Quando Eva do Amaral Facim nasceu, em abril de 1934, as mulheres recém haviam conquistado o direito de votar no Brasil graças a meio século de mobilização de movimentos sociais. Passados 90 anos, sob o nome de urna de Eva Facin, a idosa é uma das quase 10 mil candidatas do gênero feminino em busca de um cargo público no Rio Grande do Sul nesta eleição — e a mais velha entre todos os concorrentes registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pelo Estado. Ela disputa, pela primeira vez, uma vaga na política, para vereadora em Santiago, na Região Central, pelo PDT.
No distante 20 de abril de 1934, quando Eva veio ao mundo, Getúlio Vargas vivia as últimas semanas de seu governo provisório, antes de ser reempossado em uma eleição indireta e dar seguimento à chamada Era Vargas. Na Alemanha, Hitler se preparava para assumir o comando do país ao unir as funções de presidente e chanceler. A população gaúcha mal contava 3 milhões de pessoas, e a expectativa média de vida no país era inferior a 40 anos. Natural de São Francisco de Assis, logo aos 16 anos Eva começaria a trabalhar como professora ensinando não apenas crianças a ler e a escrever, mas também adultos analfabetos.
— Lecionava na escola Vista Alegre. Sempre amei trabalhar. Dava carinho e conhecimento aos meus alunos pra que se tornassem pessoas maravilhosas. Hoje, tem professores da Universidade Federal de Santa Maria que fui eu que alfabetizei — vangloria-se a candidata nonagenária.
No outro extremo do ranking etário, o TSE contabiliza 21 candidatos de 18 anos na disputa pelo voto dos gaúchos nestas eleições. Essa é a idade mínima estipulada legalmente para tentar uma vaga como vereador.
Eva se aposentou do magistério, mas não da missão de seguir ensinando — embora, atualmente, tenha trocado as letras pelos temperos:
— Agora sou professora de culinária. Fiz vários cursos. Minhas amigas vêm aqui em casa, faço muita compota e ensino a elas. Então, considero que continuo sendo professora.
A candidata concilia o trabalho como criadora de gado, em uma fazenda que ainda supervisiona pessoalmente, com outras paixões como plantar árvores e ceder mudas a outras pessoas interessadas em deixar o planeta mais verde. O hábito remonta a uma antiga tradição familiar.
— Meu finado pai tinha um sistema: quando a minha mãe engravidava, ele escolhia uma muda. Quando o filho nascia, ele plantava. Eu fui uma muda de cedro, que é uma madeira dura, forte. Então eu amo árvores, tenho um viveiro e faço mudas pra dar para as pessoas. Agora mesmo tenho 60 mudas de pessegueiro para os vizinhos — conta a professora aposentada.
Eva diz que a decisão de entrar para a vida política na terceira idade, quando muitas outras pessoas já buscam um cotidiano mais sossegado, veio a partir de um convite do diretório municipal da sigla.
— Dona Eva é filiada ao partido há muito tempo, participa das discussões municipais, já integrou comissões do Sindicato Rural de Santiago. É uma pessoa que pega no batente — avalia o advogado e companheiro de legenda Paulo Cesar Garcia Rosado.
A candidatura também é uma forma de homenagear o marido, Ivo, já falecido.
— Ele amava o partido, mas nunca chegou a se candidatar. Então resolvi fazer isso também por respeito a ele — revela a produtora rural, que não teve filhos.
A idosa se desloca sem grandes dificuldades, fala de modo acelerado e, até pouco tempo atrás, ainda dirigia pelas estradas do município. Agora, prefere andar na carona. Diz que vai fazer campanha apenas divulgando seu nome, sem bater de porta em porta, para receber os votos por merecimento e não por pedi-los. Entre suas ambições, caso consiga se eleger, está elaborar projetos que aumentem a proteção aos idosos em Santiago. Garante que não faltará disposição.
— Eu amo a vida, amo as pessoas, amo trabalhar. Não tenho empregada, eu mesma cozinho. Agora mesmo estou com uns 40 vidros de doce de laranja prontos — conta a candidata de nove décadas de vida.
E complementa, despedindo-se:
— Agora preciso ir, estou com a caminhonete carregada de sal e de medicamentos para o gado.