Sem debater o assunto com a comunidade e por unanimidade, os vereadores de Caxias do Sul aprovaram um reajuste de quase 28% no salário dos parlamentares a partir de 2025, no último dia do ano legislativo, realizado na quinta-feira (14). O projeto também instituiu a criação do 13º salário, com subsídio diferenciado para o presidente da Casa na próxima legislatura.
Chama a atenção, e também gera questionamentos da comunidade, o índice e o pagamento do 13º aos vereadores. A pauta da sessão extraordinária foi enviada a imprensa às 18h30min de quinta. A reportagem questionou a presidência da Câmara e os líderes de bancada sobre o aumento aos vereadores. Os parlamentares argumentam que não se trata de um aumento, e sim de reposição inflacionária. Segundo eles, desde 2017 não havia reajuste de inflação. Ao mesmo tempo, alegam que não se trata do próprio salário, uma vez que entrará em vigor somente para a próxima legislatura.
O presidente da Câmara de Vereadores, José Dambrós (PSB), afirma que o tema foi debatido ao longo do ano entre os parlamentares. Ele, como presidente, não participa da votação, mas garante que, se precisasse votar, teria sido favorável. Questionado sobre o motivo de os parlamentares votarem o projeto apenas na última sessão, Dambrós afirmou que poderia ter colocado em pauta em 2024, mas que os líderes de bancadas optaram por colocar na pauta ainda em 2023. No entanto, ele não detalha por que não debateram o assunto ao longo das sessões ordinárias do ano parlamentar.
O que dizem o presidente e líderes de bancadas
José Dambrós - Presidente da Câmara de Vereadores
Por que votou a favor?
— O vereador é servidor também, e isso vem se discutindo no decorrer do ano, é a unanimidade dos vereadores. Quer dizer, o servidor recebeu a inflação e o vereador, não? Então, é uma questão de dignidade, por tudo que se trabalha. É para a próxima legislatura e a sociedade decide. Eu estou muito tranquilo, a mesa colocou, é uma decisão de todos e se tivesse que votar, eu votaria sim também. Porque o 13º (salário)? O servidor recebe também, é para 2025, então a sociedade que decida se reelege ou não reelege (os atuais vereadores). Esse é o propósito. Nós temos a quantidade de habitantes para colocar 25 vereadores. Pela lei deveria ser 25. Eu não coloquei, deixei os 23. Compara com Canoas, com outras cidades, o salário do vereador, tudo aquilo que se produz, tudo aquilo que se trabalha. Não! Vamos dar dignidade. Então é uma questão de justiça, uma reparação àquilo que os servidores receberam. É unanimidade, e colocamos um percentual a mais para o presidente, que está lá o CPF dele, que assina por tudo.
O presidente ressalta que o debate ocorreu durante todo o ano entre os vereadores:
—Nós conversamos sobre o nosso salário, comparando com o de muitas outras cidades. A gente conversou com todos os vereadores para que para a próxima legislatura, nós colocássemos as diferenças que não foram repassadas e que os servidores receberam. Várias bancadas fizeram cálculos e aí a gente percebe, por exemplo, que os servidores tiveram todo o índice inflacionário de 2017 e 2021, quer dizer, todos os anos, e o vereador não recebeu. Então é uma questão de justiça, é uma questão de dignidade.
Juliano Valim - Líder de bancada do PSD
Por que votou a favor?
—Na verdade, foi somente um reajuste, não foi um aumento de salário. E, para começar, não é para essa legislatura, é para a de 2025, eu nem sei se vou ser vereador. Todo trabalhador tem direito a 13º (salário), férias, fundo de garantia. E, se for analisar, todo trabalhador que trabalha, independente do setor que for, tem esses direitos, todo sindicato defende o direito do cidadão. Então, eu acredito que não foi votado nada que não seja um direito de qualquer trabalhador da sociedade, isso está na Constituição brasileira.
Sobre o motivo de não ter sido debatido, disse que não tem o que se manifestar:
—Nessa parte eu não tenho nada a me expor, não tenho nada a declarar, é reajuste.
Gilfredo de Camillis - Líder de bancada do PSB
Por que votou a favor?
—Foi unanimidade, é uma recuperação, uma perda, não é aumento. Então, eu acho que é justo. Eu acho que todos têm direito a recuperação, e também acho que os colegas vereadores têm direito.
Camilis afirmou que o projeto chegou recentemente a ele.
—Não sei, chegou para a gente há poucos dias para a gente conversar. Não sei dizer por que não veio antes.
Marisol Santos - Líder de bancada do PSDB
Por que votou a favor?
