Michael Mohallem, coordenador do Centro de Justiça e Sociedade e professor de Direito da FGV no Rio, faz alerta ao eleitor: é preciso ficar atento aos nomes dos suplentes de senadores. Afinal, podem assumir o cargo, participar de votações e revisar decisões tomadas na Câmara.
Como avalia o mecanismo de eleição de suplentes a senador?
Isso tem gerado dificuldades do ponto de vista da representatividade, porque as pessoas mal conhecem o suplente que elegem automaticamente quando votam na cabeça da chapa. Em cargos para o Executivo, como de presidente ou governador, o vice acaba mais conhecido, mas é diferente no Senado. O indivíduo escolhe de antemão a suplência, o que gera um sentimento de falta de legitimidade. É diferente da Câmara, onde o suplente é o próximo da lista com mais votos dentro daquele partido.
Por que o eleitor deve se informar sobre os suplentes?
Na política brasileira, há a cultura do parlamentar que participa do governo ao ser nomeado como ministro de Estado ou ao concorrer a cargos como de prefeito ou governador. Além disso, o senador tem oito anos de mandato, tempo grande para concorrer a outro posto. Se isso acontecer, o suplente assume. O senador tem importância fundamental: exerce papel de revisão do processo legislativo que começa na Câmara. O senador pode influenciar no processo legislativo. Dentro do partido, o titular pode indicar um familiar e, muitas vezes, até um financiador de campanha. São táticas muito ruins para a democracia. Quando vejo a situação de partidos indicando familiares para suplente, minha primeira impressão é de evidência de fracasso da democracia interna dos partidos.
É comum que o suplente sirva como cabo eleitoral?
É natural do processo democrático o uso correto do espaço da suplência. Posso fazer uma coalizão de forças políticas trazendo um suplente de outro partido, portanto, atraio a legenda para aquela chapa. Mas também posso, como alguns fazem, se o titular é um homem, chamar como suplente a mulher para ter representatividade de gênero. O que deteriora a democracia é usar esses cargos para benefício da família ou de aliados muito próximos. Como se a candidatura fosse hereditária, um patrimônio.
O suplente não recebe nenhum voto do eleitor. Há risco de ele ter opiniões diferentes daquelas do senador eleito como titular?
Existem casos de vice, no Executivo, com posição muito diferente do titular. Então, há a possibilidade de o suplente ter visão diferente do titular e alterar os rumos da atuação parlamentar quando assumir. Mas, se ambos são do mesmo partido, geralmente têm proximidade ideológica. Geralmente, o sujeito de esquerda traz suplente do mesmo campo do pensamento.
Esses arranjos deveriam ser mais claros ao eleitor? Por que os partidos não dão publicidade aos suplentes?
Se meu partido usa a suplência para colocar um financiador, vou tentar escondê-lo, porque ele não tem representatividade política. Se o suplente é filho do político, essa informação cria constrangimento para o partido, mostra fraqueza partidária em sucumbir à vontade do titular da chapa. Ao mesmo tempo, há dificuldade em colocar uma figura muito proeminente na suplência, porque ela vai querer disputar como titular.
A legislação permite a escolha de parentes como suplentes. Há prejuízo à democracia?
Acho sinal de fraqueza dos partidos. E gera constrangimento à população ao perceber que o titular carrega um parente. É uma espécie de nepotismo eleitoral que, embora não seja proibido, é ruim para a democracia.
Qual a função do senador?
O senador representa os interesses do Estado. Pode propor e modificar leis, fiscalizar o governo ao lado do Tribunal de Contas da União (TCU), sugerir emendas parlamentares, aprovar o orçamento do governo federal, além de analisar nomes para Supremo Tribunal Federal (STF), TCU, Banco Central, Procuradoria-Geral da República, agências reguladoras e embaixadas.
O salário é de R$ 33.763. Além disso, há auxílios moradia (R$ 5.500), médico e odontológico e verba indenizatória que varia para cada Estado (no caso dos gaúchos, é de R$ 35,8 mil).
Em outros países
Segundo estudo de pesquisadores do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, dos 77 países com Câmara Alta (Senado) ao redor do mundo, 31 contam com senadores não eleitos. Os nomes são indicados por rei, assembleias estaduais, chefe de governo, conselhos locais ou colégios eleitorais. No México, o sistema é como o brasileiro. Nos Estados Unidos, é o governador que escolhe.
Na Austrália, é a assembleia estadual. Em ao menos 12 países (incluindo Espanha, Suíça e Polônia), o suplente é escolhido após novas eleições.
Na Itália, é o segundo da lista eleitoral. Em Burundi, os ex-presidentes têm direito ao cargo vitalício de senador.