Afastado da política desde que renunciou ao mandato na Câmara de Vereadores, em novembro de 2011, Harty Moises Paese (PDT) tem se dedicado à profissão de advogado, à família e ao voluntariado. Ele era investigado por uso de atestados falsos para justificar ausências em quatro sessões do Legislativo e preferiu deixar o cargo. O caso foi arquivado na Câmara.
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Nesta entrevista, concedida em seu escritório na quarta-feira passada, Paese analisa os cenários políticos municipal e nacional, fala sobre ética e conta como superou o envolvimento com drogas. Confira:
Pioneiro: O que o senhor tem feito desde que deixou a Câmara?
Harty Moisés Paese: Fui tratar de reorganizar a minha vida particular. Há muito tempo tinha deixado de atuar também profissionalmente na advocacia. Fiz cursos e voltei a fazer um trabalho estritamente voluntário. São duas paixões que estão muito ligadas. Sempre disse isso, que o Direito e a política, além de terem o mesmo objeto, são as leis e a tentativa de solucionar os problemas da sociedade. Então, voltei à minha atuação para esse trabalho basicamente voluntário de ir aos bairros. De quarta a domingo, vou em um bairro diferente, atendo junto com o presidente do bairro ou com a liderança do bairro e vou atendendo juridicamente as pessoas. Fico lá uma hora, duas. É o que me satisfaz, é uma forma que encontrei de dar para a vida aquilo que a vida nos dá. Cada um tem uma habilidade e, se cada um conseguisse dar uma parte disso, acho que a sociedade seria bem melhor.
O senhor continua no PDT?
Continuo. Estive afastado por um bom tempo, não participei mais do diretório. E nesses atendimentos que a gente faz nos bairros, as pessoas perguntam, sabem da história do nosso envolvimento político e dizem: "tem de voltar a participar do partido." E eu fui adiando justamente por estar priorizando esses atendimentos. Mas no começo do ano voltei a participar do partido, vi que era hora de voltar. Afinal, não é só com cargos que se faz isso. Hoje faço parte do diretório, conseguimos compor e fizemos uma chapa única.
Qual sua opinião sobre o cenário que se desenha com cinco pré-candidatos do PDT a deputado estadual?
É uma questão matemática. O lado bom é que o PDT é um partido que tem os melhores quadros. Agora, o lado ruim é a questão matemática. Não há condições desse número de candidatos. A federal, tranquilo, temos a maior liderança do PDT de Caxias, que é o ex-prefeito Alceu (Barbosa Velho). Para a Assembleia, não acredito que o PDT vá cometer o equívoco que cometeu em outras eleições, lançando mais do que um candidato. Caxias é a segunda maior cidade depois de Porto Alegre. Ela tem de contribuir com a legenda e com deputados eleitos. Um só candidato a estadual também é uma margem segura para que nós o elejamos. E o nome independe, porque esses cinco têm todas as condições de ser esse candidato.
Por que o PDT perdeu a eleição de 2016 à prefeitura?
Essa é uma discussão muito séria para se fazer de forma superficial. Não existe um porquê. Em um processo desses existem diversos porquês. Acredito que o mais forte deles, o que os analistas políticos fizeram, não só em Caxias do Sul, mas em outros municípios, foi do sentimento de mudança. O sentimento de mudança ancorado na situação caótica em que a política, a economia e a sociedade se encontram. Esse sentimento, infelizmente, fundamentou esse voto do ano passado, que optou não pela vitória de determinado candidato, mas pela saída daqueles que representavam uma continuidade. Quando digo infelizmente é porque, evidentemente, somente a revolta não é suficiente para fazer boas escolhas. Então, (a população) acaba tomando decisões somente com base nesse sentimento de mudança e troca que tomou conta e ainda vige no país. A gente sabe que somente vão mudar atores, mas o fundamento da política não vai ser em nada alterado.
Como o senhor avalia os primeiro meses do governo Guerra?
A voz rouca das ruas tem um certo fundamento. Sou contrário, por exemplo, a muitas vozes que tem até dentro do partido e dos partidos derrotados, de fazer terra arrasada, nada presta. Não é por aí. Posso até ser criticado. Hoje não tenho cargo, não tenho visibilidade, mas alguém que vá ler isso pode até me criticar: "Ah, tu é do PDT, tu tem de estar contra." Não é porque sou do PDT que tenho de estar contra. Vejo que tem muitas atitudes sensatas, muita vontade, o governo que iniciou com esse estado anímico de realmente modificar e melhorar a vida da comunidade. Então, tem muitas coisas boas esse governo, mas, para mim, a principal falha, e fica ruim para eu falar de fora, mas ao observar como cidadão e eleitor, uma das dificuldades é o que todo mundo está vendo, que é essa falta de iniciativa do diálogo. Isso é fundamental. Existe ranço, sim, por parte de entidades, de partidos, mas isso não é motivo para o governo se fechar numa concha e não abrir porta para receber entidade, para discutir sob alegação de que isso é a velha política. Como se a arte de conversar fosse algo demoníaco, algo que faça mal se reunir no gabinete com a UAB, com um partido político, com vereadores de oposição, com a entidade dos médicos, seja ela dos sindicatos, seja ela do CRM (Conselho Regional de Medicina). Qual o mal de conversar? Vejo que isso falta no governo do prefeito Daniel Guerra, que foi meu colega na Câmara. Tivemos algumas diferenças, mas, no restante, não tenho nenhuma vírgula para colocar com relação ao comportamento, à probidade, à ética.
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Qual sua avaliação sobre a atual legislatura da Câmara?
Vejo bons nomes na Câmara, todos com qualificação. Sinto apenas muito "raivosismo", muita raiva ainda acumulada do processo eleitoral, vejo ainda críticas infundadas por parte da oposição, que é a maioria. Vejo ainda muita mágoa, muito debate eleitoral permeando.