—Entendemos que o 13º (salário) é um direito de todos os trabalhadores, e não seria diferente para o Legislativo. E não é um aumento, entendemos que é uma reposição, que todos os servidores foram recebendo ao longo dos anos, mas houve um valor fixado para os vereadores e isso foi ficando defasado. O que eu acredito é que, tanto o 13º salário como a reposição da inflação, é dos anos em que ficou o salário congelado e são necessários. Não é um aumento, mas a reposição desse período, que todos os servidores foram recebendo ao longo dos anos e como ficou por tanto tempo esse subsídio congelado, acabou ficando nesse cálculo de 27,93%. A Câmara de Vereadores de Caxias é muito enxuta, com poucos servidores inclusive, e com um trabalho muito efetivo dos vereadores, e não há, ao contrário do que a maior parte das pessoas pensa, benefícios como vale-alimentação, plano de saúde, auxílio-creche e auxílio-combustível. Então, para os vereadores de Caxias do Sul, que trabalham durante toda a semana e não apenas nos dias de sessão, entendemos que tem que ter o que é justo. E, a questão do 13º eu acho que sempre foi uma unanimidade, que é um direito de todo trabalhador, e não tem porque ser diferente dos legisladores.
Segundo a líder dos tucanos na Câmara de Caxias, o debate é antigo no Legislativo.
—Eu acredito que o debate sempre aconteceu aqui na Casa. Não entendo que esse debate devesse ser feito com toda a comunidade, poderia em algum momento talvez, mas acho que é um debate que vem acontecendo e que não é dessa legislatura. Aqui, internamente, discutimos muito isso. O que precisamos fazer é que as pessoas compreendam que quando se fala em uma reposição, que o salário vai mudar, existe obviamente um conceito de que é algo muito ruim, mas a gente precisa compreender que é um direito. Quando a gente deixa muito tempo de fazer os reajustes necessários, quando acontece um vai ter que ser um pouco maior. Então, precisamos entender que deveríamos seguir o fluxo de reposição como se faz para os servidores públicos municipais, os servidores da Câmara recebem isso anualmente, e os vereadores também deveriam.
Ricardo Zanchin - Líder do Novo
Por que votou a favor?
—Não foi aumento real, foi reposição inflacionária. Esse reajuste não é para nós, é só a partir de 2025, nenhum vereador que está aqui vai ganhar isso, é só para 2025, para a outra eleição. Terceiro tópico, está dentro da Constituição o valor, foi feita uma equiparação com outras Câmaras, e o valor (de Caxias) estava bem abaixo.
Zanchin disse que foram feitos estudos com base em outras Câmaras.
—Ele foi debatido em comissões, em reuniões. Foi feito um estudo técnico, pesquisas de como é a equiparação entre outras Câmaras. Então, isso foi sim amplamente debatido.
Rafael Bueno - Líder do PDT
Por que votou a favor?
—Primeiro que não houve aumento, mas reposição da inflação sem correção efetiva de uma década. Estamos falando a segunda maior Câmara de Vereadores do Rio Grande do Sul e a 33ª do Brasil. Nossa Câmara é enxuta, com apenas dois assessores (por vereador) e com muito trabalho exclusivo diariamente. (O 13º salário) é um direito constitucional. Não temos férias, auxílios-combustível, celular, gabinete, nem creche.
Bueno disse que não foi feito nada "ilegal".
—Não foi feito nada na calada da noite e muito menos nada ilegal.
Estela Balardin - Líder do PT
Por que votou a favor?
— Quanto ao salário dos vereadores, ocorre que votamos a reposição da inflação de anos acumulados em que não houve. Desde 2017 não havia reajuste de inflação no caso dos vereadores. Muitas cidades menores, por exemplo, tinham salários de vereadores maior do que Caxias. Nesse sentido foi votada a reposição, que repito, diz respeito a reposição de inflação de anos em que não houve reajuste. Se a Câmara tivesse votado anualmente a reposição, não chegaria nessa porcentagem acumulada. Como o salário estava congelado fazia vários anos, os números eram estes. Quanto ao 13º, as demais casas legislativas possuem, assim como todo trabalhador com carteira assinada. Entendemos, nesse sentido, que o 13° não seria um privilégio, uma vez que outras casas e demais trabalhadores também possuem.
Estela disse que não ocorreu debate por ser um "consenso".
—Não houve debate nesse projeto pois havia consenso. Foi um projeto que os 22 vereadores votaram a favor. E, normalmente, há mais debate quando há alguma divergência sobre o projeto. Então, como esse projeto foi um projeto onde os 22 vereadores foram favoráveis, não houve nenhum debate.
Renato Oliveira - Líder do PCdoB
Por que votou a favor?
