Os representantes da segurança pública de Bento Gonçalves têm uma certeza: a confusão de Caxias do Sul e até mesmo o triplo homicídio de Porto Alegre só não se repetiram na Capital do Vinho porque há meses é feito o combate a perturbação do sossego. Inclusive, nos três dias do último final de semana, a Brigada Militar (BM) realizou ações em locais com histórico de reclamações. A prefeitura, por sua vez, intensifica as ações de conscientização sobre a nova lei municipal, que limita o consumo de bebida alcoólica na via pública.
Leia mais:
Universitário denuncia agressão policial em ação em Bento Gonçalves
Poder público não tem soluções no curto prazo contra confusões na Estação Férrea
Após nova baderna na Estação Férrea, BM de Caxias diz que falta efetivo para ações permanentes
Apesar de admitir que a repressão não é o ideal, o secretário municipal de Segurança Pública, José Paulo Ianke Marinho, ressalta que a proibição foi a alternativa encontrada contra um problema que cresce há anos. A fiscalização iniciou em dezembro de forma educativa e as autuações devem começar em fevereiro. A força-tarefa reúne o Departamento Municipal de Trânsito, a Secretaria de Meio Ambiente e o Instituto de Planejamento. O Conselho Tutelar e o Ministério Público também são convidados.
— É um grande problema que muitas cidades enfrentam, no mundo inteiro. Atuamos em ações integradas nos locais de maior incidência de denúncias, que envolvem a perturbação e poluição sonora, assim como uso e tráfico de drogas, tanto por maiores de idade quanto por crianças e adolescentes, além de crimes de trânsito, como embriaguez ao volante, rachas e disputas automobilísticas. Em muitas oportunidades, a BM é acionada para atender brigas generalizadas, que podem acabar em homicídio — diz o comandante do 3º Batalhão de Policiamento em Áreas Turísticas (3º BPAT), major Álvaro Martinelli.
A nova lei, que foi sancionada em 25 de abril e regulamentada no dia 4 de outubro, proíbe a ingestão de bebidas alcoólicas em vias públicas das 22h às 6h. Contudo, o texto permite o consumo em eventos autorizados pelo poder público e áreas de atendimento de bares, food truck e restaurantes.
— O que nos preocupa são aqueles jovens que ficam na frente do estabelecimento ingerindo bebidas alcoólicas e depois promovendo algazarras e desordem — salienta o secretário Marinho.
O comando do 3º BPAT ressalta que não é uma prioridade dos brigadianos ficar abordando quem está bebendo na rua. Como a lei é municipal, a BM atuará, quando acionada, como apoio as ações de fiscalização, como já ocorre com outros órgãos.
— Nosso objetivo é a preservação de vidas e obediência à lei, buscando prevenir que estes crimes descritos ocorram — conclui o major Martinelli.
"O nosso foco é o bem comum"
Pioneiro: Como está a aplicação da nova lei?
José Paulo Ianke Marinho: Começamos em dezembro a orientação das pessoas que estão na via pública sobre a lei. Nas quintas, sextas e sábados, fazemos patrulhas em locais específicos realizando abordagens, verificando crimes ambientais e estudos de impacto de vizinhança. São várias frentes, uma força-tarefa que tem dado certo. Nos antecipamos aos problemas que verificamos em Porto Alegre, Caxias e Parobé. Infelizmente, os nossos jovens não tem mais consciência dos seus limites. Diferentemente do que pensam os proprietários, pois já conversamos com o MP, o estabelecimento comercial é responsável pelo que acontece na sua frente. "Mas é da porta para fora". Não. A fonte geradora do problema é o estabelecimento comercial. Se estivesse fechado, não haveria o problema. São problemas de garrafas, copos plásticos, lixo e brigas. Temos trabalhado abordagens e identificação de pessoas. Só em um final de semana, foram 52 abordagens em um estabelecimento só, com 27 veículos autuados e quatro pessoas presas. Estamos fazendo a nossa parte de dar uma resposta à comunidade.
Bento está mais perto da solução?
Ainda é um caminho longo, pois passa por uma questão social e de educação. Quando não conseguimos frear por meio de alguns mecanismos esse tipo de situação, temos de usar a lei. Temos de usar a repressão, que não seria o ideal. Por que brigar ou provocar uma confusão, como aconteceu em Caxias, se as pessoas poderiam viver tranquilamente em harmonia? É um espaço de diversão. O detalhe é o morador que no outro dia precisa trabalhar cedo. São três ou quatro horas da manhã e está uma gritaria que você não consegue dormir. Para quem você liga? Daí vem a BM para tentar acalmar, mas quando os policiais saem volta tudo de novo. Quem critica essas ações? São as pessoas que não moram naquele local. Bagunça na frente da casa dos outros? Beleza. Mas na frente da minha casa, não. Pode ver que os comentários que ocorrem são de jovens que não têm preocupação nenhuma e não tem de estar no outro dia trabalhando. O nosso foco é o bem comum.
Por que a perturbação do sossego é um desafio há anos?
É uma questão simples de educação, que deve vir de berço. Os jovens não têm mais limites. Tudo pode, tudo é "meu direito", todas as luzes giram para essas pessoas, que acabam desrespeitando algumas regras sociais de convivência. Se os jovens se encontrassem, podia ser em 500 ou 600, e mantivessem um ambiente cortês, de respeito e de diálogo... Mas não, o que temos, como foi neste final de semana, é depredação de um banheiro público. Aquele jovem ou adulto que depredou, pois ainda não conseguimos identificar, amanhã ou depois poderá precisar daquele banheiro. Destruiu uma coisa que é para ele mesmo utilizar. Hoje existe uma total falta de limites que ocasiona este tipo de situação. Daí a necessidade de intervenção do poder público para tentar corrigir essa situação, que vem de anos. Por que a pessoa não pode caminhar alguns passos e jogar uma garrafa ou lata em uma lixeira? Não, tem de jogar no chão, na calçada. Temos lixeiras e contêineres disponíveis nesses locais. Mas, além de não jogar no contêiner, eles o destroem. Temos imagens de jovens jogando um contêiner escadaria abaixo, e para quê?