Após o fracasso na tentativa de criação da Central de Alternativas Penais com verbas do Ministério da Justiça e um atraso de mais de dois anos, o órgão está próximo de virar uma realidade em Caxias do Sul. Sem os R$ 3 milhões de recurso federal, a solução encontrada foi um convênio entre o Poder Judiciário e o governo do Estado. A parceria já foi autorizada pelo governador José Ivo Sartori e depende apenas da burocracia para ser assinada pelo secretário de Segurança Pública, Cézar Schirmer, o que deve ocorrer ainda nesta sexta-feira.
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Nesse formato, o Tribunal de Justiça oferecerá a estrutura e os equipamentos necessários, enquanto o Estado cederá os servidores e operacionalizará os atendimentos por meio da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). O convênio, que não inclui aporte de verbas, prevê a abertura de centrais em Porto Alegre e Novo Hamburgo, além de Caxias do Sul.
— Começaremos de forma embrionária, com uma equipe enxuta. O que queremos é tirar do papel, pois é uma demanda de muitos anos. Claro que precisará melhorias, mas daremos conta deste início — afirma Gustavo Schwarz, do Departamento de Planejamento da Susepe.
Uma vez instalada, a Central cobrirá uma brecha na Justiça gaúcha: acompanhar de perto o cumprimento de penas restritivas de direito (que substituem as pena de prisão), caso das prestações de serviço à comunidade.
A demora nos processos e a falta de controle sobre os cumprimentos ocorreria pela falta de servidores. Com o convênio, a Susepe assumiria a responsabilidade.
– Hoje, é o Judiciário quem atende, mas há outras obrigações e não consegue dar vazão.Em algumas comarcas, demora mais de ano para ser cumprida uma pena. Queremos diminuir esse tempo, dar o caráter pedagógico necessário e não deixar pendências – aponta Schwartz.
Com penas alternativas mais eficazes,a expectativa é que se reduza o fluxo de entrada do sistema prisional,conforme previsão da legislação. A central ainda atuaria em parceria com a Justiça Restaurativa,projeto elogiado tanto pelo Poder Judiciário quanto pela Susepe. Segundo a Vara de Execução Criminal Regional, há 493 apenados que cumprem penas restritivas de direitos em Caxias, sendo 435 homens e 58 mulheres.
Destes, 138 prestam serviços à comunidade, 45 têm penas pecuniárias (multa), um cumpre medida educativa e 295 aguardamo início de cumprimento,além de 14 que aguardam questões administrativas ou jurídicas.
"Ideia é prevenir a reincidência"
No segundo semestre de 2016, Caxias esteve muito próxima de ser a primeira cidade gaúcha a ter uma Central de Alternativas Penais graças à iniciativa de juízes do município. Porém, por motivos não oficialmente esclarecidos,a parceria com o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) travou quando necessitou da autorização do governo estadual. Apesar das poucas respostas, os magistrados caxienses continuaram a defender o projeto.
— Nos presídios de Bento Gonçalves e Vacaria, por exemplo, temos lotações beirando os 400%, o que é mais do que excessiva. São situações que exigem uma pronta manifestação do Judiciário. A Central vem neste viés, de permitir que alguns delitos de menor gravidade possam receber uma resposta penal menos onerosa ao Estado e com menos prejuízo social ao apenado, que quando recolhido perde todo o vínculo com a comunidade – aponta a juíza Milene Rodrigues Fróes Dal Bó, da Vara de Execução Criminal Regional.
O juiz Leoberto Brancher lembra que um modelo semelhante de atuação já ocorre com adolescentes infratores,que são atendidos pela Fundação de Assistência Social (FAS). Para os adultos, a legislação ofereceria um leque ainda mais amplo de possibilidades cautelares a serem utilizadas,contudo, o modelo atual prejudicaria os resultados.
— Essas alternativas penais não têm maior efetividade no que se refere ao seu cumprimento porque ficam limitadas por falta de estrutura, de apoio, de aconselhamento, de orientação e até mesmo de controle. A central complementa um sistema que hoje é limitado e por isso, talvez, falho. Se não acompanhar adequadamente um sujeito que pratica um crime mais leve, podemos ver a conduta dele se agravar e progredira crimes mais graves. A ideia é prevenir a reincidência – ressalta o magistrado.