A Comissão Processante da Câmara de Vereadores de Caxias do Sul emitiu parecer favorável à cassação do vereador Sandro Fantinel (sem partido), após falas preconceituosas contra baianos no plenário em 28 de fevereiro. O parecer não é a decisão final, mas serve como uma recomendação aos parlamentares, que têm autonomia para votar como quiserem. O relatório com a posição favorável à cassação foi encaminhado ao presidente da Casa, vereador Zé Dambrós (PSB), que irá definir a data da sessão em que o caso será votado. A expectativa é que esta votação ocorra na semana que vem.
— Vou reunir a Mesa e, provavelmente na próxima terça-feira (16), devemos chamar uma sessão extraordinária para votar o parecer — diz Dambrós, que deve se reunir com a Mesa Diretora da Câmara nesta sexta-feira (12) para confirmar a data da sessão.
No relatório, elaborado pelo relator, vereador Edi Carlos Pereira de Souza (PSB), a comissão argumenta que as falas de Fantinel evidenciam "de forma clara e ampla a manifestação de preconceito em relação ao povo nordestino". Além disso, segundo o texto, "ao desqualificar e desprezar a cultura destas pessoas e afirmar que os baianos não devem ser contratados, sem, ainda, repudiar aqueles que mantinham os trabalhadores em condições análoga a escravidão, o denunciado adotou uma conduta, no mínimo, racista, xenófoba e preconceituosa".
"Ao incitar os produtores da região a não contratar “aquela gente lá de cima”, referindo-se à procedência nacional dos trabalhadores, ao se referir depreciativamente a seus hábitos de higiene e saúde, ao estereotipar negativamente os hábitos culturais dos baianos, o denunciado ultrapassou consideravelmente os limites da crítica política legítima ou de uma expressão momentânea de emoção, e adentrou no campo ilícito da disseminação de discurso de ódio e desprezo, o que foi agravado pela ampla divulgação nas mídias tradicionais e na internet. É incontestável que a atitude do parlamentar não se enquadra na inviolabilidade de suas opiniões e palavras, uma vez que essa proteção não é absoluta e não abrange discursos que violem a Constituição Federal e os direitos humanos", diz o relatório.
No relatório, os vereadores da Comissão Processante afirmam que o discurso proferido por Fantinel manifestou preconceito de maneira explícita e abrangente, "não se restringindo a questões de cor ou raça, mas sim relacionado à origem nacional dos indivíduos provenientes de duas regiões específicas do país: o norte, nordeste e os baianos". Para os parlamentares, esta conduta configura uma "violação dos direitos fundamentais dos indivíduos-alvo, da coletividade e de todo um grupo geográfico".
"É indiscutível que tal manifestação não ocorreu de forma aleatória, foi motivada e teve como plano de fundo um triste episódio: o resgate dos trabalhadores baianos que trabalhavam na colheita da uva em condições análogas à escravidão no município de Bento Gonçalves. Ou seja, o denunciado injuriou e difamou os cidadãos a quem deveria bem representar", avalia o parecer.
Além disso, o relatório traz o parecer da comissão a respeito da denúncia contra Fantinel pelas manifestações do vereador em 17 de novembro de 2022 no Legislativo caxiense, quando afirmou que "um ministro do Supremo Tribunal participou de uma orgia com crianças fora do Brasil". Sobre esta acusação, o parecer recomenda o arquivamento "por se tratar de simples manifestação de reprodução de informação sem ter verificado a veracidade dos fatos, não sendo suficiente para aplicação da pena máxima de cassação do mandato".
16 votos para perder o mandato
Para Sandro Fantinel ser cassado, são necessários os votos favoráveis ao parecer pela cassação de dois terços da Câmara, ou seja, 16 dos 23 vereadores. Na sessão de julgamento, os vereadores poderão se manifestar pelo tempo máximo de 15 minutos cada um. Já Fantinel ou o seu procurador tem o prazo máximo de duas horas para realizar a defesa oral. Concluída a defesa, serão feitas votações nominais de acordo com a quantidade de infrações contidas na denúncia.
Neste caso, são quatro denúncias: duas pedem a cassação de Fantinel pelas manifestações contra baianos e foram acolhidas pela Comissão Processante. Uma pede que o caso das falas preconceituosas seja encaminhado à Comissão de Ética da Câmara, que a Comissão Processante entendeu pelo arquivamento, já que o processo de cassação aberto se sobrepõe ao pedido. E a quarta é referente à manifestação do vereador a respeito do ministro do STF — a comissão também pediu o arquivamento.
Concluído o julgamento, o presidente da Câmara informa o resultado e, se houver condenação, expedirá o decreto legislativo de cassação do mandato de vereador. Se o resultado da votação for pela absolvição, Dambrós determinará o arquivamento do processo. Em qualquer caso, o resultado é comunicado à Justiça Eleitoral.
O vereador é acusado de quebra de decoro parlamentar, após falas preconceituosas contra os baianos no plenário em 28 de fevereiro. Na ocasião, se referia aos trabalhadores resgatados em situação análoga a escravidão em Bento Gonçalves, quando sugeriu aos produtores da Serra que "não contratem mais aquela gente lá de cima", e disse dos baianos que "a única cultura que têm é viver na praia tocando tambor". O processo de cassação contra o vereador foi aberto em 2 de março. Pelas manifestações, Fantinel também se tornou réu pelo crime de racismo, após ser denunciado pelo Ministério Público no final de março.
"Resultado será justo"
Em nota, a defesa do vereador diz que Fantinel tem "absoluta certeza de que o julgamento ocorrerá de acordo com as Garantias Constitucionais e que o resultado será justo". Confira:
"A defesa do Vereador Fantinel, composta pelos Advogados Vinícius de Figueiredo, Rodrigo de Oliveira Vieira e Moser Copetti de Gois informam que Sandro recebeu com serenidade a notícia da conclusão do relatório final. O Vereador tem absoluta certeza de que o julgamento ocorrerá de acordo com as Garantias Constitucionais e que o resultado será justo, esclarecendo que já se desculpou incontáveis vezes e que a cassação do mandato é uma resposta extrema e desproporcional."