O debate realizado neste sábado (24) por um pool de meios de comunicação com os candidatos à Presidência foi marcado por críticas à ausência do líder das pesquisas, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e ataques ao atual presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL), segundo colocado nas sondagens. A interação entre os concorrentes apresentou poucas propostas concretas e sucessivos pedidos de direito de resposta em razão de trocas de acusações.
Foram convidados para o programa os sete presidenciáveis de partidos que têm, pelo menos, cinco deputados federais. Como Lula deixou vazio seu púlpito, exibido dessa forma já nos primeiros segundos do programa comandado pelo jornalista Carlos Nascimento, os outros seis concorrentes dividiram as mais de duas horas de discussões: Bolsonaro, Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (MDB), Soraya Thronicke (União Brasil), Felipe D'Avila (Novo) e Padre Kelmon (PTB).
O encontro, marcado para as 18h15min, já começou em temperatura elevada. Simone Tebet acusou Bolsonaro de mentir, ser agressivo com as mulheres e retirar verba de lanches escolares e creches para favorecer o chamado orçamento secreto.
— Você mente e não trabalha, só anda de jet ski —completou a emedebista.
Bolsonaro afirmou que o orçamento é definido em conjunto com o Congresso:
— O orçamento é feito em quatro mãos: Executivo e Legislativo. Não é verdadeira a acusação de cortar a merenda porque o orçamento ainda não foi votado. E a senhora votou para derrubar o veto ao orçamento secreto.
Simone, porém, diferentemente do que alegou o adversário, não votou favoravelmente ao orçamento secreto como senadora. Ela teve um pedido de resposta negado.
O concorrente do PL aproveitou ainda parte do tempo de resposta para criticar Lula por ter se ausentado do debate promovido por SBT, VEJA, Nova Brasil, Estadão/Eldorado, Terra e CNN Brasil. Em seguida, Ciro Gomes e Soraya fizeram uma dobradinha para seguir neste assunto.
— Você contrataria alguém que falta à entrevista de emprego? — questionou ela, de forma retórica.
— Lula não veio porque, ou está de salto alto e acha que já ganhou, ou não tem como explicar nem suas promessas, nem as denúncias de corrupção — devolveu Ciro.
A cada início de bloco, foi exibido o lugar vazio destinado a Lula. O petista informou na sexta-feira (23) que não compareceria em razão de uma suposta demora dos organizadores do evento. O candidato alegou que sua campanha havia solicitado que o debate inicialmente previsto para ser transmitido pelo SBT fosse feito na forma de pool com outras emissoras, mas que quando isso foi confirmado, ele já teria compromissos de campanha agendados.
Em nota, os organizadores informaram que o pool havia sido formalizado antes mesmo da sugestão da campanha petista, e a data do encontro já era conhecida desde março. Nos bastidores, a campanha de Lula teria avaliado que o candidato, em ligeira ascensão nas pesquisas e em busca de uma vitória no primeiro turno, não teria muito a ganhar no encontro. A estratégia também prevê que o petista se concentre no debate da TV Globo, na quinta-feira (29), considerado mais decisivo pela maior audiência e pela proximidade com a data da eleição.
A exemplo de Simone, Soraya também criticou o atual presidente pela proposta de orçamento para o próximo ano, que incluiu cortes de gastos com educação e saúde, a exemplo das reduções de recursos para a Farmácia Popular, enquanto, segundo ela, o governo manteve gastos com Viagra e próteses penianas para militares. O concorrente do PL chamou Soraya de "estelionatária" eleitoral por ter usado a imagem dele em materiais de campanha quando foi eleita senadora, e a acusou erroneamente de ter votado favoravelmente ao orçamento secreto.
— Não cutuque a onça com a sua vara curta — respondeu Soraya logo depois, em declaração que virou meme quase instantaneamente nas redes sociais.
Bolsonaro diz que fará STF "mudar forma de agir"
No segundo bloco, jornalistas faziam perguntas a um candidato, e escolhiam outro para comentar. Ao ser provocado por Ciro Gomes sobre suspeitas de corrupção envolvendo as gestões petistas e a atual, Bolsonaro disse que não deve nada à Justiça e voltou a criticar um suposto "ativismo judicial" do Supremo Tribunal Federal (STF). Afirmou que, se permanecer no cargo, pretende indicar dois novos ministros em um próximo mandato que alterem o perfil de atuação da Corte, os quais se somariam a duas indicações já feitas (Kassio Nunes Marques e André Mendonça):
— Com quatro pessoas pensando em prol do Brasil, o Supremo mudará a forma de agir e não mais intervirá tanto na vida de todos nós.