— Foi feita uma reunião no dia anterior, que eles iam colocar na pauta o projeto. É o mesmo índice que os servidores ganharam nesse período. Por isso que foi chegado a esses valores. Esse reajuste é para a próxima legislatura, e acontece em todos os parlamentos, se tu for ver na Câmara Federal, ou na Assembleia, também acontecem as reposições. É feito depois de eleito, e nós estamos fazendo um ano antes das eleições. O índice está alto, mas é porque não teve a reposição nos anos anteriores. Se avaliar o teto, podíamos chegar a R$ 18 mil.
Sobre o debate, foi enfático ao dizer que:
— O debate poderia ter sido interessante.
Gladis Frizzo - Líder do MDB
Por que votou a favor?
— Não é aumento, é uma reposição salarial. Todo trabalhador tem direito porque a inflação "come" o salário. É uma reposição que está atrasada, que não foi feita em outros momentos, pela crise e agora foi tomada essa decisão entre todos os vereadores. As pessoas têm direito à reposição salarial. Caxias do Sul é a cidade onde o salário de um vereador é o mais baixo de toda a região. Bento Gonçalves é uma cidade bem menor que Caxias e o vereador ganha mais do que nós. A gente votou na reposição salarial, não foi aumento. Se fosse um aumento, eu seria contra. É uma reposição salarial.
Segundo Gladis, o assunto foi debatido em reuniões.
— Não teve um debate na sessão porque o assunto foi debatido em reuniões com todos os vereadores, e decidido por todos os vereadores.
Alexandre Bortoluz - Líder do PP
Por que votou a favor?
— A Câmara de Caxias do Sul é uma das mais enxutas do Estado em termos de salários e recursos humanos. Podemos citar outros exemplos, como Porto Alegre, que aprovou um aumento do subsídio de R$ 21,4 mil para R$ 34,9 mil, sendo o quarto maior entre as capitais brasileiras. Também podemos citar cidades menores que Caxias do Sul, onde o salário é igual ou até mesmo maior que Caxias, como Canoas que os vereadores ganham R$ 14.725,38. Lembrando que no período de 2017 a 2020 houve congelamento do reajuste inflacionário, não tendo nenhum tipo de aumento. E reforçando que este reajuste que estava congelado é válido para a próxima legislatura de 2025-2028, ou seja, nesta legislatura não terá nenhum tipo de aumento.
Bortoluz disse que foram feitas reuniões sobre o assunto.
— A mesa diretora convocou algumas reuniões internas entre os vereadores para debater sobre o assunto, inclusive com atas.
Sandro Fantinel - Líder do PL
Por que votou a favor?
— Tem cidades que, digamos, caberia umas cinco, seis vezes dentro de Caxias do Sul, onde os vereadores têm uma remuneração bem superior, têm uma responsabilidade bem menor que a nossa. Foi apresentado para nós que de 2002 até hoje os vereadores não tiveram a maior parte das reposições inflacionárias que o funcionalismo público teve. Então, todo o funcionalismo público, quando chega o final de ano, eles têm a reposição das perdas salariais referentes à inflação. E os vereadores, por demagogia política, tinham, digamos, um receio do que a população ia dizer. Se não tivesse tido essa demagogia política, nós não teríamos votado o que votamos ontem. Por exemplo, se fosse contado de 2002 até hoje, daria 61% de perdas referentes à inflação.
Ele ressalta que o assunto foi debatido intensamente no legislativo:
— A gente debateu muito entre todas as bancadas, e nós fomos convencidos através das contas que nos foram apresentadas no decorrer do tempo, e decidimos equilibrar esse valor. O que a sociedade precisa saber é que nós não damos aumento para nós, porque ninguém que está aqui sabe se vai se reeleger. Só a gente sabe na carne hoje como funciona, porque esse mês só eu tive que dar mais de R$ 1,5 mil para entidades para ajudar no Natal. Isso sem falar que durante o ano tem pessoas que vêm lá e dizem: "eu não tenho dinheiro para comprar o remédio", "eu não tenho dinheiro para pagar consulta", "eu não tenho isso, eu não tenho aquilo" e a gente ajuda. Por quê? Porque se a gente não ajuda, o pessoal sai do gabinete, vai para as redes sociais e diz:"ah, eu fui lá pedir ajuda para aquele vereador, ele não me ajudou". Então, o povo não sabe o que a gente gasta. Outra questão, os nossos CCs ganham mais que nós e os nossos assessores em proporção de responsabilidade ganham mais que nós. Mesmo com todo o respeito que eu tenho por eles, mas é a mesma coisa que o patrão ganhar menos que os empregados. Essa é a realidade da Câmara de Vereadores hoje. Então a gente teve que colocar pelo menos um equilíbrio, porque se a gente não fizesse esse equilíbrio ali, daqui a duas, três legislações, não ia mais ter ninguém concorrendo a vereador, porque não teria condições de se sustentar. O povo tem certeza só que não é verdade, que a gente tem 13º, que a gente tem férias, que a gente tem verba de gabinete, que a gente tem ajuda combustível e a gente não tem nada. A Câmara de Caxias não tem nada, não tem ajuda nenhuma, tem apenas o salário, e pensamos em fazer uma coisa justa. A gente teria direito a 61%, mas fizemos algo justo para a próximo legislação.
