O segundo candidato da série de entrevistas da Rádio Gaúcha Serra com os postulantes ao cargo de prefeito de Caxias do Sul foi Edson Néspolo (PDT). Em 20 minutos, o ex-presidente da Festa da Uva e que também concorreu na última eleição ao Executivo caxiense respondeu perguntas sobre a pandemia de coronavírus, projetos para o turismo e a fusão e criação de secretárias, caso eleito. Néspolo também falou sobre o recebimento de recursos do fundo partidário para a campanha e as lições que ficaram do pleito de 2016.
A entrevista foi ao ar durante o programa Gaúcha Atualidade na manhã desta terça-feira (27) e foi conduzida pelos jornalistas Tales Armiliato e Babiana Mugnol. Confira:
Sua ação, se chegar à prefeitura, em relação à pandemia?
A pandemia nos ensinou várias questões, valorizar mais família, valorizar amigos, valorizar vizinhos. Obviamente que o poder público tem que fazer a sua parte. Eu acredito muito no trabalho preventivo, saúde da família, essas questões que a pandemia também nos ensinou, que as pessoas ficaram um longo tempo sem muitas vezes poder ter acesso a médicos, e a gente sabe o quanto é importante a parte preventiva, o quanto o simples contato de um médico tem todo um cunho psicológico. Então, quanto mais a gente puder deixar o médico mais próximo da família, isso tem um resultado fantástico. Mas um assunto que vai certamente remeter a várias respostas é um dever de casa que é urgente da prefeitura fazer que é investir em tecnologias. Isso vai trazer um benefício enorme para a área da saúde. Nós estamos hoje, infelizmente, ainda marcando consulta com as pessoas indo às seis horas da manhã. Isso é uma coisa que ficou no passado. Infelizmente, a gente ainda tem no dia a dia, mas ela tem que ser marcada via tecnologia, via celular. Essas questões são básicas. E no nosso programa a gente não tem uma quantidade enorme de construir prédios novos. A gente tem que ocupar prédios que estão obsoletos, principalmente de faculdades, de universidades que estão desativadas, e trabalhar mais a questão de UPAs. Hoje a UPA tem repasse do governo federal, e isso tem que ser investido. São práticas que a pandemia nos ensinou, principalmente para a área da saúde.
Muito se fala em desenvolver uma nova matriz de negócios em Caxias. Se fala nessa questão de tecnologia e se fala também em turismo. O senhor foi presidente da Festa da Uva, trabalhou em Gramado na autarquia responsável pelo Natal Luz. Como fazer diferente? Como diversificar de fato e não ficar só no discurso?
Primeiro, falar de perdas. Há 50 anos, a referência de turismo na Serra era Caxias. O charme da Serra Gaúcha não era Gramado, era Ana Rech. Então, nós tivemos perdas enormes. Eu digo que cada prefeito ao longo da sua história fez muito por Caxias. Não estou aqui para criticar ninguém, agora nós perdemos uma das questões que era referência nossa. Nós vamos continuar tendo o metalmecânico como nosso carro-forte? Nós temos que investir na indústria do plástico, na questão do têxtil, principalmente com tecnologia, por isso que eu falo de novo, inovação em tecnologia é uma coisa que também se perdeu na prefeitura. Agora, o resgate do turismo não pressupõe apenas o turismo. O turismo é muito feito em cima da cultura. São atividades culturais. Nós temos isso, nós temos uma cultura maravilhosa, nós temos uma gastronomia riquíssima, temos paisagens naturais belíssimas, temos vinho, espumante e o suco. Agora, tem que integrar isso. Como vamos pensar em turismo com as entradas de Caxias viradas em mato, capoeira? O primeiro gesto meu, como prefeito em janeiro, vai ser ir no horto, resgatar o horto e plantar flor. A nossa cidade não pode continuar com as entradas que estão ai. Esses roteiros que se perderam, é através de construção coletiva. Cada comunidade tem o seu pertencimento. Inclusive Ana Rech, por exemplo, já tem um trabalho feito. Tem que planejar em conjunto com a prefeitura esse resgate. Galópolis tem uma questão maravilhosa para resgatar no têxtil e voltado para o turismo. A questão de Forqueta, por exemplo, tem toda uma dinâmica voltada principalmente ao vinho e à colonização italiana, que não é difícil resgatar. Aquela região de Santa Lúcia, de Fazenda Souza, de Vila Oliva, de Vila Seca, eles vão ter no futuro, além de, possivelmente o aeroporto, a questão do turismo religioso, tanto do Caminho de Caravaggio quanto o Padre João Schiavo. Agora chegou a hora de planejar o turismo, de pensar o futuro, integrar comunidade. Isso vai ser feito com muita dinâmica, com envolvimento das comunidades. Não falei de Criúva, Criúva tem toda a parte de turismo de aventura, ecológico e o turismo rural que é essa nossa diversidade. Resgate da Maesa, Festa da Uva, tem que estar tudo integrado dentro do programa de turismo, principalmente Maesa e Festa da Uva faremos com parcerias público-privadas.
