Atentos à possibilidade de garantir que parte de seu ICMS seja investido na segurança pública de Caxias do Sul, empresários da cidade tomaram contato esta semana com a experiência de Leonardo Fração. O presidente do Instituto Cultural Floresta (ICF) relatou, durante reunião-almoço, como foi a campanha que recolheu e doou R$ 14 milhões em veículos, armas e equipamentos para as forças policiais de Porto Alegre. Foi daquela mobilização que ganhou força o Programa de Incentivo ao Aparelhamento da Segurança Pública (Piseg).
Em sua manifestação, Fração ressaltou que investir nas forças policiais é a solução de curto-prazo, pois "a situação gaúcha é de emergência". A repressão, contudo, precisa ser seguida de trabalho de assistência social, o que, para o presidente do ICF, seria proporcionar acesso a educação e emprego àquela comunidade. Fração aponta a falta desse acompanhamento social como a razão do fracasso das Unidades de Polícia Pacificadoras (UPP) no Rio de Janeiro.
O evento na Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC) coincide com a reestruturação do Conselho Comunitário Pró-Segurança Pública (Consepro), que tem essa missão de unir empreendedores em prol de suas comunidades. Após a palestra, Fração conversou com o Pioneiro sobre o tema. Confira:
Pioneiro: Na visão do Instituto Floresta, Caxias do Sul é um ponto central para mudar a segurança pública gaúcha?
Leonardo Fração: Não é uma questão de ter Caxias no planejamento ou não. Para resolver a segurança pública, temos de extinguir a criminalidade dos principais polos de criminalidade. A forma mais eficiente de se fazer isso é igual um vaso de água sendo derramado. Você começa centralizando e os esforços vão se espalhando. O eixo para começar é de Caxias a Porto Alegre, com todos (os municípios) que estão no meio, pois é onde temos a maior parte da criminalidade do Estado. Não é uma escolha começar por Caxias. É porque, infelizmente, é o segundo grande polo de criminalidade do Rio Grande do Sul. Temos de começar por onde o problema é mais sério.
Na prática, como há pouco recurso, as forças policiais acabam se movimentando conforme as necessidades de momento. Como ajudar a segurança pública mudar de estratégia?
Não é uma ideia minha (da concentração do combate), é uma ideia que aprendi ouvindo outras pessoas. Tradicionalmente, a distribuição de viaturas se dá de uma forma política: recebe “X” viaturas, as espalha e faz as coisas do jeito que sempre foi feito. Agora, conseguimos provar juntos que se começar a combater de forma pontual, teremos sucesso onde se concentra e conseguiremos espalhar essa perspectiva de melhora para os outros lugares que inicialmente não foram atendidos. Essa é a grande sacada. Fazer funcionar como uma jarra de água, que vai se espalhando e expandindo os horizontes da segurança pública.
Os empresários caxienses se mostraram atentos ao Piseg. Como está a aceitação da nova lei (que criou esse programa)?
Todo mundo que conversamos fica entusiasmado. Essa foi a grande vantagem de começar com um projeto com os 50 maravilhosos empresários que nos apoiaram sem ter nada em troca. Criamos o exemplo. Agora que funcionou, com R$ 14 milhões e com esta lei de incentivo à segurança, todo mundo está empolgado a botar um pouquinho a mão no bolso e fazer essa onda continuar crescendo. Acho que a aceitação dos empresários vai ser ótima, porque todo mundo está preocupado com a segurança pública. É da natureza que as pessoas acabem participando.
Como combater os locais conflagrados em que jovens são seduzidos/recrutados para a criminalidade?
No curto prazo, ostensividade policial. No médio e longo prazo, a solução permanente do problema é emprego e segurança. É dessa forma que pegaremos esse jovem, que hoje vai para a criminalidade, e lhe daremos uma opção melhor de vida. Hoje, a criminalidade é uma oportunidade atraente, pois remunera bem e a impunidade persevera. Temos de mudar isso.
Contra as facções e a migração do crime, especialistas defendem que cada cidade tenha o seu presídio. O instituto pode ajudar?
Neste momento, só podemos ajudar subjetivamente para mudança de mentalidade. De forma prática, não podemos construir presídios. Não sou especialista em segurança pública, sou um curioso no tema. Mas parece ser a solução mais óbvia. Presídios menores, localizados e mais perto da comunidade me parecem ser, para delitos de menor gravidade, a forma mais adequada de punir e de fiscalizar o que o Poder Público está fazendo com os criminosos presos naquela localidade. Para criminosos de alta periculosidade, na minha opinião, é melhor concentrá-los em presídios que não tenham acesso a nada, exceto comida e sol.
Sobre a defasagem do efetivo policial, como a influência política dos empresário pode ajudar?
É preciso uma mudança mais estrutural do que pontual. Temos de ter uma reforma drástica na forma que são contratados e operacionalizados os policiais. Acho que deviam ganhar muito melhor, inicialmente. Tinha de, logo no início da carreira, ter condições de um bom carro, uma boa casa, dar uma boa educação para os seus filhos e ter conforto em seu lar para que possa sair todo dia de casa colocando sua vida em risco pela nossa. Acho que deveriam trabalhar por mais anos, pois estão se aposentando muito cedo. Essa aposentadoria não deveria ser integral, porque onera demais os cofres do estado. Mas reconheço que o militar e o oficial de segurança pública devem ter um regime separado do cidadão comum, pois a atividade é de estresse e desvinculação maior com a sua própria vida. O jeito que o sistema está não é bom. Não serve nem para o policial da ativa e nem para o cidadão que paga a conta.
O secretário de segurança deve ser um cargo técnico ou político?
Racionalmente, sempre pensei que o secretário de segurança deveria ser um cargo técnico. Mas, com a experiência dos últimos dois anos, me parece que um secretário político sabe melhor como funciona o sistema e, se estiver bem amparado por pessoas técnicas, faz um trabalho melhor. Em termos práticos, o que mais me preocupa nos últimos 90 dias é quem será essa pessoa. Se é uma pessoa mais alinhada com o que está sendo feito, e me parece na conversa que tive com o governador (eleito Eduardo Leite) que há um entendimento muito assertivo de como fazer as coisas. Se for uma pessoa que dê continuidade ao que está sendo feito, acho que o Rio Grande do Sul terá avanços muito significativos na segurança pública. Por isso, estou entusiasmado com o Eduardo Leite. Me parece uma pessoa extremamente inteligente para ler a situação e tomar as decisões da melhor forma possível. Acredito que irá pegar as coisas boas que o (governador José Ivo) Sartori fez, que foram muitas, e tentar mantê-las.