O tráfico operava a pleno vapor no final dos anos 1980 e início dos anos 1990 e os homicídios cresceram assustadoramente em Caxias, mas não eram mortes relacionadas diretamente a uma disputa pela venda de drogas. Em 1989, a cidade registrou 116 assassinatos. No ano seguinte, mais 111 pessoas morreram de forma violenta e outras 107 tombaram em 1991. As motivações da matança passavam por desavenças entre parceiros de delitos, de vizinhos e de bebedeiras. Foi uma era de assaltantes como Ivan Carlos Camassola, fugitivo do presídio que protagonizou diversos crimes antes de ser abatido num confronto com a polícia na Vila Operária, em janeiro de 1990. A máquina do governo precisou apresentar resultados.
— Fizemos um processo de desarmamento na cidade, com trabalho forte nos botecos, nas ruas. Baixamos para cerca de 70 homicídios em 1992 — revela o historiador e oficial da reserva da BM, Manoelito Savaris.
No mesmo período, a prefeitura construiu módulos da Brigada Militar (BM) no Santa Fé, no Fátima e no Cinquentenário.
— Eu disse para o governador (Alceu) Collares que faria postos de polícia desde que ele mandasse gente. O Estado mandou para cá a polícia feminina e foi criada a Patrulha Escolar. Demos equipamentos. Houve uma sensível diminuição dos crimes na cidade — conta o ex-prefeito Mansueto Serafini.
As constatações de Savaris e Mansueto têm fundamento. Com investimentos e repressão, a cidade reduziu os índices de homicídios para uma média entre 50 e 80 homicídios anuais e manteve esse controle até meados de 2004, fator causado também por uma melhor qualidade de vida em decorrência da estabilização econômica no Brasil.
"Tudo está como era antes"
A aparente calmaria era quebrada por dramas como a criminalidade juvenil. No início dos anos 1990, as chamadas gangues se multiplicaram pela cidade. Virou moda adolescentes se digladiarem nas ruas, cometerem pequenos assaltos e promoverem outras confusões. Havia demarcação de território por meio de pichações. Na tarde de 3 de outubro de 1993, o estudante Roger Bertoluz, 17, e um amigo foram encurralados por uma das gangues, na saída de uma festa, em plena Avenida Júlio de Castilhos. Roger morreu de forma brutal: recebeu golpes de paralelepípedo na cabeça e facadas no peito.
O trágico fim do estudante causou revolta, motivou protestos e levou o juiz substituto da Infância e Juventude Sílvio Canani a decretar a polêmica Lei das Onze. Pela determinação, menores de 18 anos não poderiam ficar nas ruas desacompanhados depois das 23h em Caxias. Apesar dos questionamentos por restringir o direito de ir e vir de uma camada da população, Canani diz que a sociedade perdeu a revogação da norma dois anos depois.
_ Estava insuportável e a morte do Roger foi a gota d'água. A lei diminuiu em 70% a criminalidade entre adolescentes. Recebi apoio, mas o juiz que veio depois revogou a lei. Isso não foi um benefício. Hoje, parece tudo está como era antes _ analisa Canani.
Enquanto a sociedade caxiense tentava estancar o retorno da costumeira violência, a região entrava na era dos roubos a carro-forte. Em 1995, Cláudio Adriano Ribeiro, o Papagaio, e comparsas levaram R$ 956 mil, ou equivalente a US$ 1 milhão, de um blindado em frente ao antigo posto da Polícia Rodoviária Estadual, na entrada de Farroupilha. Até então, era o maior roubo já conhecido no Estado. Os grupos já mostravam que não haveria trégua para Caxias e cidades próximas. Aliás, a cidade seria berço da formação criminosa de outro bandido temido, José Carlos dos Santos, o Seco.