Enquanto grandes municípios devem ter concorrência acirrada nas eleições de 2020, candidatos a prefeito de algumas localidades já podem pensar em cantar vitória antes da hora. Em 33 cidades gaúchas, sequer haverá disputa: há apenas um concorrente ao posto (veja no mapa abaixo).
O levantamento foi feito por GZH com base na lista dos 1,3 mil candidatos a prefeito nos 497 municípios existentes no Rio Grande do Sul.
Os nomes foram apresentados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) até o último sábado (26), quando se encerrou o prazo para o registro de candidaturas. O número, no entanto, ainda pode mudar: a Justiça Eleitoral precisa aprovar as candidaturas, e pode haver desistências.
Com exceção de Veranópolis, todas as cidades com candidatura única têm uma característica em comum: a população estimada para 2020 não chega a 9 mil habitantes. Em alguns lugares, inclusive, o número de eleitores é superior ao número de moradores — o que mostra a grande quantidade de pessoas que saíram de municípios pequenos, mas não mudaram o local de votação.
Como serão as eleições nessas cidades?
Para que o candidato conquiste o cargo desejado, basta que ele vote em si mesmo: se o concorrente tiver um único voto, será o eleito. A regra vale mesmo que, em uma situação hipotética, 99% dos votos da cidade fossem brancos ou nulos:
— Como ele vai ser o único candidato, tendo um voto já é suficiente para se eleger. O que vale são os votos válidos. (Se ele mesmo votar nele) Está ganha a eleição — explica a assessora técnica dos Desembargadores Eleitorais do Tribunal Regional Eleitoral (TRE), Marília Medeiros Piantá.
A Justiça Eleitoral corre contra o tempo para, até o dia 26 de outubro, julgar todos os pedidos de registro de candidaturas, inclusive as impugnadas e os respectivos recursos. Esta data é o prazo final e marca os 20 dias antes das eleições. Este também é o último dia para que sejam feitas substituições de candidatos.
O concorrente que tiver a candidatura indeferida pode recorrer e seguir com os atos de campanha até a decisão definitiva. Ele pode, inclusive, participar das eleições na condição de "sub judice", ou seja, que ainda não foi julgado.
Neste caso, há três possibilidades. Se ele tiver a candidatura deferida, o pleito segue normalmente. Se ela for indeferida definitivamente depois do dia 26 de outubro e não for dado prazo para substituição, as eleições são canceladas — já que, nestas cidades com candidatura única, só haveria um concorrente. Se a negativa da Justiça vier depois da votação, a cidade terá que passar por um novo processo eleitoral.
— Acaba tendo novas eleições. Só do pleito de 2016, foram 12 novas eleições por registros indeferidos ou por ilícito eleitoral (o número é geral e não se refere somente a candidaturas únicas). Tanto que, no caso de Parobé, a votação foi em março deste ano, a última renovação — lembra Marília.
Exclusão do eleitor
Além de as candidaturas únicas não proporcionarem chance para renovação na política, o promotor Rodrigo López Zilio, coordenador do Gabinete Eleitoral do Ministério Público, alerta para outros dois problemas: a exclusão do eleitor e a subvalorização da democracia:
— O eleitor, que é o elemento central da política e que tem o poder de renovar ou não seus representantes, fica privado disso. E há ainda outros efeitos, que é a colocação da democracia representativa em um grau ou nível inferior. A democracia é a participação popular, e eu vejo elementos para contraindicar este tipo de conduta. Se este município (com repetitivas candidaturas únicas) tem esta dificuldade, não deveria ser município — defende o especialista, também professor de Direito Eleitoral.
Zilio acredita que determinadas dificuldades que os municípios enfrentam possam justificar as exceções, como recessões econômicas ou períodos de seca. No entanto, entende que esta não deveria ser a regra. O promotor tem receio de que esta prática possa abrir margem para coação ou para um "acordão", em que outras pessoas são excluídas do processo.
— Me preocupa que isso se torne uma constante no sentido de excluir outros pretendentes, de pessoas dominarem os partidos, e me preocupa que outras pessoas que queiram participar não consigam. Eu estou falando hipoteticamente, mas não descarto a possibilidade de ocorrer.
Para ele, esta prática só vai se modificar quando algo grave acontecer:
— A solução vai existir quando acontecer algo muito fora do padrão, que chame a atenção das autoridades, como, hipoteticamente, um acordo ou constrangimento de pessoas de outros partidos. Estamos trabalhando aqui com o pior dos mundos. Se isso for comprovado, aí vamos começar a pensar em algo prospectivo.