Pela primeira vez no país, resultados de pesquisas de intenção de voto feitas por telefone estão sendo divulgados ao público. Esse modelo, maioria absoluta em países como Estados Unidos, já existia no Brasil e era praticado corriqueiramente, mas os resultados eram utilizados somente para informação de grupos restritos e das campanhas. Público em geral não tinha acesso e veículos de comunicação não publicavam. Agora, mudou. E uma discussão surgiu entre os defensores da técnica face a face, a tradicional, em que o entrevistador colhe informações junto às pessoas nas ruas ou nos domicílios, e a do telefone.
Os levantamentos via ligações são mais baratos e ágeis. Em geral, realizados com o auxílio de softwares que disparam chamadas para todo o Brasil. Quem recebe o telefonema opta por participar ou não, registrando as respostas no teclado do aparelho.
— São pesquisas feitas por um robô e uma gravação. Normalmente, se concentram nas cidades com mais linhas telefônicas e ligam muito para as fixas. A maioria das pessoas que tem linha fixa hoje é das classes A e B. As de menor renda têm celular pré-pago. São grandes fatias do eleitorado menos atingidas por essas pesquisas — avalia Jefferson Jaques, diretor do Instituto Methodus.
O Ibope faz coleta eleitoral por telefone desde 2002, mas segue com a política de não permitir a divulgação dos resultados.
— Cerca de 11% da população brasileira não tem nenhum tipo de telefone, nem fixo nem celular, sendo a maioria dessas pessoas de classe D e E. Um candidato que atende ao perfil do eleitor menos escolarizado e de menor renda vai ficar subestimado na pesquisa telefônica. E o candidato que tem perfil de eleitor mais escolarizado e de maior renda, vai ficar superestimado — diz Márcia Cavallari, diretora do Ibope Inteligência.
Ela ainda destaca que, nos levantamentos robotizados, é mais difícil ter proporção de entrevistados correspondente aos 53% de mulheres eleitoras e 47% de homens — o que tornaria as amostragens menos condizentes com o perfil brasileiro.
— Nas automatizadas, responde quem quer. Isso pode gerar um retorno de ligações enviesado que, mesmo com ponderações, não se consegue corrigir. Vamos imaginar que, nas ligações, mais homens do que mulheres quiseram esperar para responder. Em vez de termos proporção correta do eleitorado, vieram 60% de respostas de homens e 40% de mulheres — analisa Márcia.
Jaques, do Methodus, aponta o face a face como modelo mais eficaz e destaca cuidados como checagem por amostragem, em que são feitas ligações por telefone para 20% dos entrevistados presenciais. O objetivo é verificar se as respostas foram registradas corretamente. Ainda existem possibilidades como refazer o levantamento no campo de um pesquisador que tenha apresentado dados fora dos padrões. Além das cidades grandes, onde sempre são aplicados os questionários, também são enviados entrevistadores a pequenos e médios municípios. A escolha dos locais de menor porte ocorre por sorteio.
— Por que ir nas pequenas? É muito diferente morar lá em comparação com as metrópoles. Somadas, as cidades pequenas são mais de 400 no Rio Grande do Sul. Elas produzem um efeito muito significativo e, por isso, temos de ir lá — explica Jaques.
Publicada para regrar as pesquisas eleitorais, a resolução 23.549, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), é omissa sobre o método de apuração, não vedando a opção da ligação robotizada.
— Nunca alguém tinha tentado registrar uma pesquisa por telefone. Fizemos isso e ninguém impugnou. Em abril, passamos a publicar — explica Guilherme Alpendre, diretor-executivo do site Poder360, que detém entre suas marcas o DataPoder360.
A assessoria de comunicação FSB e o Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe) também têm realizado coletas por telefone, posteriormente divulgadas em alguns veículos de comunicação. O banco BTG Pactual e a XP Investimentos contrataram esses levantamentos. O coordenador da divisão de pesquisas do DataPoder360, Rodolfo Costa Pinto, produziu artigo para responder a 11 perguntas sobre polêmicas diversas. Ele diz que não existe melhor forma de abordagem e que "diferentes metodologias são aceitáveis do ponto de vista estatístico se forem atingidos todos os estratos da sociedade".
Costa Pinto contesta que as sondagens eletrônicas têm problemas em colher as preferências das camadas mais pobres da sociedade: "Há uma parcela da população que tem dificuldade para ouvir uma pergunta e digitar a resposta por meio do teclado do telefone. É por essa razão que o DataPoder360 faz disparos aleatórios de telefonemas de maneira intensa para os números associados a CEPs de regiões com menor IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). Dessa forma, os questionários preenchidos são em número suficiente para garantir a representação desse grupo social dentro do levantamento".
A Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (Abep) abriu processo no TSE, ainda em tramitação, requerendo parecer sobre a viabilidade do método de entrevistas robotizadas. Questionada pela reportagem, a Justiça Eleitoral respondeu, por e-mail, que "não se manifesta antecipadamente sobre questões que ainda estão submetidas à jurisdição da Corte". A Abep informou, em nota, que "o questionamento está relacionado às pesquisas telefônicas computadorizadas porque não têm amostra. As pesquisas telefônicas com entrevistador, por sua vez, têm problema de cobertura, e não de amostragem".
Os três tipos de coleta
Domicílio: é o caso em que os entrevistadores vão até as casas das pessoas para aplicar o questionário. Para se obter amostragem representativa, neste modelo, é preciso visitar periferias e bairros de classe média e nobres. Este modelo é chamado face a face, quando entrevistador e entrevistado conversam pessoalmente.
Ponto de fluxo: o entrevistador percorre em regiões de grande circulação de pessoas nas cidades, abordando eleitores nas ruas e parques, por exemplo. Este modelo também é chamado face a face, com entrevistador e entrevistado conversando pessoalmente.
Telefone: o modelo mais utilizado usa pesquisa robotizada por telefone, quando um software dispara ligações para toda uma região ou país, transmitindo as perguntas do questionário via áudio gravado. O entrevistado responde pressionando os números do teclado. Também existe a possibilidade de um pesquisador humano telefonar para domicílios em busca de pessoas que se encaixem em perfis de entrevistados desejados.
Como é no mundo
Brasil: a única restrição, no dia da eleição, é quanto ao horário de publicação das pesquisas: elas devem ser divulgadas após o horário de encerramento da votação no país. Afora isso, podem ser publicadas a qualquer tempo nos dias anteriores, inclusive na véspera.
Estados Unidos: não há restrição para a publicação de pesquisas. Elas podem ser difundidas em qualquer dia durante o período de eleição. A divulgação de novos números costuma ser praticamente diária.
Itália: existe restrição. No país, é proibido publicar pesquisas nas duas semanas que antecedem a votação.
França: há veto. Não é permitida a publicação de pesquisas de intenção de voto nas 48 horas que antecedem o pleito.