Existe nesta campanha uma divisão de candidaturas e mesmo dos aliados de antigos governos, que estiveram com o senhor na eleição de 2016 e que votaram pelo impeachment de Daniel Guerra. É uma estratégia para tentar garantir que um grupo vá para o segundo turno, até porque o eleitor é contra grandes coligações? O senhor teria um candidato para enfrentar no segundo turno?
Primeiro, o meu respeito a todos e, principalmente, eu acho que a nossa campanha está crescendo muito, temos projetos, temos propostas, não estamos falando ao vento, estamos vendo o que vamos fazer e como vamos fazer. Essa divisão tem um lado muito bom. Não foi porque um quis e outro não quis. Cada um acho que tem o seu espaço e mais que justo que cada partido, cada coligação busque seu espaço. Quando falo que o nosso perfil de secretariado vai mudar completamente aquilo que foi a história, ou seja, na situação que Caxias está hoje, nós não podemos mais pensar em fazer "ajeitamento" de questões. Eu não digo também que cem por cento do meu secretariado vai ser com perfil meu e do Edson e da nossa equipe.
Com isso, o senhor quer dizer que, se for ao segundo turno, não terá uma grande coligação de partidos, justamente para não ter que acomodar tantos cargos de confiança?
Exatamente. Até porque o segundo turno será muito rápido. Obviamente que a gente não pode pensar de não ter uma certa segurança na Câmara de Vereadores. Então, obviamente que essa composição deverá remeter também a uma sustentabilidade de governo. Agora, nossa negociação não... e nem vai dar tempo de fazer no segundo turno. Mas o que quero completar assim, essa questão de colocar secretário que fica esperando caixa único da prefeitura dar recurso para ele viabilizar os seus projetos na sua pasta, isso tem que acabar. O perfil do nosso secretariado tem que ser um perfil empreendedor, ele tem que saber elaborar um projeto e saber como vai captar o recurso. Essa que é a mudança. Ele tem que saber a dificuldade de gestionar isso. Então, hoje dinheiro e recurso têm muito, e é isso que nos anima a ser prefeito de Caxias, porque nós temos no governo federal muito recurso. Nós temos fundos internacionais, mas tem que ter projeto. As parcerias público-privadas que são aprovadas há muitos anos, em Caxias não têm ainda. Eu trabalhei muito com parcerias público-privadas nos últimos anos. A Maesa, a Festa da Uva, o novo aterro sanitário, a gente quer fazer uma usina de tratamento de lixo, isso aí são parcerias público-privadas. Estou falando isso todos os dias para deixar bem entendido. Agora, o perfil do secretariado vai nos dar essa condição de a gente definir esse perfil que estamos falando agora. O secretário tem que entender essa dinâmica para elaborar o projeto e saber como vai buscar o recurso.
O senhor fala em unir secretarias, mas também consta em seu plano de governo a criação de uma Secretaria de Inovação e Tecnologia. Não seria um aumento de funcionários?
