O transporte público é um tema de primordial importância não só social como politicamente. Foi elemento essencial na campanha que elegeu o ex-prefeito Daniel Guerra, em 2016, quando na época prometeu mudar a empresa responsável pelo serviço e acabar com o monopólio.
Guerra teve seu governo interrompido, mas logo antes de ser cassado encaminhava o cumprimento de sua promessa, ao apresentar o polêmico edital que dividia a cidade em duas bacias. Logo após o impeachment, o governo que assumiu, sob comando de Flávio Cassina (PTB), suspendeu a licitação e prometeu lançar nova concorrência no ano passado, o que não ocorreu. Coube ao Governo Adiló encaminhar o processo, que no dia 16 de abril definiu novamente a manutenção da Visate como a prestadora do serviço. O fato repercutiu de forma polêmica, assim como a declaração prévia de Adiló que afirmou dificuldade em conseguir cumprir a promessa de reduzir o preço da passagem para R$ 3,50, que fundamentou sua campanha no ano passado.
O Pioneiro procurou o prefeito para repercutir o futuro do transporte público de Caxias e o que representou a proposta única apresentada pela Visate no certame que definiu a concessão. Adiló só aceitou responder as perguntas via WhatsApp.
Confira a entrevista.
O senhor destacava que R$ 4,75 era o teto da proposição tarifária (prevista no edital), mas não necessariamente seria o valor apresentado pelas concorrentes. Acabou sendo. Isso dificulta ainda mais a tentativa para baratear e alcançar os R$ 3,50?
Se tivéssemos outros interessados, acredito que teríamos oferta menor. Mas vamos buscar, através de várias ações, reduzir o preço da tarifa. Sobre o valor no teto, é preciso ressaltar que, neste ano, foram aplicados seis aumentos de combustível, além de outros nos insumos. O preço atual de R$ 4,65 é calculado com base em indicadores de janeiro de 2020. Nestes 16 meses, os preços dos insumos que compõem os cálculos sofreram vários reajustes. Somente, agora, pela licitação se alterou o valor.
Por quanto tempo vai permanecer 4,75? Em janeiro de 2022 deve ficar mais cara?
No próximo janeiro, teremos reavaliação dos custos. Mas não dá para prever o cálculo. A planilha obedece critérios técnicos, e não políticos ou de palpites. Ao contrário do que ocorreu nos últimos anos, vamos tentar fazer algo diferente, que será buscar um valor para baixo, e não para cima. É nisto que vamos trabalhar arduamente a partir de agora e acreditamos que seja possível. Basta implementar algumas mudanças em alguns setores, mas que ainda não pretendemos tornar públicos.
A Visate foi a única a apresentar proposta. Frustrou a falta de concorrência?
Pela ampla divulgação que fizemos sobre o edital, esperávamos mais participantes. Frustrou pela falta de concorrência.
Acha que isso abala politicamente de algum modo o governo? Considerando o peso político que esse tema exerce no município.
A licitação foi a mais transparente possível, elaborada por técnicos da Secretaria de Trânsito, Transportes e Mobilidade, e fiscalizada pelo Tribunal de Contas. Não é um assunto político.
O senhor diz que a empresa sofre muito com o contexto de redução de passageiros e que o preço da passagem está defasado, considerando todo o contexto. Por que acha então que ela se dispôs a assumir a concessão do serviço novamente, se é tão prejudicada?
A redução de passageiros é inquestionável. A mesma estrutura transportava 300 mil passageiros por dia, em 2010, e hoje transporta 70 mil por dia. Não precisa ser especialista para fazer esta análise. A empresa está operando com ociosidade superior na faixa de 50%. É importante questionar o que a Visate faria com toda a estrutura que tem caso não seguisse na oferta do serviço. Não seria muito mais oneroso um passivo como este parado?
Acha que o município acabou refém do processo indenizatório movido pela empresa?
O processo não faz parte do edital e não foi julgado ainda.
Pretende tentar resolver essa situação antes que se torne um novo Caso Magnabosco? De que forma?
É um assunto a ser tratado pela Procuradoria Geral do Município, mas evidente que gostaríamos que fosse resolvido.
O benefício de isenção para a empresa e o corte de benefícios para passageiros já foram sancionados no início do governo. Quanto tempo mais para isso se reverter em benefício para o usuário?
Os benefícios já estão incluídos no cálculo tarifário no início do ano. Foi, inclusive, uma das determinações do Tribunal de Contas. Só não alterou o valor máximo porque foram incluídos os reajustes de combustíveis e de outros insumos.
Considerando que a mesma empresa vai continuar o serviço, o senhor já articula com ela o possível barateamento? O que avançou nesse sentido?
Teremos reunião com a concessionária na próxima semana (esta semana) e já vamos tratar de alternativas para o barateamento dos valores da tarifa.
De acordo com o advogado da empresa, que concedeu entrevista ao Pioneiro, "pelo nível das exigências no edital, seria difícil outra empresa concorrer". A elaboração do edital dificultou o acesso de outras empresas?
O edital foi elaborado para resguardar a transparência e os interesses dos caxienses e não para facilitar ou dificultar a participação desta ou daquela empresa. A manifestação do advogado dá mais a impressão de querer valorizar a concessionária. No próprio edital, oferecemos quatro áreas no município com avaliação de custo venal e, inclusive, a possibilidade de aluguel de área de instalações para evitar aporte inicial de recursos elevado por parte de outras empresas. Também oportunizamos a formação de consórcios, investimos nisto porque se considerava que uma empresa sozinha não teria condições de assumir os custos de instalação. Mesmo assim não tivemos a concorrência esperada.
Outros municípios, como Porto Alegre e São Paulo, estudam ou já aplicam subsídios para manter a tarifa em níveis módicos e competitivos. Sua administração pensa que é possível implementar subsídios e assim garantir tarifa menor? Ou essa discussão sobre subsídio no transporte coletivo não tem futuro?
Nós estamos pensando em várias alternativas. Pra ver que o problema é geral.