As forças de segurança estão mobilizadas para desfazer a maior cracolândia a céu aberto em Caxias do Sul. A Operação Saturação consiste em diversas investidas diárias no chamado Morro do Sabão, como é conhecida a subida da Rua Borges de Medeiros e ruas próximas no entorno do Parque Mato Sartori, no caminho para o bairro Primeiro de Maio. A intenção é incomodar as dezenas de usuários que ali se concentram, descobrir fornecedores das drogas e, assim, devolver a segurança aos moradores. A Secretaria Municipal de Segurança Pública garante que a missão será permanente e conta com o apoio da Brigada Militar (BM).
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A estratégia é uma novidade no recente combate ao tráfico na cidade. Nos últimos anos, o foco das forças policiais era em ações de inteligência, com uma coleta discreta de informações que possibilitava a apreensão de quantidades maiores de drogas. Desta forma, os dependentes químicos de crack eram pouco incomodados em suas rotinas de conseguir recursos — seja mendigando, coletando de materiais recicláveis ou cometendo pequenos furtos — e trocar pela droga para saciar o vício. Agora, as ações diárias miram a clientela para enfraquecer os vendedores e, talvez, finalmente liberar o bairro da insegurança instalada há décadas pelo tráfico permanente. Nos últimos quatro anos, o Primeiro de Maio foi palco de 21 assassinatos.
— Por dia, devem circular mais de 50 usuários de drogas por ali. A média de concentração é de 20 pessoas ali na subida da Borges. Só que eles consomem e depois evadem para buscar recursos para comprar mais drogas. A operação não pode parar. Não podemos "enxugar gelo" para fazer uma migração (dos usuários). Queremos resolver o problema do bairro, da comunidade. É uma ação estratégica — afirma o secretário municipal Hernest Larrat dos Santos Júnior.
A reivindicação por segurança seria uma constante pelos moradores da região. Inicialmente, a Guarda Municipal buscou informações pelas câmeras de monitoramento viradas para o local. Uma estratégia criminosa descoberta consistia em um traficante descer o morro distribuindo as drogas para os usuários reunidos na Borges de Medeiros. As entregas eram rápidas e, quando a viatura chegava, o vendedor já tinha fugido. Assim, não era possível rastrear de onde a droga vinha.
Outra estratégia dos usuários é esconderem seu pertences, sejam facas ou ferramentas utilizadas para arrancar fios de cobre, em esconderijos da área. Assim, quando os policiais faziam abordagem, o grupo só tinha pequenos valores já contados para a compra da droga.
— Eles não sobem até uma boca de fumo, é a droga que desce em pequenas quantidades. A nossa missão agora é a insistência e a inquietação. As ações estão intensificadas em todo o Primeiro de Maio, com cada força policial fazendo o seu papel. Faremos a saturação e os envolvidos terão que se movimentar. E o trabalho de inteligência está operante para identificar os pontos de vendas e realizar ações pontuais contra os traficantes — explica Júnior.
Para a quarta-feira (15), está previsto o início da segunda etapa da mobilização. Equipes de assistência social começarão a acompanhar as abordagens e oferecer apoio aos dependentes químicos, como abrigo, comida e tratamento contra o vício.
Na prática, a Operação Saturação pretende afastar a clientela de um dos pontos de maior lucro para venda de drogas em Caxias do Sul — e que, por isso, já foi alvo de diversas guerras entre grupos rivais. O secretário admite que a mobilização é um projeto-piloto que, se mostrar resultados, poderá ser aplicado em outros bairros de vulnerabilidade social da cidade.
— Não temos um prazo para esta operação. É muito difícil dizer que iremos resolver o problema. Mas, vamos insistir. Quanto mais os policiais estiverem no bairro, mais os moradores irão se sentir seguros.
"Com certeza podemos mudar este cenário"
A cracolândia no começo da Rua Borges de Medeiros, ao lado do Parque Mato Sartori, persiste há mais de 10 anos, mas passou a atrair uma quantidade ainda maior de viciados nos últimos meses. Protegidos pelo paredão verde do Mato Sartori, os usuários ficam a poucos passos das biqueiras do tráfico. Na época, os moradores reclamavam da falta de políticas públicas contra aquele uso de drogas a céu aberto.
A Brigada Militar admite que o corredor de usuários entre a área central e o Primeiro de Maio é uma reclamação enfrentada há anos. Com a operação conjunta e o apoio da assistência social, a expectativa é alcançar uma mudança de cenário.
— Sempre monitoramos e atuamos neste fluxo de usuários, mas acabar com algumas demandas são ações que necessitam um longo tempo. Neste momento de pandemia (do coronavírus), a aglomeração gerada se tornou mais preocupante. Esta é uma missão pró-ativa contra este conhecido uso e tráfico de drogas — aponta o major Márcio Leandro da Silva, subcomandante do 12º Batalhão de Polícia Militar (12º BPM).
O oficial ressalta que o consumo de drogas está diretamente ligado a outros crimes. Na sexta-feira (10), uma das incursões resultou na apreensão de uma arma de fogo. Já nesta segunda-feira (13), guardas municipais encontraram três hidrômetros e diversas moedas e notas de R$ 2 e R$ 5 — valores característicos do tráfico.
A mobilização das forças policiais cria expectativa, contudo, o major prega cautela.
— Dizer que iremos extinguir (as drogas da região) é muito grande, mas com certeza podemos mudar este cenário e gerar uma maior sensação de segurança do entorno. Na sexta-feira, as pessoas passavam e agradeciam a presença policial. Isto é muito significativo, dá uma valor maior para nossa missão.