Não, porque uma secretaria, por exemplo, que eu vou deixar bem claro que vai ser cortada é Receita e Despesas (as secretarias existentes hoje são Fazenda e Receita Municipal). Não existe duas secretarias, uma para captar e outra para gastar. Será uma só, nós vamos agrupar. Secretaria da Economia ou Secretaria da Fazenda e era isso. De duas, vamos fazer uma só. Estamos avaliando a Secretaria de Planejamento e Urbanismo, eu acho que estão sobrepostas, vai projeto para um lado, papel para outro. Nós estamos estudando firmemente de Urbanismo e Planejamento ser uma secretaria só. Secretaria de Governo tem que ser extinta essa palavra. Para mandar projeto para a Câmara não precisa uma secretaria. Vai para dentro do Gabinete ou para dentro da Procuradoria. Eu estou falando já de três. Mas a questão da inovação e da tecnologia, o problema que nós temos hoje em Caxias, nós temos indústrias de ponta, temos indústrias que exportam para o mundo inteiro, para países desenvolvidos com tecnologia de última geração. O problema, eu repito, e cada prefeito ao longo dos últimos 30 anos fez a sua parte. Fizeram obras, fizeram coisas importantes, mas uma coisa que a prefeitura parou demais foi a questão de tecnologia. Ela não se atualizou e isso é fundamental, isso vai girar toda a roda. Isso não é só procedimento interno, isso é dar condição para o funcionário público ter o que hoje não tem acesso. Olha a discrepância de alunos da escola particular e da escola pública. O aluno da particular estudando em casa nos últimos meses e o público nada, porque o professor não tem ferramenta para fazer o ensino chegar para o aluno [nota da editoria*: o parecer número 8 do Conselho Municipal de Educação, de 5 de maio de 2020, regra o ensino remoto. Foi homologado pelo prefeito Flávio Cassina e publicado em edição extra do Diário Oficial do Município]. Ah, mas o aluno da pública não tem tecnologia para o ensino chegar na casa dele. Por mais pobre, eu tenho andado muito pelo São Vicente, que é o meu bairro de referência, que é onde eu comecei a trabalhar, são pessoas carentes, mas no mínimo um celular tem na casa de cada um. O que falta é integrar isso ai. Inovação e tecnologia é fundamental, vai fazer girar a prefeitura, otimizar prazos, essa burocracia para ter acesso a alvará, para aprovar algum projeto, para ter uma guia, uma taxa de ISS, de IPTU, de ITBI. Essa questão tem que ser mais ágil.
O senhor recebeu o maior valor de fundo partidário até agora, R$ 400 mil. Isso acaba despertando algumas críticas. Como fazer economia depois se agora na campanha já tem esse valor elevado?
Não estou entendendo, a tua pergunta não tem relação. Por quê? Porque o fundo partidário não fui eu que criei, foi uma lei. Ah, tu concorda ou não concorda? É outra questão. É uma lei. Quando a gente vive em uma democracia é para respeitar a decisão da maioria. Se a regra do processo eleitoral foi essa, nós temos que nos adequar à lei. A lei diz que teria direito ao fundo partidário e que as candidaturas não poderiam pegar mais de empresas, de pessoas jurídicas, o que eu achei muito bom, não poder mais nenhuma candidatura ficar atrelada a empresas ou núcleos econômicos. A gente viu o que aconteceu há 15, 20 anos, o que aconteceu na Lava-Jato, no Mensalão, quando empresas subsidiavam candidaturas. Tem o lado bom, mas tem o lado ruim. Nós conseguimos esse valor, o que para a nossa candidatura foi muito bom. Ah, foi muito. Bom, cada um faz a sua avaliação. Nós estamos cumprindo a legislação. A legislação diz que o financiamento das campanhas é via partidos. Eu acho, inclusive, que nem eleição tinha que ter esse ano, já me manifestei sobre isso. Acho que o recurso deveria ser para a pandemia. Agora, à medida que tem regra e a regra estabelece que o financiamento é através desse recurso... Mas não foi o Néspolo que recebeu, eu sei que não foram todos os candidatos que receberam e respeito também quem não quis receber.
