de comunicação da campanha de Aécio Neves (PSDB-MG), para o cargo.
12. Extinção e recriação do Ministério da Cultura
O Ministério da Cultura entrou na tesourada dos ministérios de Temer e acabou extinto, tornando-se uma secretaria vinculada à pasta da Educação. O corte foi alvo de duras críticas da classe artística e intelectual. Manifestantes contrários ao corte chegaram a ocupar prédios públicos relacionados ao ministério em diversos Estados. O presidente interino recuou e, no último sábado, decidiu recriar a pasta. O então secretário de Cultura do Rio, Marcelo Calero, assumiu a pasta.
13. Vazamento de áudio
O então ministro do Planejamento, Romero Jucá (PMDB-RR), abandonou o cargo depois da revelação de diálogos gravados entre ele e o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado. Nas conversas, ocorridas em março, Jucá sugere um pacto para conter o avanço da Lava-Jato e diz que uma "mudança" no governo federal resultaria em um pacto para "estancar a sangria" representada pela operação. Jucá não resistiu à pressão e retornou ao mandato de senador. A oposição se valeu da gravação para defender que o impeachment de Dilma não passa de um "golpe".
14. Ministro da Educação recebe propostas de Alexandre Frota
Causou estranhamento a visita do ator Alexandre Frota ao ministro da Educação, Mendonça Filho, na última quarta-feira, com o objetivo de apresentar "ideias para ajudar o país". Frota, que já atuou em filmes pornô, sugeriu uma proposta de ensino sem "imposição ideológica, seja marxista ou de gênero". Ele estava acompanhado de representantes do movimento Revoltados Online, grupo contrário a políticos de esquerda que tem o ator entre os apoiadores. Mendonça disse que não via problema na visita e que o "ministério comporta a pluralidade e o respeito humano a qualquer cidadão", sem discriminar ninguém pelas suas escolhas de vida.
* Zero Hora