Elisandro Fiuza - Líder do Republicanos
Por que votou a favor?
— Não é aumento de salário, é reposição inflacionária. Desde de 2017 que os presidentes por uma questão ou outra não foi repassado aos devidos anos. A respeito do 13º, é bem simples: é uma coisa que todo trabalhador de carteira assinada tem, e nós, no cargo público, não inventamos. É apenas uma adequação em uma estrutura de uma Câmara Legislativa com mais de 500 mil habitantes, que é a segunda maior do Rio Grande do Sul. Todas as Câmaras em volta, e fazendo uma analogia, Bento Gonçalves tem subsídio, férias e 13º. Canoas tem 13º e subsídio maior que o nosso. Então quer dizer, não estamos inventando nada, e outras Câmaras de Vereadores, a grande parte tem esse subsídio. Na realidade, é uma adequação que há muitas legislaturas o pessoal já vinha vendo essa possibilidade, mas que nunca, por unanimidade, tinha esse entendimento.
Fiuza também afirmou que foram realizadas reuniões e com atas assinadas por todos os parlamentares.
— Foi uma situação que há muitos anos a Câmara de Caxias não se adequava, e a gente começou a perceber do ano passado para cá, várias Câmaras se adequando, se organizando. O que nós fizemos foi uma reposição de inflações que deixou de ser feita, outras Câmaras realmente tiveram aumentos. Se a gente fizer uma analogia de proporção de tamanho de cidade, de estrutura e de trabalho, num ponto de que a gente, com todo respeito, não pode enxergar somente o subsídio do bruto, tem que fazer do líquido. Não tem verba de gabinete, o vereador precisa estar de uma certa forma sempre alinhado, de estar fazendo sua prestação de contas com a comunidade, participando de eventos, e não existe nenhum custo promocional que ganha isso ou aquilo. É uma coisa ou outra que tu recebe um convite, e na maioria das vezes é (para) o presidente da Casa, os vereadores que participam têm que subsidiar tudo isso. Numa cidade desse tamanho, imagina quanto tu custeia de combustível para tu poder fazer todo esse trâmite e dar assistência de fato. Com todo respeito, não é tentar fazer alguma justificativa, mas é a responsabilidade de entender o trabalho que exerce. Eu sei que não é uma matéria que agrada as pessoas, mas aquele que está ali desempenhando esse papel público sabe que quando tem responsabilidade e trabalha, tem credibilidade, e as pessoas também sabem o quanto é difícil você fazer um trabalho não tendo, de fato, aquilo que é possível para atender a comunidade. E outra, foi uma questão de todos os vereadores construída, assinada em ata.
Velocino Uez - Líder do PRD
Por que votou a favor?
— Qual é o trabalhador que não recebe o 13º (salário)? Bom, se a população entende que vereador não é trabalhador, aí fica difícil para quem trabalha para o povo. 13º todo trabalhador tem direito, por isso votei a favor. A reposição dos 27% não é aumento, é reposição da perda ao longo dos anos. Quando fui subprefeito de Galópolis, lá na época do prefeito Alceu (Barbosa Velho), e congelou os novos salários, dois terços entrou na justiça e ganhou, eu não entrei na justiça. Nem para mim eu votei (agora), eu votei para aquilo que é justo de repor a inflação perdida ao longo desses anos. Eu nem pensei em mim, isso é para a próxima legislatura, é reposição das perdas da inflação. Agora, se achar que um vereador não é trabalhador, fica difícil. Todo trabalhador tem direito a 13º.
Uez ainda questionou se somente essa pauta merecia debate na Câmara.
— Olha o que fizemos em três dias. Uma mágoa minha, todos aqueles projetos bons que foram debatidos (nas sessões dessa semana), a PPP das escolinhas, ajuda de custo para cuidar de idosos, da Minha Casa Minha Vida, isso não conta nada para a população? Só isso (reajuste e 13º) tinha que debater? Eu sai da Câmara 22h30min, tem três dias que eu não almoço com a minha família, mas eu não estou reclamando, é do nosso trabalho. Eu não achei necessidade (de debate) porque naquele momento o que eu votei é ser justo. Todo trabalhador tem direito ao 13º, teve a perda da inflação. Então, com o passar do tempo tem que repor. Eu votei consciente em ser correto. Não é um aumento real, é reposição daquilo que foi perdido