Retomando uma das disputas mais intensas da noite, Simone Tebet criticou Bolsonaro pela situação de fome e pobreza da população, pela demora na compra de vacinas e voltou a acusar o presidente de "Pinóquio" por mentir, além de repetir a alegação de que prefere "andar de moto e jet ski" em vez de trabalhar.
Felipe D'Avila aproveitou uma das questões para propor mudanças que aumentem o rigor na concessão de porte de arma à população.
— Qualquer clubinho de tiro te dá uma licença — afirmou o representante do Novo, que propôs unificação de bancos de dados nacionais para averiguar antecedentes de quem pretende se armar.
Figura mais singular do debate, vestido com um traje cinza escuro e um grande crucifixo de prateado estendido sobre o peito, Padre Kelmon aproveitou seu tempo de tela para dizer que estava ali para ficar ao lado do atual presidente contra os ataques dos demais concorrentes. O padre voltaria a criticar os demais participantes por pressionarem Bolsonaro em outros momentos.
— Todos os candidatos atacam um só, o presidente da República. Cinco contra um. Mas agora são cinco contra dois (....). Então o nosso presidente não fez nada de bom? — questionou, consolidando a maior parceria da noite.
Terceiro bloco discutiu corrupção
No penúltimo bloco, em que os concorrentes voltaram a fazer questionamentos entre si, Felipe D'Ávila questionou Bolsonaro sobre corrupção. Perguntou qual a diferença entre o mensalão petista e o atual orçamento secreto, e lembrou que o partido do presidente é comandado por Valdemar Costa Neto — um dos condenados pelo STF no caso do mensalão.
— O senhor também tem um ex-presidiário, ligado à corrupção, vinculado ao seu governo — afirmou o candidato do Novo, fazendo referência ao termo que Bolsonaro costuma dispensar a Lula.
Bolsonaro voltou a repetir que a definição do orçamento secreto passou pelo Congresso, e não por ele. Em um momento de tensão, Padre Kelmon criticou Simone Tebet por se declarar feminista e, ao mesmo tempo, se dizer católica e contrária ao aborto. A emedebista afirmou que não via qualquer contradição entre as duas posições.
— O feminismo no Brasil precisa ser entendido não como uma pauta de esquerda, mas como uma pauta cristã — desabafou.
Em questionamento a Felipe D'Avila, Ciro Gomes manteve sua estratégia de atacar a dupla à sua frente nas pesquisas e criticou a falta de crescimento econômico, as crises econômicas e as suspeitas de corrupção observadas nas gestões do PT e de Bolsonaro.
Logo em seguida, Ciro e o presidente trocaram acusações envolvendo corrupção. O presidente lembrou que o pedetista já foi alvo de medida de busca e apreensão da Polícia Federal em sua casa. Com direito de resposta concedido, Ciro disse que a operação foi julgada ilegal e teria sido organizada ou "por um delegado petista" ou pelo "governo Bolsonaro interferindo na PF como fez para proteger os filhos".
No bloco final, candidatos falam sobre violência política
Em nova etapa de perguntas de comunicadores, Jair Bolsonaro foi lembrado pela jornalista Clarissa Oliveira de diversos episódios de violência recentes envolvendo militantes seus contra apoiadores de Lula, e foi questionado se se arrependia de fazer declarações violentas contra adversários políticos — como quando disse que estaria disposto a "fuzilar a petralhada".
O presidente se negou a responder diretamente a questão, disse que a pergunta foi "lamentável" e, de forma irônica, dizendo-se palmeirense, pediu à torcida que não brigasse para que ele não seja responsabilizado. O concorrente do PL lembrou que um homem com uma tatuagem de Lula matou a ex-mulher e o filho recentemente. No caso citado por Bolsonaro, o autor do crime tinha um registro de Caçador, Atirador e Colecionador de Armas (CAC), grupo que teve acesso a armamento facilitado na atual gestão federal.
Ao comentar a resposta, Ciro Gomes disse:
— Quem criou essa história de "nós contra eles" foi o PT, e o Bolsonaro adora.
Perguntada sobre o avanço de armamentos na sociedade brasileira, Soraya observou que as mulheres são alvos frequentes de violência política.
— Não podemos andar na rua que somos atacadas — afirmou a candidata do União Brasil.
O debate terminou por volta das 20h30min com as manifestações finais de cada candidato ao eleitor.