Como o senhor avalia o governo Temer?
Não dá para fazer separadamente. Ele foi eleito junto com a presidente Dilma (Rousseff). Nós estamos vendo hoje o reflexo da dificuldade de se fazer política tendo como causa ganhar uma eleição. O resultado é esse que a gente vê. Foi feito um Frankenstein de partidos políticos e de ideias na eleição: Temer, Dilma, com Lula apoiando, PMDB, PT. Para mim, o governo Temer é a continuidade. Uma aliança dessas não se mantém, porque o objetivo é só chegar no poder. Chegando ao poder, não há projeto, se dissipa.
O senhor foi favorável ou contrário ao impeachment da ex-presidente Dilma
Particularmente, sou um legalista, é minha área, minha formação. Tecnicamente, com relação aos argumentos que tive conhecimento, fui favorável, porque havia embasamento. O presidente da República e o governo devem se pautar estritamente pela legalidade, e não foi o que aconteceu. Juridicamente falando, fui favorável. Politicamente, é outra discussão.
Como o senhor vê a Lava-Jato? A ética, no país, de uma maneira geral, tem melhorado?
Não tenha dúvida de que ela ajuda nem que seja com uma semente. A Lava-Jato é uma semente de algumas mentes arejadas. Essas resistências que se vê nada mais são do que o reflexo de uma moralidade, de uma evolução primária que o ser humano ainda tem. Eu não conheço o juiz Sergio Moro, não conheço os atores da Lava-Jato Essa é uma crise de valores da sociedade e não só da política. Qualquer pessoa que ouse enfrentar isso vai encontrar sérias resistências, mas é necessário. Para as pessoas que estão assustadas com isso, é necessário que piore para depois melhorar. Não se faz uma casa nova sem destruir aquela parte que está meio prejudicada. Primeiro, se demole tudo. Depois, se começa de baixo. Vejo a Lava-Jato como uma semente que veio para ficar, vai enfrentar resistências, mas ela vai sobreviver. Essa consciência moral e ética do ser humano, que estava adormecida, depois que desperta não tem mais volta. A Lava-Jato é um caminho sem volta de um processo de evolução da sociedade.
O senhor sente falta da vida pública?
Devo confessar: ajudo muito pessoas através da profissão, do trabalho voluntário que é feito, que como vereador, na política, eu não conseguiria. Agora, tem situações que somente estando lá (em cargo eletivo), que a profissão não ajuda. Neste momento, aparecem demandas, nos atendimentos que faço nos bairros, das comunidades, que aí não é como profissional, aí teria de ter os mecanismos que a política oferece para a solução. Aí eu sinto falta de ter essas ferramentas. Mas não dá para ter tudo. Assim como eu não podia exercer minha profissão quando estava lá e sentia falta da profissão. Sinto que faltam projetos que realmente toquem mais na vida, no dia a dia da comunidade, sinto falta disso.
A sua ideia é retornar à vida pública?
Não sei. Muitas pessoas nesses atendimentos falam: "Tu tem de voltar, reativar projetos que tu tinha na tua época", porque foram só dois anos e meio, mas foram mais de 30 projetos, sem falar os da presidência da Câmara, como o Câmara vai aos Bairros, a consolidação das leis do município, e aí o pessoal já cobrou no ano passado para eu concorrer e eu declinei, porque entendi que tinha o projeto de atender nos bairros que seria cortado e muitas pessoas precisam disso, então, adiei. Mas o futuro a Deus pertence. O meu futuro, o que mais penso é o final de semana. Como dizem, quem sabe o que planta, não se preocupa com o que colhe. Não é nem pensar na colheita, é não se preocupar com ela. Esquece a colheita. Colheita é uma palavra que risquei no dicionário. A única palavra que existe é plantação. E aí, o que vier, tu tá feliz, porque tu não pensa na colheita.
Foi público o seu envolvimento com drogas. O problema foi superado?
Na época, foi complicado, entrei em um processo de depressão, acabei com esse envolvimento com substância química. Essa reorganização que eu te falava que priorizei, tanto é que renunciei (ao mandato). Poderia ter ficado mais um ano e meio, recebendo salários, com recursos judiciais. Mas não me interessava o salário, o cargo, interessava a reorganização da minha vida e foi o que fiz e durante um ano, um ano e meio, até dois, até fim de 2013, eu fiz essa reorganização, me afastei de Caxias um bom tempo, para trabalhar essa questão, desse envolvimento que tive com uso de substância e, graças a Deus, voltamos e lembro agora quando alguém toca no assunto. Nesse sentido, procuro não divulgar muito, porque não é o objetivo, mas vou em lugares, instituições que trabalham no tratamento de pessoas que têm envolvimento para, de acordo com a minha experiência, que não foi longa, passar que é possível visitar o inferno e sair dele. O ideal é que, por experiência própria, não se faça, mas, se por circunstâncias a vida te levar a isso, não existe fim do túnel. A superação aconteceu nesse sentido. Hoje agradeço tudo que passei porque muitos na época diziam que eu perdi. Não. Na vida nada acontece por acaso, a gente não perde nada. Se alguma coisa deixou de ser, é porque não era tua. A gente não perde nada do que não é nosso. Não houve perdas. Houve um processo que, a partir do momento que eu sai da planície e fui pra montanha e observei lá de cima, eu vi que foi extremamente necessário para a vida, para a minha evolução, para o meu aprendizado. Comecei a ver coisas que realmente importam na vida, e elas estão muito longe de serem materiais, de estarem em nome, cargo, função, salário, casa, carro, em viagem, em roupa. Não quero dizer que são desnecessárias, mas são um meio, não um fim. E essa visão eu tive com esse processo que passei.