O primeiro triplo homicídio de que se tem notícia em Bento Gonçalves aconteceu na quinta-feira e, infelizmente, não é uma surpresa. A onda crescente de assassinatos preocupa autoridades e a comunidade há pelo menos dois anos. Por mais que as forças policiais mirem na insegurança, por meio de prisões e apreensões de grandes quantidades de drogas, o tráfico continua a crescer e provocar mortes violentas nos bairros da periferia.
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Vale destacar que a criminalidade não está em descontrole na Capital do Vinho. Os crimes contra o patrimônio, por exemplo, caíram 33% no primeiro bimestre. Foram 35 assaltos e 102 furtos a menos na comparação com o ano passado. O que continua a crescer, porém, são as mortes motivadas pelo tráfico de drogas. Com o triplo homicídio da madrugada de ontem, são 14 assassinatos nos primeiros 74 dias deste ano — quase a metade do que foi registrado em todo o ano passado. Com 34 mortes por violência, 2017 figura como o ano mais violento da história da cidade.
A Polícia Civil e a Brigada Militar locais apresentam os mesmos argumentos: o aumento dos assassinatos é motivada pelo tráfico e estes acertos de contas são difíceis de prever e evitar. Os assassinos aguardam pacientemente pelo momento mais favorável para matar seus desafetos. No final de semana passado, por exemplo, policiais militares realizavam patrulhamento no loteamento Tancredo Neves durante a madrugada. Cerca de uma hora após os PMs deixarem o local, Matheus da Fonseca Teixeira, 20, foi executado na Rua Adelaide Basso Pasquale.
— Fazemos o mapeamento e sabemos onde ocorrem os homicídios, mas não temos como ter a noção exata de quando vai acontecer. Quando há o policiamento, eles não ousam cometer estes crimes. Mas, infelizmente, não temos como estar presentes em todos os lugares e a todo tempo — aponta o capitão Diego Caetano, comandante da 1ª Companhia do 3º Batalhão de Policiamento em Áreas Turísticas (3º BPAT).
Os bairros onde ocorrem esses crimes são os mesmos que, ao longo dos anos, sofrem com a falta de infraestrutura e o avanço do tráfico de drogas: o Zatt (quatro mortes) e Municipal (três), na zona norte, o Eucaliptos (dois), no acesso da cidade pelo Barracão, e o Conceição e o Tancredo (cada um com uma vítima), onde a maioria da população vive em vulnerabilidade social. Além de sofrer com a violência, os moradores sofrem com o preconceito.
— Quando vamos fazer uma compra no comércio e damos o endereço, é complicado. Muitos têm vergonha de dizer que moram no Tancredo Neves. Eu não tenho, pois moro aqui há 30 anos e sei que os moradores são, na maioria, pessoas que trabalham. O problema são as pessoas que se infiltram. Eles vêm de outros bairros e cidades, conhecem quem trabalha com a droga e vão direto lá — aponta José Rodrigues Ribeiro, presidente da Associação do loteamento Tancredo Neves.
Presença nos bairros é desafio
O idoso, que é natural de Passo Fundo e veio para a Serra para trabalhar no Banco do Brasil, lembra que a droga chegou no bairro há menos de 15 anos.
— A droga chegou com um ou dois, que hoje até devem estar presos. Só que foi crescendo, crescendo e nunca mais (houve um controle). Dentro da vila, os bandidos não roubam. Eles roubam lá fora e depois vem para cá, atraídos pela droga — relata Ribeiro, revelando que os moradores já ofereceram até um terreno para a BM ficar no bairro.
— Procuramos ajuda e fizemos abaixo-assinado pela segurança. Eu mesmo falei com o comandante da BM e ofereci um terreno para fazermos um posto, que os policiais possam ficar e até tomar um chimarrão no bairro. Mas não foi algo possível. A segurança está muito precária — lamenta.
O capitão Caetano reconhece que o ideal seria ampliar a permanência da BM nessas localidades. Porém, isso não ocorre em função do efetivo reduzido:
— Diante dessa situação, adotamos políticas de polícia comunitária, que é uma bandeira da Brigada. Queremos construir, junto com a comunidade, com troca de informações, um planejamento para a redução dos crimes. São ações preventivas. O policial vai para o bairro para entender a rotina e estreitar relações.