Símbolo da reeleição do prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, o jingle do chapéu de palha teve a letra, a melodia e a gravação realizadas em cinco dias. Após estrear em 6 de setembro na propaganda na TV, virou a principal referência de marketing político do emedebista.
De letra fácil, curta e refrão grudento, com a pegada popular do samba, conseguiu sintetizar em um acessório, o chapéu de palha, predicados difundidos pela equipe de Melo: o homem simples e ouvidor, presente nas periferias da cidade, que trabalha na linha de frente e resolve problemas.
O melô caiu no gosto da militância e de eleitores, a ponto de o chapéu de palha ser usado por centenas de apoiadores em atividades de campanha como caminhadas e bandeiraços. Na estratégia de marketing, o jingle foi o mais reproduzido pela equipe do prefeito reeleito.
— Pegou porque não foi forçado. Foi uma coisa orgânica. Ele usou o chapéu de palha nos quatro anos de governo nas comunidades. Pegamos uma característica dele e fortalecemos. Era popular e autêntico — diz Ricardo Soletti, coordenador de criação da candidatura de Melo.
Soletti recorda que, antes do período eleitoral começar, havia a ideia de usar o chapéu de palha, em algum momento, como fórmula para tocar o povo. No início da campanha, ainda tateando o ânimo do eleitorado, houve a percepção de que Melo estava com popularidade junto aos porto-alegrenses.
Foi a senha para uma aposta descontraída. O marqueteiro encostou no redator Eduardo Tajes, definido como um ótimo letrista, e encomendou um jingle que reunisse o chapéu de palha com as outras características do então candidato.
A letra de Tajes nasceu, Soletti sugeriu ajustes e, em seguida, músicos contratados para trabalhar na campanha compuseram a melodia. Faltava a voz. O diretor de cena Claudio Fagundes, profissional com trânsito no meio carnavalesco, lembrou do intérprete Renan Ludwig, da escola de samba Estado Maior da Restinga.
— Me pediram para puxar para o samba. Fizemos uma adaptação de ritmo para deixar mais popular — conta Ludwig.
Marca do sambista despertou dúvida
Em menos de uma semana, a peça estava pronta, gravada na Cubo Filmes, produtora de Porto Alegre. Antes de finalizar, contudo, uma dúvida acachapante assombrou o marketing. Ludwig tem o hábito de acrescentar uma assinatura musical em todas as gravações que faz: “Ulalá”, repete a cada trabalho bem executado. E assim ele fez no jingle do chapéu de palha.
Tudo corria bem até que uma das pessoas convidadas a fazer audições levantou a dúvida: será que o “ulalá” não poderia ser foneticamente confundido com “Lula lá”? Seria uma bola fora digna de fiasco.
“Lula lá” é uma estrofe do icônico jingle de 1989 do presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva. E, na eleição de Porto Alegre, Lula apoiava a candidata Maria do Rosário (PT), principal adversária de Melo.
— Ficamos em dúvida sobre fazer ou não. No final, gravamos duas versões, com e sem o ulalá — detalha Ludwig.
Soletti afirma que, após repetidas análises, concluíram que o “ulalá” estava claro e inconfundível. Mantiveram a assinatura musical e a combinaram com um gesto de Melo: tirar o chapéu de palha e se curvar levemente diante da câmera, uma saudação ao espectador.
— Virou uma marca superpopular. A única imagem que produzimos foi nessa mesura de tirar o chapéu de palha no ulalá. As outras eram imagens do decorrer do mandato, em que ele ia nas comunidades — conta Soletti.
A estreia do jingle ocorreu no sétimo programa de propaganda na TV, à noite, quando a campanha apresentou como conquista da gestão o programa Mais Comunidade, em que Melo faz incursões nas periferias junto de secretários para tentar resolver problemas em regime de mutirão.
— Me deu uma visibilidade que não esperava — conta Ludwig, que está sendo reconhecido na rua e teve alavancagem nas redes sociais.
Como prova do sucesso, Ludwig foi chamado para puxar os versos da canção nas comemorações de Melo após o primeiro e o segundo turno da eleição de 2024.
Vice-presidente de Planejamento do Clube dos Profissionais de Marketing Político (CAMP), o publicitário e estrategista Fábio Bernardi, experiente em eleições, avalia como meritória a peça que se tornou popular na campanha do prefeito reeleito.
— Ter se apropriado do chapéu de palha, o que é verdadeiro na vida do Melo, foi uma baita sacada e ajudou muito a tirar a rejeição aumentada pela enchente. É o tipo de semiótica que a campanha da Maria não teve. A música ajuda a popularizar e vai direto no coração. É muito eficiente como peça — analisa Bernardi.