Uma cena tem se repetido com cada vez mais frequência no bairro São Pelegrino, em Caxias do Sul, como pode ser visto no vídeo abaixo. Durante a madrugada ou início da manhã, lojas têm as vitrines quebradas e são invadidas. Não são levados apenas produtos: há casos em que até os fios de energia elétrica são furtados. Ao mesmo tempo em que o prejuízo aumenta para os comerciantes, o medo da violência se torna parte da rotina dos lojistas e trabalhadores.
Um prestador de serviços de lojas da região, que prefere não ser identificado, relata que pelo menos oito lojas do bairro foram furtadas da mesma forma apenas em agosto. Alguns dos estabelecimentos, localizados em pontos da Avenida Júlio de Castilhos e da Rua Pinheiro Machado, ainda estão com vidros quebrados e portas danificadas.
— Está bem horrível na região. Teve um final de semana que roubaram tudo de uma loja — afirma o prestador de serviços.
Alguns estabelecimentos foram furtados mais de uma vez _ uma das lojas, na Avenida Júlio, registrou quatro furtos este ano, inclusive de cabos de energia. Em um dos casos, a loja de roupas precisou ficar fechada por dois dias por estar sem luz. De acordo com o prestador de serviços, os furtos aumentaram desde o começo do ano, mas estão "bem piores" nas últimas semanas.
Nem a luz do dia afasta os ladrões. Em um furto relatado por ele, o suspeito cometeu o crime na frente de uma "parada de ônibus com várias pessoas". O criminoso teria apenas colocado um cobertor na cabeça para esconder o rosto e invadir a loja.
— (Os lojistas) Estão todos apavorados, não querem mais deixar a vitrine exposta se não for no horário de funcionamento da loja — relata o homem.
Sequência de crimes
Na semana passada, a banca de revistas situada na Avenida Júlio de Castilhos foi violada em três madrugadas seguidas. A atendente, que prefere não se identificar, explica que todas as janelas das vitrines foram quebradas, além de terem sido estragadas as portas sanfonadas de ferro, que serviam para proteger os vidros, além do furto de cigarros, produto que ela também comercializava.
— Isso tudo nos deu um prejuízo de R$ 12 mil... E quem vai pagar por isso? Ninguém, né? — resigna-se.
Antes dessa sequência de furtos ela disse que precisou colocar uma serpentina de arame farpado em cima da sua banca, para impedir que fossem retirados os fios da rede elétrica e também fechou com uma porta de ferro o lugar onde estão instalados os relógios de luz e água. A comerciante relata ainda uma situação que ocorreu bem perto de onde mora, também no bairro São Pelegrino:
— Eu sempre acordo às 5h. Abro a janela e fico observando. Daí, eu vi um caminhão encostar em frente a uma loja aqui perto. Eles arrombaram as portas e levaram tudo que podiam, como se estivessem fazendo uma mudança. Levaram tudo, só deixaram o balcão. E, quando chegou a polícia, não tinha mais nada.
O subcomandante do 12º Batalhão de Polícia Militar de Caxias do Sul (12º BPM), major Wagner Carvalho, afirma que a BM está combatendo este cenário. Uma patrulha, inclusive, foi colocada para atuar na região.
— A Brigada tem intensificado as abordagens a este público flutuante, a maioria usuários de entorpecentes ou alcoólatras, abordando, identificando e realizando captura de foragidos e prisões de autores de furtos de fios e cabos. Inclusive, designando uma patrulha específica para enfrentar este problema social que tem concentração nesta área — declara o major Carvalho.
Com receio de sair ou voltar para casa
Um morador do bairro Euzébio Beltrão de Queiroz, que também prefere não se identificar por medo, reclama que nos últimos dois anos tem aumentado o número de pessoas em situação de rua usando terrenos baldios para fazer uso de drogas e para esconder objetos e mercadorias de furto.
— A insegurança está cada vez maior. Estamos acuados. Se a "zona do cemitério" é um dos lugares mais perigosos de Caxias, porque não temos um policiamento que nos dê mais segurança? — questiona.
Morador do bairro há 12 anos, diz que o comércio no entorno só trabalha com portas fechadas e alguns comerciantes já procuram um novo ponto para se estabelecer porque estão cansados de serem furtados ou ameaçados.
— Onde moro tivemos de reforçar as portas de entrada, colocando mais grades, mas eles furtam tudo, pedaços da grade, pedaços de ferro, já roubaram os hidrantes e, nesse caso, fizemos Boletim de Ocorrência — explica.
Por vezes, reclama o morador, há pessoas sentadas ou deitadas na porta da garagem de sua residência, impedindo que possa sair ou voltar para casa. Nesses casos, diz que acaba ligando para a Brigada Militar e diz que também buscou solução junto à prefeitura.
O QUE DIZEM OS LÍDERES COMUNITÁRIOS
"Temos uma boa relação com a BM. Há duas semanas, tive contato com um tenente, que me perguntou sobre as demandas. Na ocasião, relatei a ele sobre os problemas no Largo da Estação Férrea e já no sábado seguinte fizeram a operação por lá. Eu nasci e me criei no bairro São Pelegrino. A insegurança em São Pelegrino e, no entorno, sempre foi uma constante. Isso é histórico. O bairro sempre teve muito problema de policiamento. Numa época, queríamos que colocassem soldados andando a pé, em pontos estratégicos, até para inibir e coibir a ação dos pedintes. Esse contingente a pé também seria importante para inibir furtos, mas sempre nos dizem que não há contingente na Brigada Militar".
— Alexandre Tres, presidente do Amob São Pelegrino
"O problema do Beltrão é recorrente. Quase 90% das pessoas que transitam ali não moram na comunidade, isso inviabiliza qualquer pessoa de se sentir segura dentro do seu bairro. O poder público montou uma equipe responsável pela Cristóforo Randon (rua onde atuam os recicladores, há proposta de criação de um pavilhão para recicladores, ainda sem resolução). Me convidaram uma vez para participar e isso já faz algum tempo, nunca mais me passaram nada de qualquer demanda sobre esse problema, que se arrasta há quase quatro anos. As famílias que aqui nasceram e se criaram estão vendendo as casas, pois perderam a esperança de que alguma situação mude ou pelo menos surja alguém empenhando e principalmente tenha humanidade de olhar para os moradores como seres humanos".
— Miriam Machado, presidente da Amob Euzébio Beltrão de Queiroz