Mas na visão do eleitor, o senhor não acha que fica ruim diante de um momento tão ruim para as arrecadações dos municípios?
Sem dúvida, mas não fui eu que fiz a regra. Eu me manifestei antes de começar o processo, achei que não tinha que ter eleição esse ano.
O senhor não fez a regra, mas está usufruindo dela.
Então volta-se ao passado, de receber de empresas. Não consigo entender como faço campanha, então?
A questão não é a regra de uso de dinheiro público ou uso de dinheiro privado, a questão é o valor que o senhor está utilizando na comparação com outras candidaturas, mas o senhor está dentro da regra do jogo. Não estamos questionando isso. Queria aproveitar e questionar também sobre quanto faz diferença o gasto de campanha. Na última eleição, o senhor acabou indo ao segundo turno, mas não venceu. Tem algo que o senhor se arrepende? Algum erro que o senhor gostaria de fazer diferente agora?
Tem uma lição que ficou da última campanha, quando perdi a eleição, a Rádio Gaúcha, o Jornal Pioneiro, outras rádios queriam que eu avaliasse os 15 dias do Governo Guerra, 30 dias, seis meses, um ano. Nunca obtiveram uma entrevista para eu avaliar por que eu perdi a eleição. Eu fiz aquilo que é fundamental neste momento para Caxias. Eu deixei e dei a oportunidade do prefeito administrar em paz, porque o povo de Caxias escolheu o Daniel (Guerra). Claro que em um processo eleitoral a gente comete erros, então quero dizer que os erros foram internos, os erros foram de aprendizagem, de procedimentos, de avaliações. E a gente também aprende com esses erros. Mas o fundamental agora é que sirva de exemplo que a eleição quando terminar, existe uma questão que está acima dessas candidaturas, existe uma questão chamada Caxias do Sul. Nós temos que sair em paz dessa eleição. Eu fiz isso na última quando perdi. Caxias precisa ter tempo, ter paz. Quem administrar, o povo vai dizer: administra e seja feliz e contem conosco. E quem ganhar vai ter que ter esse poder de trabalhar a unidade de Caxias, que não tem vencidos e vencedores. Como eu fiz isso há quatro anos, me dá uma condição boa agora de retomada, de buscar parcerias, de buscar pessoas qualificadas em outras candidaturas, enfim, Caxias está acima disso. Foi essa lição que ficou do último processo eleitoral.
O senhor é professor, mas no governo do PDT, que comandou Caxias do Sul, existia a promessa da construção de uma grande escola em turno integral que não saiu do papel. Como será, se o senhor for eleito, a possibilidade de um professor à frente gestão pública de Caxias?
Foram feitas várias escolas, tenho muito orgulho e principalmente o que foi empregado de dinheiro na última administração nossa, principalmente em nível de saneamento, tratamento de esgoto. Talvez poucos vão lembrar o que foi feito nos corredores de ônibus que enrugavam, a cada seis meses tinha que dar manutenção no asfalto. Hoje temos corredores tanto na Pinheiro, na Sinimbu, na Moreira César. Muitas vezes a gente não lembra. Bom, não se fez tudo. Mas eu acho que tem uma coisa, pode ver que no meu projeto não tem a criação de 10 escolas, mas uma escola que eu acho que é fundamental é a do Campos da Serra, até porque se fez lá um grande projeto habitacional, tem hoje 10 mil pessoas e não tem escola, os alunos estão sendo levados via transporte para outra área da cidade, no Jardelino Ramos. Ali é uma escola que vamos perseguir desde o primeiro dia e eu sonho que seja uma escola nesses moldes.
* Sempre que for oportuno, para ampliar a contextualização de pontos tratados nas entrevistas dos candidatos, o Pioneiro introduzirá no texto uma breve nota da editoria.
Ouça a entrevista: