Pioneiro, Gaúcha Serra e pioneiro.com começam a mostrar, em oito reportagens, os temas que são as maiores preocupações de eleitores entrevistados em pesquisa, para merecer atenção e proposta desde já dos 11 candidatos a prefeito de Caxias do Sul. Para 14% dos que responderam ao levantamento, infraestrutura viária é tema que está mencionado entre as três primeiras preocupações.
Uma via esburacada ou em condições inadequadas de trafegabilidade é apenas um problema consequente, que pode ser resultado de diferentes situações que o precedem.
— O problema é muito maior do que os buracos nas vias, que sempre voltam a aparecer, ou a quantidade de pistas para os carros, que nunca é suficiente para o crescente número de automóveis. O problema é de planejamento e mostra uma necessidade de mudança de prioridades —afirma a arquiteta, urbanista e professora do Centro Universitário da Serra Gaúcha (FSG), Lizia de Zorzi.
O planejamento urbano é essencial não só para determinar a melhor dinâmica e organização de fluxo do trânsito, mas também para desafogar trechos viários muitas vezes sobrecarregados e que, devido a isso, geralmente são os locais mais propensos a falhas viárias.
Ainda mais profundo, embora aparentemente não relacionado, há um problema de origem no aspecto mais crítico da infraestrutura viária, encontrada nos bairros e loteamentos. Ocorre que muitas comunidade surgiram a partir de ocupações de áreas naturalmente impróprias para a mobilidade. Em muitos dos casos, localidades como Monte Carmelo acabam tendo pouco auxílio do poder público nesse sentido. Com a maioria das suas ruas sequer tem pavimentação, instala-se ali um problema já consolidado. Por outro lado, loteamentos não param de se expandir em outros locais da cidade, tornando cada vez maior o contingente de comunidades desassistidas.
— Nos loteamentos consolidados, é preciso injetar investimento público. Nos que ainda estão se ampliando, não precisa de dinheiro público, pois automaticamente vai se fazendo (o que precisa). Pode-se alegar: 'Ah, mas o poder público não tem dinheiro.' Mas planejamento não precisa de dinheiro — avalia o doutor em Direito e professor da Universidade de Caxias do Sul (UCS), Adir Rech.
Para desenhar o cenário de Caxias do Sul e apontar possíveis soluções, os dois especialistas falaram sobre o tema. Confira os destaques:
Diagnósticos e caminhos possíveis
Lizia de Moraes de Zorzi - Arquiteta, urbanista, mestre em Planejamento Urbano e Regional, professora no curso de Arquitetura e Urbanismo no Centro Universitário da Serra Gaúcha (FSG)
Plano de mobilidade
"A infraestrutura viária da cidade é bastante ruim. Não é satisfatória para quem perde horas todos os dias dentro de um automóvel em horário de pico, nem para quem anda nos ônibus lotados e com horários restritos, nem para que não consegue pegar um ônibus porque a infraestrutura não chega até perto da sua casa, nem para ciclistas que colocam a vida em risco e, menos ainda, para quem tenta circular a pé, nas calçadas estreitas e irregulares, quando elas existem. Esses problemas são decorrentes de decisões muitas vezes sem o adequado planejamento e feitas sem um plano de mobilidade. Pouco se avançou na cidade nesses aspectos nestas duas últimas décadas. Apenas no final de 2019, no Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado (Lei nº 589), trouxe a previsão de criação, até o final de 2021, de um Plano Diretor de Transportes e Mobilidade Urbana, com planos de acessibilidade, de pedestrianização e calçadas e plano cicloviário para Caxias do Sul."
Além do Centro
"É essencial que os instrumentos de planejamento como zoneamento e índices urbanísticos considerem as questões de mobilidade e infraestrutura viária, concentrando as pessoas onde há maior infraestrutura para atendê-las. No momento em que se permite a ocupação de áreas distantes do centro urbano e o espraiamento da cidade, há uma obrigação em levar infraestrutura. Por mais difícil ou dispendioso que seja, essa população não pode ser ainda mais prejudicada ou esquecida. Essa ocupação de áreas distantes do centro urbano, comum especialmente nos projetos de habitação de interesse social, tem um custo inicial barato pelo baixo valor do lote, mas elevado se considerarmos os valores de implantação de infraestrutura que demanda. Esse tipo de crescimento da cidade deve ser contido e evitado, priorizando o adensamento das áreas que já possuem infraestrutura, qualificando ela e promovendo uma mobilidade mais eficiente."
Reorganizar planejamento
"Não existe uma única solução para todas as situações. É necessário estudar as particularidades de cada situação, as características das vias e das ocupações, os usos, as principais origens e os principais destinos, as especificidades de cada população, etc. A partir destes levantamentos, com base em um bom diagnóstico, é possível a definição de um planejamento adequado. Essas soluções "tapa buraco" só agravam os problemas da cidade. A reorganização é essencial, e precisa começar com a revisão das prioridades."
Desestimular a cultura do carro
"A nossa estrutura viária sempre foi projetada pensando no automóvel. É possível observar, em nível mundial, que esse modelo está falido e precisa ser invertido. O próprio Código de Trânsito Brasileiro já traz como hierarquia de prioridade o pedestre, o ciclista, depois o transporte coletivo e por último o transporte individual. Quanto mais criarmos espaço para os veículos individuais, mais valorizamos e estimulamos esse modo de transporte, que deveria ser o último na lista das prioridades. Talvez a principal questão a ser levantada seja a necessidade de rever a "cultura do carro" e pensar a cidade com mais diversidade no trânsito. Diversas cidades que hoje são consideradas como referência também já passaram por esse tipo de mudança difícil."
Adir Rech - Doutor em Direito e professor da Universidade de Caxias do Sul (UCS)
Pensar macroestrutura
"Tínhamos núcleo central organizado desde a colonização, as ruas estavam todas esquematizadas, com quadriláteros, etc. A partir de determinado momento, a cidade se esparramou, sem nenhum planejamento. E aí precisamos retomar esse crescimento sem o planejamento (prévio). No passado, o que se fez foram as perimetrais. Que funcionam como macroestruturas viárias. O problema é que a cidade vai crescendo, se expandindo, com novas ruas, ruelas, becos, e sem estrutura macroviária. E o poder público não precisa necessariamente fazer as obras, mas sim preservar os espaços para, quando se ampliar a cidade e surgirem novos loteamentos, já se ter o espaço reservado para a macroestrutura viária."
Investimento e planejamento
"Nos loteamentos consolidados, é preciso injetar investimento público. Nos que ainda estão se ampliando, não precisa de dinheiro público, pois automaticamente vai se fazendo (o que precisa). Pode-se alegar: 'Ah, mas o poder público não tem dinheiro', mas planejamento não precisa de dinheiro, precisa de processos racionais de mobilidade urbana. A cidade está crescendo nas laterais, e quando os espaços estiverem todos ocupados, as pessoas não vão mais conseguir sair dos espaços porque não há infraestrutura.
Além do mandato
"Problema do Brasil é que só se planeja para quatro anos, e pior, só se planeja financeiramente. O financeiro é a consequência do planejamento. Muitos financiamentos que são feitos de 20 anos, por exemplo, são para obras que vão gerar espaço de desenvolvimento, atividades econômicas. Essas grandes infraestruturas viárias geram espaços de atividades econômicas grandiosas e Caxias precisa (delas) se quiser avançar, senão vai ficar inviável. Basicamente, é questão de zoneamento adequado e infraestrutura viável. E isso não é questão de pegar dinheiro e fazer agora, mas sim planejar e ir buscando recursos. Quando busca recursos e investe nessas infraestruturas, elas se pagam por conta própria. É que nem plantar uma roça, você gastou na semente, mas tem uma produção que vai te dar a vantagem de ter investido na semente."
Evitar "novo Magnabosco"
"Tem instrumentos jurídicos para evitar o que aconteceu no (terreno da família) Magnabosco, pois aquilo que aconteceu foi justamente porque não foi feita intervenção planejada. Esse foi o problema, se deixou acontecer e foi atrás com infraestrutura. Infraestrutura precisa ser planejada no Plano Diretor. Pega Plano Diretor, faz zoneamento, essas regiões onde têm problemas de ocupação irregular, estabelece zoneamentos e que tipos de atividades você vai investir lá. Aí começa a regularizar e fazer intervenção."
Fala, povo
Quais bairros da cidade devem ser prioridade do futuro prefeito para melhorar as condições de trafegabilidade das vias?
"Tem muitos buracos espalhados na cidade, mas bairros mais afetados eu diria que são Monte Carmelo e Montes Claros, onde, além de buracos, também falta asfaltamento." Ovidio Tonietto, 64 anos, taxista
"A entrada do bairro Planalto está bem ruim, é complicado ali no cruzamento."Bruna Nardi, 30 anos, auxiliar administrativa
"O maior problema é a desorganização do trânsito. Questão de buracos até não está ruim, precisaria é mapear melhor o fluxo para que não tenhamos congestionamentos que temos hoje em dia." Luciano Terres, 37 anos, segurança
"Buracos têm por toda a cidade, mas o pior é o Salgado Filho, que está em condição de abandono, falta asfaltamento, tem buracos e não tem sinalização. Especialmente na Rua Padre Ambrósio Pierateli." Rudinei Antônio da Silva, 48 anos, motorista
"O bairro Floresta está com bastante falha, principalmente paralelepípedos soltos." Brayan Ivan da Luz de Oliveira, 19 anos, pizzaiolo
"Nossa rua precisa de cuidados. Rua Eugênio Rech, bairro São Mateus. Por aqui passa ônibus da Visate, e mais diversas empresas. Já revindicamos calçamento. Aguardamos uma solução ainda este ano." Lourdes Bernardi, 59 anos, professora
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